Reunir cinco fatos desconhecidos sobre a Nintendo, a empresa mais antiga da indústria de games, não é uma tarefa muito fácil. Na verdade, a empresa é uma das mais antigas da história, com 132 anos de existência, mas entrou na indústria de games apenas no final dos anos 1970, pouco antes do seu centenário.
Portanto, qualquer empresa com essa longevidade, possui fatos curiosos e, sobretudo, desconhecidos. No entanto, o foco deste artigo sobre a Nintendo serão os fatos desconhecidos da empresa em relação à indústria de games ou aos bastidores da empresa pós-1970, quando surge a Nintendo Of America, a divisão da companhia nos Estados Unidos.
Certamente, a guerra de consoles contra a Sega não entrará na lista, mas um tal de Segale sim. Também veremos a relação entre a colonização brasileira, o personagem Popeye e os Beatles na história da Nintendo.
Dito isso, antes dos cinco fatos desconhecidos sobre a Nintendo, vamos revisitar a já famosa história da Nintendo.
História da Nintendo
No dia 23 de setembro de 1889, o artesão Fusajiro Yamauchi fundou a empresa Nintendo Karuta, em Kyoto, no Japão para produzir e distribuir hanafudas (cartas de flores), um baralho japonês de 48 cartas, geralmente feitas de cartão. Esse tipo de baralho se tornou popular no Japão no final do século XIX, quando o governo baniu a maioria das formas de jogatina.
As vendas de Hanafuda começaram a ter relação com as casas de jogos controladas pela Yakuza. Portanto, em Kyoto, outras fabricantes optaram por deixar esse mercado devido ao envolvimento com a contravenção.
No entanto, Yamauchi decidiu continuar com o seu negócio e se tornou o principal fabricante de hanafudas. O lento processo de fabricação desse baralho, bem como o mercado específico impactou as finanças da Nintendo Karuta. A solução foi produzir uma linha mais barata de cartas de baralho chamada Tengu (guarde esse nome).
Com o início do século XX, a Nintendo passou por alguns problemas devido ao conflito militar com a Rússia, mas graças a algumas parcerias, a empresa sobreviveu. Em 1907, Yamauchi adotou o seu genro, Sekiryo Kaneda, que se tornou o segundo presidente da Nintendo em 1929, com o sobrenome Yamauchi.
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Até 2003, a Nintendo foi uma empresa controlada pela família Yamauchi, que foi responsável pelo sucesso da empresa no exterior — mas, também, pelo declínio após o apogeu da Sony —, com a criação da Nintendo of America.
Muitas dessas informações descritas acima servem como pano de fundo para os cinco fatos desconhecidos sobre a Nintendo. Por exemplo, a expansão americana tem a ver com a Disney e foi indiretamente responsável pelo surgimento de um dos maiores desenvolvedores de jogos da história.
Enfim, vamos à lista.
Cinco fatos desconhecidos sobre a Nintendo
Invasão portuguesa: algo em comum entre o Brasil e a Nintendo
O primeiro da Nintendo foi Nintendo Karuta, quando a empresa começou a fazer cartas hanafuda. O nome Karuta não é uma coincidência e, além da relação com a Nintendo, tem relação até mesmo com a história do Brasil.
Todos nós sabemos que o Brasil foi descoberto em 1500, mas Portugal não tinha muito interesse no Brasil até meados de 1530. Na verdade, a coroa portuguesa queria expandir suas rotas comerciais pela África e pela Índia.
Com isso, os portugueses chegam ao Japão em 1543, na intenção de estabelecer uma rota comercial com o extremo oriente e, similarmente ao Brasil, levar o cristianismo ao país com os jesuítas.
A presença portuguesa no Japão influenciou até mesmo o vocabulário do país, com palavras como “shabon” (sabão), “pan” (pão) e “karuta” (carta). Os portugueses tinham como passatempo jogar cartas e esse hábito rapidamente se popularizou no Japão, sobretudo na elite japonesa.
Entretanto, devido ao crescimento dos missionários jesuítas no Japão, o governo japonês decidiu fechar as fronteiras do país e banir diversos itens da cultura ocidental, incluindo os jogos de cartas, ou karutas.
Os japoneses pararam de produzir cartas ocidentais dos baralhos convencionais e desenvolveram um novo baralho, o hanafuda. O governo, mesmo assim, baniu o hanafuda, embora os jogos clandestinos continuassem.
Em 1885, o governo japonês, ironicamente com a intenção de se modernizar baseando-se na cultura ocidental, decidiu remover a produção. Assim, quatro anos depois da nova lei, Fusajiro Yamauchi, um dos ávidos jogadores de hanafuda criou a empresa Nintendo Karuta. Ou seja, a Nintendo chamava-se, inicialmente, Nintendo Cartas. Esse é um dos fatos desconhecidos sobre a Nintendo que nos leva ao próximo dessa lista, mas sem registro histórico para fundamentar.
Significado do nome “Nintendo”
Por um bom tempo, a maioria das pessoas no japão acreditavam que o nome “Nintendo” significava algo como “deixar a sorte na mão dos deuses”, devido aos kanjis ( 任天堂) que formam a palavra.
Embora todos concordem que o “DO” (堂) da Nintendo significa santuário/lugar acolhedor e que as empresas costumam usá-lo para se dar um certo prestígio, o verdadeiro significado das outras duas sílabas é muito mais difícil de definir.
A segunda sílaba “TEN” na palavra Nintendo é vista de maneira literal, pois o kanji é definido como “céu/paraíso”. Em contrapartida, segundo o livro “A História da Nintendo kanji 天, que significa “TEN”, é exatamente o mesmo utilizado na palavra Tengu. Tengu são aqueles seres míticos narigudos que se tornaram em um símbolo para os jogadores de Hanafuda.
Entretanto, nem mesmo o bisneto do fundador sabe o significado do nome da empresa. De acordo com o livro “A História da Nintendo”, de Florent Gorges, Hiroshi Yamauchi admite não saber a verdadeira origem da palavra Nintendo, mas considera “deixar a sorte na mão dos deuses” uma possível explicação.
Hiroshi Yamauchi comandou a Nintendo por 53 anos, sendo o principal responsável pela transformação da empresa de cartas em uma das maiores companhias do japão.
É sobre Hiroshi e sua ambição em expandir o alcance internacional da empresa que iremos falar agora, mas, obviamente, com um fato desconhecido envolvendo espinafre.
A adaptação de Popeye era a aposta para ganhar o mercado americano
A Nintendo conseguiu mudar a história dos videogames no início dos anos 1980, mas os bastidores foram conturbados.
No entanto, a salvação já tinha aparecido em 1977, quando um jovem do interior do Japão, recém-formado da faculdade pediu ao seu pai para conversar com o seu velho amigo Hiroshi Yamauchi com o objetivo de arrumar um emprego na Nintendo. O nome desse jovem era Shigeru Miyamato, e a Nintendo nunca iria se arrepender de contratá-lo.
Como a intenção da Nintendo ainda era entrar no mercado de arcades — obviamente pelo lucro continuo após o lançamento —, Yamauchi determinou que Miyamoto desenvolvesse um novo jogo, mas com a supervisão de Gunpey Yokoi, chefe da divisão de Pesquisa e Desenvolvimento (R&D1).
Shigeru Miyamoto, diferentemente dos seus pares na Nintendo, não era um engenheiro, mas sim um homem das artes. Por essa paixão por música, cinema e literatura, Miyamoto ficou extasiado ao saber que a Nintendo estava fechando um acordo para licenciar o personagem Popeye e desenvolver um jogo.
Assim, um dos futuros maiores nomes da indústria de games — quiçá, o maior — começou a criar um jogo cuja narrativa centrava-se em Popeye resgatando sua amada Olívia Palito saltando por obstáculos para enfrentar o seu rival, o Brutus. A premissa soa similar?
Donkey Kong foi o primeiro jogo a ter a mecânica de pulo (e marca a primeira aparição do maior ícone da indústria)
(In)felizmente, a Nintendo não conseguiu os direitos de Popeye e a Nintendo precisava lançar um novo jogo com urgência. Assim, Miyamoto teve que improvisar e se inspirou na trama do clássico A Bela e a Fera. Em vez de Brutus, o vilão seria um gorila aos moldes de King Kong, mas com uma dose de humor. Esse gorila iria sequestrar a amada do herói do jogo, que na ideia de Miyamoto seria uma pessoa comum, um carpinteiro, sem uma postura heródica. Futuramente, esse carpinteiro se tornaria um encanador.
Com a ajuda dos engenheiros, Miyamoto desenvolveu a animação, as roupas, o nariz e outros elementos para ficarem visíveis no jogo. No entanto, os engenheiros não conseguiram criar um cabelo fiel naquela época. A decisão, portanto, foi a de adicionar um chapéu vermelho.
Sem a licença do Popeye, o herói precisava de um nome, e a escolha de Miyamoto foi Jumpman. Jump (pulo) + (man) homem denotava que o personagem, de fato, conseguia executar saltos.
Atualmente, essa mecânica é algo extremamente comum, mas, desde o lançamento de Pong, demorou quase uma década para que um personagem conseguisse pular.
Com quase tudo pronto, era necessário batizar o vilão do jogo. Miyamoto consultou o diretor de exportação da Nintendo e eles decidiram que o termo Kong seria compreendido como “gorila”. E como esse vilão era meio abobalhado, a escolha foi batizá-lo Donkey Kong. Donkey em inglês é o nome que se dá aos asnos e burros, mas, no Japão, assim como no Brasil, “burro” tem a mesma conotação, como “tonto”, “tolo” e outros elogios.
Um pioneiro do gênero dos jogos de plataforma, Donkey Kong também foi responsável por apresentar o maior personagem da história dos videogames: o Jumpman.
De Jumpman a Mario: a Guerra com a Sega(le)
A guerra dos consoles é bem conhecida, com livros e filmes abordando o período de disputa entre a Nintendo e a Sega. Portanto, para fechar um dos fatos desconhecidos sobre a Nintendo, coincidentemente, um dos protagonistas tem o prefixo da empresa em seu sobrenome.
Tudo começou durante a expansão da Nintendo para os EUA. Para continuar sendo uma empresa familiar, o chefe da Nintendo of America era Minoru Arawaka, genro de Hiroshi Yamauchi. Arawaka, estava com problemas para pagar o aluguel da sede da Nintendo nos Estados Unidos.
Além disso, os nomes dos personagens de Donkey Kong teriam que ser alterados na versão americana do jogo. Durante uma discussão sobre como batizar o personagem Jumpman, o dono do local chegou enfurecido para lembrar ao executivo sobre o atraso do aluguel. O sermão durou um bom tempo até que o proprietário, com seu característico bigode, deixou os funcionários da Nintendo continuarem a debater suas ideias.
O nome do proprietário do espaço era Mario Segale e naquele dia ele estava trajando um bigode. Portanto, logo após o proprietário sair, alguém na reunião sugeriu o nome Mario, e o resto é história.
Mario Segale, no entanto, nunca se vangloriou por inspirar o nome do maior ícone dos games e nem rivalizou com a Nintendo, diferentemente da Sega. Pelo contrário, Segale levava uma vida bastante privada e acreditava que a relação do seu nome com o personagem da Nintendo poderia atrapalhar seu lucrativo negócio devido à alta publicidade.
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Mario Segale morreu em 2018 e seu obituário menciona o personagem da Nintendo, mas ressalta a sua distância.
“Embora tenha sido a inspiração para o nome do personagem Super Mario da Nintendo quando os seus funcionários eram seus inquilinos nos anos 1970, Mario Segale sempre evitou a notoriedade do fato e, ao contrário, desejava ser reconhecido por aquilo que alcançou na vida”.
Em contrapartida, o personagem que recebeu o nome de Mario veio a se tornar um dos maiores ícones da cultura pop de todos os tempos.
Considerações finais: a importância Shigeru Miaymoto
Assim como a criação, o criador, Shigeru Miyamoto é o maior tesouro da Nintendo, responsável por Donkey Kong, Super Mario Bros. e The Legend of Zelda.
Quem diria que um jovem da zona rural, fanático pelos Beatles, iria ser responsável pela transformação da indústria.
Miyamoto continua sendo aquele mesmo jovem do final dos anos 1970, embora com uma popularidade tão grande que até Paul McCartney, o eterno Beatle, fez questão de conhecer pessoalmente o pai das principais criações da Nintendo.
E por falar em Beatles, David Sheff, autor do livro “Os Mestres do Jogo – por Dentro da Nintendo” afirma que “Miyamoto tem o mesmo talento para os games que os Beatles tinham para a música pop. Portanto, é impossível calcular o valor de Miyamoto para a Nintendo. Além disso, é inquestionável o fato de que sem ele a Nintendo não teria o mesmo sucesso”.
Fontes: “Os Mestres do Jogo – por Dentro da Nintendo“, “Nos Bastidores da Nintendo” e “A Guerra Dos Consoles – Sega, Nintendo e A Batalha Que Definiu Uma Geração“
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