No famoso livro “O Dilema da Inovação”, de Clayton Christensen, é mencionado o conceito de tecnologias de ruptura. Em suas palavras, essas tecnologias “trazem a um mercado uma proposição de valor muito diferente daquela disponível até então”. Dentre as características dos produtos classificados dessa maneira estão os preços geralmente baixos, maior simplicidade, tamanho reduzido e, frequentemente, mais conveniência no uso.
Um exemplo clássico mencionado na publicação de 1997 são os computadores pessoais. Ajustando esse conceito para a realidade de 2024, podemos perfeitamente citar a IA generativa como uma tecnologia de ruptura.
IA Generativa: A NVIDIA como protagonista
A eclosão de inúmeros serviços baseados em IA, capazes de atender diversas demandas de empresas e usuários ao redor do mundo, está gradativamente mudando a percepção sobre o futuro. Para alguns, trata-se do prenúncio de uma grande catástrofe; para outros, um novo capítulo cheio de possibilidades inimagináveis.
Atualmente, nenhuma empresa tem tanto impacto no avanço desse mercado quanto a NVIDIA, responsável por fornecer soluções em hardware e tecnologia que estão viabilizando essa transformação.
Nas palavras de Jensen Huang, CEO da NVIDIA, em entrevista a Wired, “a IA é uma redefinição da computação como a conhecemos nos últimos 60 anos”.
O livro de Christensen é um dos preferidos de Huang, que aplicou várias de suas ideias para posicionar sua empresa como um verdadeiro titã do mercado, chegando a figurar por alguns momentos em 2024 o posto de empresa mais valiosa do mundo.
Da GeForce à liderança em IA
Até pouco tempo atrás, a NVIDIA era amplamente conhecida no universo dos entusiastas de placas de vídeo e gamers. A linha GeForce, por exemplo, segue como referência para quem busca uma nova VGA. Contudo, o crescimento meteórico da companhia em 2024, impulsionado pela ascensão da IA, fez a NVIDIA transcender seu nicho original e se tornar um nome mencionado frequentemente em discussões diversas sobre tecnologia.
No mercado de placas de vídeo, que alavancou sua trajetória, os feitos alcançados em 2024 são impressionantes. O relatório do terceiro trimestre de 2024 da Jon Peddie Research (JPR) revelou que a NVIDIA conquistou 90% do mercado global de GPUs dedicadas para PCs — a maior fatia de mercado de sua história nesse segmento.
Em 2024 a empresa também comemou os 25 anos de lançamento da primeira placa de vídeo da linha GeForce, a GeForce 256, lançada em 1999.
Inovação e Visão Estratégica
A liderança de Jensen Huang demonstra como evitar a estagnação e abraçar a inovação é essencial para o sucesso. O investimento da NVIDIA em tecnologias baseadas em IA para otimizar o desempenho de suas GPUs foi uma decisão estratégica acertada. O DLSS (Deep Learning Super Sampling) se tornou referência, solidificando a noção de que o mercado de escalonamento de imagens por IA é um caminho sem volta.
Huang já afirmou que “não é mais possível se envolver em computação gráfica sem inteligência artificial”. Essa não é uma tendência passageira, mas uma realidade que seguirá evoluindo à medida que soluções de hardware dedicadas à IA avançam.
Adaptação a um ambiente geopolítico hostil
Em 2024, a NVIDIA teve que provar sua capacidade de adaptação frente a um ambiente geopolítico desafiador. As tensões entre os governos dos Estados Unidos e da China criaram inúmeros obstáculos para a empresa, que respondeu com soluções específicas, como o lançamento de hardwares modificados para o mercado chinês, o chip H20. Recentemente, a companhia relatou um aumento de 50% nas vendas dessa GPU na China, indicando que a estratégia tem funcionado.
No entanto, os desafios persistem. A China abriu uma investigação antitruste contra a NVIDIA e tem desencorajado empresas locais a adquirir seus chips.
A atenção regulatória sobre a NVIDIA não vem apenas da China. França, União Europeia e Estados Unidos também estão examinando suas práticas de mercado, preocupados com uma possível “estrangulamento” da concorrência. Esses fatores apontam para novos capítulos intensos dessa história nos próximos anos.
Críticas ao mercado de IA
Enquanto a NVIDIA colhe os frutos do mercado em franca expansão, há quem questione a sustentabilidade desse boom. Em uma carta a investidores, o fundo de investimento Elliot classificou a NVIDIA como uma bolha, argumentando que muitos dos supostos usos da IA nunca serão economicamente viáveis ou eficazes.
O fundo também destacou preocupações com o consumo de energia e a viabilidade técnica de soluções baseadas em IA. Apesar disso, os números da NVIDIA impressionam.
Onipresença dos chips
Em 2024, a NVIDIA manteve sua liderança absoluta no mercado de hardware dedicado à IA. Confira os maiores compradores de chips da empresa neste ano:
- Microsoft: 485 mil chips;
- ByteDance (dona do TikTok) e Tencent: cerca de 230 mil chips cada;
- Meta: 224 mil chips.
Segundo a consultoria Omdia, 43% dos gastos globais com servidores em 2024 foram direcionados para a NVIDIA — um domínio impressionante!
Valor de Mercado da NVIDIA (2000–2024)
Cescimento do valor total de mercado da NVIDIA ao longo dos anos:
- 2000: US$ 2,22 bilhões
- 2010: US$ 8,94 bilhões
- 2020: US$ 323,24 bilhões
- 2024: US$ 3,358 trilhões
A resiliência como bússula
Além das investigações antitruste, a corrida por hardware dedicado à IA está cada vez mais acirrada. Parceiros importantes da NVIDIA, como Meta, Amazon, Microsoft e Google, estão desenvolvendo ou já implantaram seus próprios chips, buscando reduzir a dependência da empresa.
Apesar dos desafios, a trajetória da NVIDIA desde sua fundação em 1993 mostra que a resiliência é a principal marca do império construído por Jensen Huang. Em conversa com estudantes do Stanford Institute of Economic Policy Research (SIEPR), o executivo destacou:
“ A maioria dos graduados de Stanford tem expectativas muito altas ao se formar em uma das melhores instituições do planeta. O problema é que as pessoas com expectativas muito elevadas têm muito pouca resiliência e, infelizmente, a resiliência é muito importante para o sucesso. Não sei como ensinar isso a você, exceto que espero que você tenha que sofrer”.
O discurso de Huang segue a linha de uma de suas frases mais conhecidas. “ Se você não tiver tolerância para falhas, não terá sucesso”.