A crise dos chips e os preços desanimadores

A crise dos chips e os preços desanimadores

A discussão sobre a alteração dos preços num cenário de uma pandemia ainda em desenvolvimento é um microcosmo perante aos tópicos que são mais urgentes, como a disseminação de vacinas que possam resolver realmente a questão.

Eu sei disso, mas peço licença para falar sobre esse microcosmo dos preços que se transformou num verdadeiro dilema, uma espécie de spin-off da crise causada por esse novo vírus.

Já quero adiantar aqui que se você está insatisfeito com o preço de algum hardware que esteja interessado ou qualquer outro produto, principalmente os que dependem diretamente da indústria dos semicondutores para sua produção, saiba que a realidade que se aproxima é ainda mais caótica e desanimadora.

Lembro que em setembro do ano passado, quando as primeiras unidades das placas de vídeo da série RTX 30 chegaram ao país, muitos torceram o nariz pelos preços praticados. Considerando que naquele momento os valores já estavam altos.

Aqueles que resolveram aguardar e ver se a situação melhoraria um pouco foram surpreendidos com preços cada vez mais absurdos. Uma RTX 3070, por exemplo, que chegou a aparecer por R$ 4.500/R$ 5.000 hoje não sai por menos que uns R$ 8.500.

Realidade duríssima que engloba diversos fatores, como a alta do dólar, a própria crise da indústria de semicondutores e ainda por cima a valorização absurda da criptomoeda Ethereum.

Como uma espécie de Lei de Murphy aplicada, a ethereum está numa alta tremenda, justamente nesse momento de uma pandemia e uma crise em conseguir atender a demanda por placas. No Vietnã, até um lan house resolveu abandonar de maneira temporária seu modelo de negócio e investir na mineração. Os lucros são maiores, diz a empresa.

A revolta dos gamers e toda discussão global sobre a ausência de placas para sua finalidade mór, os jogos, já que estamos falando de modelos de uma linha vendida para tal público, fez com que a própria NVIDIA tomasse uma ação enérgica em relação ao tema. Limitar o rendimento da recém-lançada RTX 3060 no quesito mineração. Além de lançar GPUs específicas para quem busca a mineração.

A ação da NVIDIA em frear a capacidade de hash da RTX 3060 vem para tentar equilibrar uma balança que está pendendo para um público que não é o consumidor habitual deste tipo de produto. Como disse aqui, se você adquiriu o produto de maneira legal é seu direito fazer dele o que achar melhor. Se o seu desejo é ter uma RTX 3090 como acessório de decoração isso é um problema seu.

O meu único ponto em relação a uma “defesa” para o lado dos gamers é que, nesse recorte da competição por placas, o consumidor final, aquele que vai buscar o seu produto na loja, não tem a mínima capacidade de competir quando vemos a mídia chinesa dizendo que mineradores de criptomoeda estão fazendo filas nas portas das fábricas para comprar as placas antes mesmo que passem por fornecedores e, obviamente, lojistas. É uma situação realmente delicada.

E se a discussão sobre o preço absurdo dos produtos é apenas um microcosmo dentro do real problema que é uma pandemia em andamento, a alta do preço das placas de vídeo é um segmento ainda mais restrito.

O impacto passa por outras muitas categorias de produtos. A questão tem proporções pandêmicas mesmo. É a indústria dos semicondutores de maneira total que está passando por um péssimo momento.

Um outro recorte deste panorama é o cobiçado PlayStation 5. Mantendo o cronograma inicial de lançamento, a Sony optou por não postergar a chegada do seu novo console. Assim como a Microsoft, vimos na reta final de 2020 novas opções. Do lado da gigante japonesa o PS5, e do lado da gigante de Redmond duas opções, Xbox Series S e Series X.

Esse estado de pandemia atual, em virtude do novo coronavírus, é realmente curioso em todos os sentidos.

Diferentemente da época da gripe espanhola (1918 – 1920), que ceifou mais de 50 milhões de vidas, estamos numa realidade de mundo que diversos progressos foram conquistados de lá pra cá, incluindo a melhora no padrão de vida de boa parte da população mundial. Isso permite uma maior garantia em relação a sua própria subsistência e essa oportunidade de se lamentar por coisas mais banais, como o fato de não ter conseguido comprar o novo console que lhe interessa.

Para muitos a questão não é o valor oficial cobrado pelos lojistas, o ponto central é que não há console pra comprar. Os estoques são repostos de tempos em tempos e acabam rapidamente.

Além de ter que “brigar” com a crise atual da indústria, os consumidores também estão enfrentando quem aposta nesses consoles como uma maneira de revendê-los por preços altíssimos.

A Sony não está conseguindo suprir a demanda. Recentemente a companhia, por intermédio de seu diretor financeiro Hiroki Totoki, declarou que está difícil ampliar a produção do PlayStation 5 em meio à escassez de semicondutores e outros componentes. A Sony diz que conseguiu vender cerca de 4,5 milhões de PS5 em 2020.

É uma situação dicotômica. A indústria tem uma legião de consumidores ávidos pelos produtos, mas, no momento, não é possível atender a todos.  A Microsoft também já falou que não espera que consiga normalizar os estoques até meados deste ano.

Com a atual geração de iPhones, a família iPhone 12, a Apple conseguiu um grande feito, retomar a liderança no mercado de smartphones. A companhia fechou o último trimestre de 2020 à frente da sul-coreana Samsung. Isso não acontecia desde 2006. Embora o resultado seja satisfatório para a empresa, ele foi prejudicado por conta dos desdobramentos da pandemia, já que as entregas dos novos iPhones foram limitadas pela incapacidade de suprir a demanda.

As montadoras de veículos estão levando a pior nesse panorama adverso para a indústria dos semicondutores. Todas as grandes montadoras estão sofrendo. As quedas na produção chegam a 15%, como é o caso da Mitsubishi Motors.

Os fabricantes de chips acabam priorizando as empresas que lidam diretamente com dispositivos de consumo. A Apple é a empresa que mais comprou chips em 2020.

De acordo com dados do Gartner, a empresa foi responsável por quase 12% da remessa global de semicondutores, investimento de US$53,6 bilhões – aumento de 24% em relação a 2019.

Os veículos também dependem diretamente dos semicondutores, devido aos modelos ainda mais completos em termos multimídia e segurança. A Volkswagen calcula que essa crise pode resultar em cerca de 100 mil veículos a menos nos quatro primeiros meses de 2021. A perspectiva geral das montadoras é realmente caótica.

Além desse problema em suprir a demanda, os preços continuarão subindo. Como disse no início, se você está insatisfeito com o preço do hardware que está interessado em adquirir, nos próximos meses a realidade tende a piorar.

Conversei com alguns fornecedores e o discurso é justamente esse. Uma realidade que vai se tornar ainda mais complicada nos meses seguintes. A recuperação deve começar a caminhar somente a partir do último trimestre de 2021.

A empresa de análise de mercado J.P Morgan estima que a demanda atual global está entre 10% e 30% acima do que os fornecedores são capazes de suprir.  Alguns analistas até falam que o problema pode se arrastar até 2022. 

Sobre o Autor

Editor-chefe no Hardware.com.br, aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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