Bateria do smartphone viciada? Não, isso não acontece

Bateria do smartphone viciada? Não, isso não acontece

Em 2019, o Nobel de Química premiou um trio de pesquisadores que impactaram diretamente a evolução de diversos produtos eletrônicos. John B. Goodenough, M. Stanley Whittingham e Akira Yoshino foram os responsáveis por desenvolver as baterias de íon de lítio, presente em nossos smartphones, notebooks, tablets, ferramentas elétricas, carros elétricos e até em satélites.

Estamos falando de uma padrão de bateria que, comercialmente, está se disseminando desde o início dos anos 90. Mesmo com as constantes evoluções em torno das baterias e dos dispositivos que as utilizam, um questionamento continua sendo feito por algumas pessoas.

Para alguns não é nem um questionamento, é uma afirmação categórica: as baterias de celular viciam! Você pode estender tal declaração para os outros produtos que também utilizam o mesmo tipo de baterias, como os notebooks.

Este artigo procura esclarecer de uma vez por todas esse assunto, munir você de argumentos sobre o por que a bateria do seu celular e demais eletrônicos não vicia!

Para que você tenha base para entender o porque uma bateria de íon de lítio (lithium-ion, em inglês) não vicia, é preciso pontuar algumas coisas. A primeira delas é em relação à classificação, de acordo com suas células voltaicas.

Baterias: células primárias e secundárias

bateria viciada

Baterias de células primárias não podem ser recarregadas. Após elas terem fornecido a sua capacidade especificada, precisam ser descartadas. Com a descarga, os elementos químicos são transformados em energia elétrica de forma definitiva e até a exaustão.

Baterias de células secundárias são aquelas que podem ser recarregadas, a ação química é reversível. Que ação química é esse? A conversão de energia química em eletricidade. Lembrando que, por definição, a bateria é um dispositivo capaz de converter a energia química de seus materiais ativos em energia elétrica. A bateria é uma constituição de células de energia, conectadas em série, paralelo ou em ambos.

A regra geral é que baterias secundárias são aquelas que conseguem suportar 300 ciclos completos de carga e descarga com 80% de sua capacidade.

Bom, se estamos falando de smartphones, ou qualquer outro dos seus gadgets com bateria recarregável, estamos lidando com aparelhos que contam com uma bateria com células secundárias.

Esse conhecimento entre os termos “bateria primária” e “bateria secundária” pode estar meio deslocado do grande público, no entanto, quando falamos na mensuração das baterias secundárias é um tema bem mais comum. É provável que você já ouviu alguém falar, “ah, meus smartphone tem uma bateria de 3.000 mAh (valor aleatório)”. Os próprios fabricantes fazem questão de destacar essa informação.

Como explica este TCC, “As baterias são mensuradas por Ah (Ampére-hora) ou Wh (Watt-hora): um Watthora indica o quanto de energia armazenada ou também pode ser dito como a energia gasta pela bateria durante o período de uma hora: já se tratando de Ah é a unidade de medida de capacidade da bateria, um Ah significa o quanto de energia armazenada na bateria suficiente para fornecer uma corrente de um ampére durante uma hora.

Uma bateria contendo 24 watt-hora, por exemplo, é possível operar uma ferramenta elétrica consumindo 24 watt durante uma hora, se acaso a máquina exigir uma potência maior, por exemplo, 48 watt a máquina somente poderá funcionar em um período de trinta minutos. Estes cálculos são somente como referência, sendo que, na prática com uma exigência de uma maior potência de saída, outras características da bateria serão afetadas reduzindo o tempo de operação da máquina”.

A bateria de íons de lítio não é o primeiro padrão om células secundárias (aquelas que podem ser recarregadas, devido a sua ação química reversível). Há também a bateria de chumbo-ácido, conhecida por seu uso em automóveis, bateria de níquel-hidretro metálico e as baterias de célula de níquel cádmio.

O efeito memória

Foi justamente graças a uma particularidade da bateria de níquel-cádmio (lançada em 1899) que até hoje muitas pessoas insistem que a bateria a “bateria ta viciada”. A particularidade mais comentada da bateria de níquel-cádmio é o famoso “efeito memória”, esse seria o efeito que ficou popularmente associado com o jargão “bateria viciada”. Segundo o engenheiro elétrico Nihal Kularatna, o termo mais correto para o que popularmente ficou taxado de efeito memória é “condicionamento”.

Bateria de niquel cádmio

O efeito memória tem relação com uma característica técnica dessa bateria. Caso a bateria fosse descarregada sempre até o mesmo nível e depois recarregada, com o tempo, adquire isso que ficou conhecido como memória, a bateria iria se ajustando ao seu padrão de carga, perdendo sua plena capacidade.

O efeito memória, ou condicionamento, causado por pelo modo de uso, faz com que a formação dos cristais, parte ativa de uma bateria de níquel, aumente, escondendo o material ativo do eletrólito, responsável por permitir a condutividade dos íons.

Mesmo com baterias de íon de lítio, presente na maioria dos celulares há muitos anos, algumas pessoas ainda acreditam que, assim que um novo aparelho é comprado, é preciso aplicar uma carga inicial bem longa, de 6 a 8 horas (já ouvi até quem sugerisse uma carga de 24 horas), ou até mesmo que o celular não pode ser colocado na bateria antes da carga zerar, recomendação que seria uma forma de evitar o vício (ou efeito memória).

Essas recomendações estão completamente em desacordo com os avanços oferecidos pelas baterias de íon de lítio. E ainda tem mais, alguns estudos sugerem que, mesmo quando falamos de baterias de células de níquel-cádmio (NiCD), o tal efeito memória só aconteceria num processo de carga e descarga no mesmo ponto após anos. Portanto, até mesmo na bateria em que essa limitação realmente é tecnicamente possível, a chance de acontecer é remota.

Até aqui, acredito que já ficou claro para você que o tal vício na bateria do seu aparelho não existe. Entretanto, é bem provável que você continue com a sensação de que o seu aparelho não é tão eficiente comparado quando você comprou, que a bateria parece durar menos. Esse não seria então o efeito do vício? A resposta é não!

O desgaste da bateria

Não quero te desanimar, mas as baterias de íon de lítio começam a se desgastar no momento que saem da fábrica. Essa não é a única desvantagem quando falamos desse tipo de bateria, sob altas temperaturas o processo de desgaste acaba sendo acelerado. Em situações mais extremas, até explosões podem acontecer.

Para você entender essa parte da sensação da bateria durando menos, que nada tem a ver com um vício ou efeito memória, é importante separar dois conceitos que muitas vezes são tratados como se fossem a mesma coisa: autonomia da bateria e vida útil da bateria.

  • Autonomia da bateria: duração com uma única carga. É o tempo em que você poderá ficar utilizando o dispositivo até você ter que colocá-lo novamente no carregador.
  • Vida útil da bateria: relação com o processo de desgaste natural. Por mais cuidadoso que você possa ser com o seu aparelho, a vida útil será reduzida, ocasionado uma queda no desempenho – o tempo que você consegue utilizar o dispositivo antes que tenha que carregar novamente -, comparado ao que era quando foi comprado, novinho em folha

A bateria do seu dispositivo vai realmente ficando mais “fraca” ao decorrer da sua vida útil devido ao que é conhecido como ciclagem da célula. O processo completo de carga e descarga.

Esse processo de carga e descarga que conta como um ciclo não vale para os momentos que você tira e recoloca o aparelho na tomada em determinada circunstância. Por exemplo, seu telefone está carregando, você então remove do carregador e algum tempo depois recoloca, isso não conta como um ciclo. O ciclo é quando a bateria é descarregada 100%.

A cada ciclo completo há um processo de desgaste, que contribui para a queda de eficiência da bateria, em termos de vida útil. Os fabricantes geralmente especificam como vida útil algo em torno de 300 e 500 ciclos de carga e descarga, porém isso pode variar para mais e para menos.

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Ao invés de se preocupar com o vicio da bateria, que não representa nada, o que você deve fazer é manter boas práticas para que sua bateria seja preservada o máximo possível. Como disse mais acima, altas temperaturas aceleram ainda mais o processo de desgaste da vida útil bateria do seu smartphone, que impacta diretamente em sua duração com uma carga.

A tempeatura ideal de operação é entre 16 e 22 ºC. Evite expor seu celular a temperaturas acima de 35ºC. Em certas regiões do Brasil, durante boa parte do ano, isso se torna uma missão difícil, mas tenha em mente que mesmo em lugares muito quentes você pode adotar certas medidas de segurança, como, por exemplo, não deixar seu celular exposto ao sol durante muito tempo, ainda mais se a bateria estiver sendo carregada. Ambientes muito frios também contribuem para acelerar o processo de desgaste.

Evitar descarregar ou carregar totalmente também é uma dica interessante, levando em conta aquela contagem da ciclagem, que corresponde a ausência total de carga ou carga completa. Tente sempre recaregar a bateria quando ela já estiver entre 15 e 20% de carga.

Outra dica valiosa é referente a conservação da bateria quando o aparelho permanecer desligado por longos períodos. Se o seu dispositivo ficar guardado por muito tempo desligado cuide para que a carga da bateria esteja em torno de 50%, já que, caso fique guardado totalmente descarregado, ele pode entrar no processo de descarga intensa.

Ao mesmo tempo, se ele for guardado com a carga completamente cheia pode também contribuir para reduzir a vida útil, explica a Apple em seu site. Dessa maneira, o equilíbrio é fundamental!

bateria viciada

É sério, trate com extrema atenção a questão da temperatura que o seu dispositivo é exposto. Além de falhas grotescas de projeto, como no caso do Galaxy Note 7, a tendência de aparelhos cada vez mais finos trazem não apenas uma responsabilidade por parte do fabricante, com o design do produto, mas também demandam a atenção por parte do usuário com o uso do dispositivo.

Jamais recarregue a bateria com o seu smartphone envolto em roupas ou qualquer outra coisa que o faça aquecer além do normal, e, sempre, utilize carregadores de qualidade

Sobre o Autor

Editor-chefe no Hardware.com.br, aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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