Por que a Netflix segue cobrando uma mensalidasde mais cara pelo 4K?

Por que a Netflix segue cobrando uma mensalidasde mais cara pelo 4K?

Em uma publicação de junho de 2016, no tech blog da Netflix, página em que a plataforma divulga detalhes mais técnicos sobre o serviço, a companhia “batia no peito” que se preocupava com a qualidade da reprodução do vídeo e que a medição era feita com uma precisão em escala, utilizando um método que eles definiram como Video Multimethod Assement Fusion (VMAF).

Já nesta publicação, no mesmo blog, de 2020, a Netflix comenta sobre mudanças em relação à otimização do conteúdo para 4K, ressaltando a maneira dinâmica da taxa de bits – elemento fundamental para a qualidade final da reprodução.

Uma coisa persiste na seção de comentários das publicações no tech blog da Netflix, e até mesmo em fóruns mundo afora: o desagrado dos usuários com a qualidade de reprodução dos conteúdos da plataforma em 4K Ainda tem um elemento extra na discussão: o valor da mensalidade do plano com suporte a 4K é superior aos demais oferecidos pelo serviço.

Neste artigo quero levantar este debate sobre o que a Netflix entrega em 4K e tentar compreender o porquê deste plano ter um valor mais elevado, já que as principais concorrentes da Netflix oferecem 4K como padrão.

A priori, uma coisa precisa ser estabelecida. A discussão sobre qualidade de reprodução de conteúdo, principalmente em streaming, é realmente um ponto de nicho, que incomoda mais aqueles que já tiveram contato com materiais em que a compressão não prejudica o conteúdo, como no caso dos filmes e séries em mídias físicas. E tem também uma carga do velho e clássico efeito placebo. Diz notar diferenças gritantes, mas, num teste cego, talvez falharia em identificar qual é qual.

Para a esmagadora maioria dos usuários das plataformas, a qualidade que está sendo entregue pode até ser vista como excepcional e vale o pagamento de uma taxa adicional, mas precisamos ir além da superfície no assunto.

Todas as plataformas podem usar como chancela de marketing o 4K, mas, na prática, há diferenças consideráveis entre os conteúdos que estão disponíveis nas mais variadas plataformas de streaming de vídeo nesta resolução. Pode até ser 4K, mas há diferenças!

Assim como o 4K é um chamariz no streaming de vídeo, o famoso áudio sem perdas, lossless, também o é para muitas plataformas de áudio, que cobram um valor diferenciado para esta feature.

A Netflix se encaixa nesse modelo. Cobra uma taxa adicional para o que seria a liberação do acesso a um conteúdo com uma qualidade muito acima da reprodução padrão. Mas, na prática, baseado na minha percepção, a realidade é completamente diferente.

Além de não ter uma qualidade altamente superior ao que já entrega em seu plano HD, os conteúdos em 4K da Netflix estão muito aquém do que eu assisti no Apple TV+ (See, disparado a melhor experiência em imagem e som que já tive no streaming) no Disney+ (Mandalorin), ou até mesmo no confuso Amazon Prime (a qualidade de imagem de “Na Fazenda com Clarkson” é muito boa!).

O único ponto de destaque sobre a Netflix em 4K que observei é no alcance dinâmico, em suas produções originais. 

E estou falando isso sem ainda entrar no mérito da taxa de bits, um balizador técnico do que esta sendo entregue. Estou falando apenas de sentar e assistir conteúdos em 4K na Netflix, Apple TV+, Disney + e Amazon Prime. A Netflix, a única que cobra uma taxa extra para tal experiência, foi a que menos me impressionou.

O ABS

Acho interessante a maneira como a Netflix vem trabalhando em termos de tecnologia para tornar mais ameno, nos requisitos de rede, a entrega em conteúdo na resolução 4K. Não podemos esquecer que, além de um serviço de streaminng, a Netflix e outras plataformas são verdadeiros titãs da tecnologia. Muitos avanços são feitos para que a reprodução de conteúdo, nos mais variados formatos, seja possível

Uma dessas “engrenagens” de bastidores determinantes na experiência em streaming é o Adaptive Bitrate Streaming (ABS).

Tecnologia essencial para que a reprodução não trave, o que atrapalharia completamente a sua imersão no conteúdo, decorrente da oscilação de velocidade da sua rede. Já notou que em algumas situações, ao assistir um filme ou série, você observa uma leve queda na qualidade da imagem, e depois tudo volta ao normal? Isso é o ABS funcionando. Tudo em prol da não interrupção de reprodução.

Essa é apenas uma peça, das inúmeras que rodam de maneira silenciosa, que atuam quando você resolve assistir seu conteúdo da Netflix. Falando especificamente da líder do streaming, a plataforma alterou há alguns anos, e segue refinando, a forma como o fluxo de bits é entregue.

Antigamente, quando falávamos de 4K na Netflix, o fluxo de bits era fixo. Os números, que variavam de acordo com o conteúdo, eram os seguintes: 8, 10, 12 e 16 Mbps.

Números que já deixariam muitos puristas das mídias possessos, já que são valores bem mais baixos do que o Blu-Ray podem entregar. Permita-me fazer apenas um aparte nesse ponto sobre as mídias. Gostem ou não os puristas e audiófilos, o streaming é a maneira mais custo x benefício de curtir conteúdo em 4K no Brasil, considerando o modo legalizado.

A ideia de fluxo fixo de bits foi alterada. A Netflix foi desenvolvendo e otimizando algoritmos de codificação por título e até por cena. Sempre com a promessa de manter a qualidade.

Artefatos e gritaria

Com essa otimização, a taxa de bits pode ficar num limiar bem baixo. No caso de animações em 4K, por exemplo, pode ficar abaixo de 2 Mbps. Encontrei no Reddit discussões sobre o tema, e as reclamações são inúmeras. De chateações com artefatos a forma nada inteligente que a compressão lida com conteúdos gravados em película, com sua granulação característica.

Nos meus testes, na última temporada de La Casa de Papel, consegui um bitrate máximo de 18.48 Mbps. Em contrapartida, outra série carro-chefe do serviço, Better Call Saul, na sexta-temporada, a qualidade deixa a desejar, atrelado a sua baixa taxa de bits de apenas 2.57 Mbps.

La Casa de Papel
Better Call Saul

Num dos relatos, de uma pessoa que diz ser da Europa, ele fala que tem uma conexão de 250 Mb e reclama do fluxo de bits de 2,5 Mb da Netflix em 4K e sua deficiência na reprodução, até mesmo em cenas brilhantes, que costumam sofrer menos com o efeito da compressão quando comparado com cenas escuras.

Lembrando que, além do conteúdo na resolução 4K, o plano premium da Netflix também disponibiliza o suporte ao HDR, Dolby Atmos e a possibilidade de assistir 4 telas de maneira simultânea.

Como é cobrado um valor diferenciado pelo plano com resolução 4K, a vigilância é e precisa ser maior por parte dos usuários. Faça este exercício: acesse o tech blog da Netflix e procure qualquer artigo da empresa sobre suas mudanças e otimizações em termos de qualidade de reprodução e repare nos comentários. A maioria é criticando o que a Netflix entrega em qualidade de reprodução.

A nova realidade

Um desses comentários me chamou bastante atenção:

“Embora melhorar a experiência de reprodução para conexões de baixa largura de banda seja ótimo, eu realmente gostaria que houvesse uma melhoria perceptível para conteúdo 4K para assinantes premium com conexões de alta largura de banda. Uma multidão tem velocidades de conexão de 50, 100, 200 ou até 1000 Mbit/s e uma redução ainda maior das larguras de banda já muito baixas para conteúdo 4K parece incompreensível quanto a qualidade Ultra HD Bluray”.

Transportando isso para o Brasil, felizmente, conexões de alta velocidade, graças ao avanço da fibra, estão se transformando numa realidade cada vez mais palpável em termos técnicos e até mesmo financeiros. O custo de um plano de fibra, considerando a oferta de velocidade, é amplamente mais vantajoso do que era no passado, quando o foco era ADSL e conexões via rádio.

Conforme os os dados mais recentes da  Ookla, empresa de análise de redes que desenvolveu o serviço Speedtest, que calcula a velocidade da internet do usuário,  a média de velocidade da banda larga fixa no Brasil é de 91.82 Mbps (há pouco mais de um ano era 54.21 Mbps).

Até mesmo TVs com resolução 4K caíram consideravelmente de preço nos últimos anos. As otimizações que a Netflix promove são maravilhosas para aqueles que adoram desfrutar da plataforma de maneira móvel, assistindo os conteúdos no celular, independente de onde esteja.

Mas não é tão interessante assim para quem busca a melhor qualidade possível e resolveu investir num bom sistema de som e televisão.

480p. É sério?

Mesmo que a conversa aqui fosse focada na experiência em celular, a Netflix também tropeça, pelo fato de seguir com a resolução 480p em seu plano mais básico. 480p, neste momento, é um ultraje, chega ser risível que tal política siga ativa.

Há alguns meses, a Netflix foi alvo de uma grande chacota em relação a esse plano mais básico. O jornalista Mateus Mognom levantou essa questão no Twitter. Clique e leia os comentários.

Seria mais coerente que todos os planos adotassem o suporte máximo em qualidade de reprodução e que a diferença ficasse por conta apenas de quantas telas simultâneas o usuário pode ter acesso.

Enquanto a taxa de bits vai despencando, o preço do plano premium vai subindo, acompanhado, para ser justo, com o aumento da oferta da Netflix em termos de variedade de conteúdo nesta resolução. O último reajuste aconteceu no ano passado. A empresa passou o plano premium de R$ 45,90 para R$ 55,90.

Conteúdo variado

Um dos únicos argumentos plausíveis que a Netflix pode ter em relação a cobrar mais caro no plano com suporte a 4K é a variedade de conteúdo nesta resolução. Por mais que a Apple TV+, por exemplo, esteja muito acima em qualidade de áudio e vídeo, o serviço é relativamente novo e a oferta de conteúdo ainda é bem escassa.

Somado a isso, temos o fato que algumas das produções da Netflix se transformaram em queridinhas do grande público, como Stranger Things, esse também pode ser um fator para que muitas pessoas resolvem pagar, nem que seja por curto período, um adicional para desfrutar daquele conteúdo na melhor qualidade disponível.

“Cuidando da querida web”

O outro argumento, usado publicamente pela empresa, seria o cuidado para não “congestionar” a internet, em relação ao consumo de banda. Em 2020, em meio a pandemia, a empresa chegou a anunciar um corte na taxa de bits, medida adotada por outras plataformas. O Brasil também foi afetado por isso.

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Entramos em contato com a assessoria da Netflix Brasil solicitando uma posição oficial sobre a insistência dessa política de preços para um recurso que é padrão entre outras plataformas grandes.

A empresa ficou de responder, mas não conseguiu atender o prazo estipulado e combinado entre ambas as partes. Caso responda, a matéria será atualizada. 

 

Sobre o Autor

Editor-chefe no Hardware.com.br, aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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