Os primeiros processadores: do 8088 ao 486

Os primeiros processadores: do 8088 ao 486

O primeiro microchip comercial foi lançado pela Intel em 1971 e chamava-se 4004. Era um chip bastante primitivo, que processava instruções de 8 bits, transferia os dados através de um barramento de apenas 4 bits e operava a apenas apenas 740 kHz.

Na verdade, o 4004 era tão lento que demorava 10 ciclos para processar cada instrução, ou seja, ele processava apenas 74 mil instruções por segundo, contra os vários bilhões de instruções por segundo processadas por um chip atual. Hoje em dia esses números parecem piada, mas na época era a última palavra em tecnologia. O 4004 era cerca de 15 vezes mais rápido que o ENIAC e permitiu o desenvolvimento das primeiras calculadoras eletrônicas portáteis.

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Intel 4004

Pouco tempo depois, a Intel lançou um processador de 8 bits, o 8008, que foi logo substituído pelo 8080, uma versão aperfeiçoada que fez sucesso durante muitos anos.

Embora ainda fosse um processador de 8 bits, o 8080 era muito mais rápido que o 8008 e oferecia suporte a algumas instruções de 16 bits, que podiam ser carregadas com a ajuda de três pares de registradores. Ele operava a 2 MHz e era capaz de processar 500 mil instruções por segundo, o que na época era um valor assombroso. Como se não bastasse, ele era capaz de acessar incríveis 64 kbytes de memória, mais do que qualquer mortal poderia sonhar… 🙂

Em 1977 a AMD passou a vender um clone do 8080, inaugurando a disputa Intel x AMD, que continua até os dias de hoje.

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O 8080 da AMD

O 8080 foi o chip usado no Altair 8800 que, lançado no final de 1974, é considerado por muitos o primeiro computador pessoal da história. Na época, computadores eram grandes e absurdamente caros, por isso poucos tinham oportunidade de ter contato com um. Mesmo nos cursos de programação, tudo era feito em papel e apenas os mais sortudos tinham a chance de rodar os programas em um computador real. O Altair foi seguido por muitos computadores pessoais de 8 bits, como o Apple I, Apple II e o ZX-80.

Depois dessa primeira fase, os computadores pessoais finalmente começaram a atingir um nível de desenvolvimento suficiente para permitir o uso de aplicativos sérios. Surgiram então os primeiros aplicativos de processamento de texto, planilhas, e até mesmo programas de editoração e desenho, que aproveitavam ao máximo os recursos oferecidos pelas máquinas de 8 bits da época. Esse mercado crescente chamou a atenção da IBM, o que levou ao início da era PC.

A IBM de 1980 era uma empresa especializada em mainframes e terminais burros. Entretanto, percebendo a crescente demanda por computadores pessoais, decidiram criar um pequeno grupo (que originalmente possuía apenas 12 desenvolvedores) para desenvolver um computador pessoal, sem grandes pretensões.

O PC era considerado um projeto menor dentro da IBM, apenas uma experiência para testar a demanda do mercado. O projeto chegou a ser marginalizado dentro da empresa, pois muitos executivos acreditavam que o IBM PC poderia concorrer com outros produtos do portfólio da IBM, canibalizando as vendas.

Depois de quase um ano de desenvolvimento, o projeto rendeu frutos e o primeiro PC foi lançado em 12 de agosto de 1981:

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O PC original

Para cortar custos e acelerar o desenvolvimento, a equipe decidiu que usaria apenas componentes padrão, que pudessem ser encontrados facilmente no mercado. O processador escolhido foi o Intel 8088, uma versão econômica do processador 8086, que havia sido lançado pela Intel em 1978. Quando a IBM estava desenvolvendo seu computador pessoal, chegou a ser cogitado o uso do 8086, mas acabou sendo escolhido o 8088 devido à questão do custo.

Tanto o 8086 quanto o 8088 são processadores de 16 bits, considerados bastante avançados para a época. Um processador de 16 bits é capaz de endereçar mais memória (até 64 KB de memória de cada vez) e processar instruções muito mais complexas que os processadores de 8 bits usados até então.

A grande diferença entre os dois é que o 8086 é um processador de 16 bits “puro”, enquanto o 8088 se comunica com os demais periféricos usando um barramento de 8 bits. Isso naturalmente prejudicava o desempenho, mas trouxe uma vantagem importante: a possibilidade de usar os componentes de 8 bits usados em outros computadores da época, que eram muito mais populares e baratos.

Essa arquitetura permitiu ao primeiro PC competir na mesma faixa de preço dos computadores de 8 bits mais populares e, ao mesmo tempo, possuir um desempenho bem superior devido ao seu processador de 16 bits. O 8088 é capaz de acessar até 1 MB de memória RAM (embora o PC original suportasse apenas 256 KB, devido a limitações por parte da placa-mãe) e funciona a 4.77 MHz, oferecendo um desempenho mais do que respeitável para os padrões da época.

Para suportar o 1 MB de memória (mesmo sendo um processador de 16 bits) o 8088 usava a segmentação de endereços, usando 4 bits adicionais de endereçamento para dividir a memória em 16 blocos de 64 KB cada um.

O grande problema com a segmentação é que o processador pode acessar um único bloco de cada vez, constantemente chaveando entre eles. Se um aplicativo está lendo dados no bloco 1 e subitamente precisa de informações armazenadas no bloco 2, o processador precisa limpar todos os endereços relativos ao bloco 1 e carregar os endereços do bloco 2. Neste momento, o processador perde o acesso ao bloco 1 e passa a enxergar apenas o segundo bloco. Quando novamente for preciso ler ou gravar dados no bloco 1 (ou qualquer outro bloco), novamente são carregados os endereços relativos a ele, e o acesso ao bloco 2 é perdido. Como pode imaginar, esse sistema resultava em uma grande penalidade do ponto de vista do desempenho.

Vendo por esse lado o PC original parecia realmente muito primitivo. Para colocar as coisas em perspectiva, é importante lembrar que o principal concorrente do IBM PC na época de lançamento era o Apple II que, embora fosse mais barato e contasse com mais softwares disponíveis, usava um processador de 8 bits operando a apenas 1 MHz, com 4 KB de memória RAM.

Entretanto, o aspecto técnico não foi o determinante para o sucesso do PC. Ele era um bom computador para a época, mas era caro e não tinha nada que os concorrentes não pudessem usar em seus produtos. Ele tinha tudo para ser apenas mais um no mercado, se não fosse um diferencial importante: a arquitetura aberta.

Diferente de outros computadores da época, qualquer fabricante podia desenvolver e vender acessórios para o PC, sem pagar royalties ou fazer acordos de licenciamento. Como todos os componentes podiam ser encontrados no mercado, era possível também desenvolver clones, computadores compatíveis com o PC, fabricados por outras empresas. Isso lentamente fez com que toda a indústria passasse a orbitar em torno do PC, fazendo com que a plataforma crescesse assustadoramente.

Voltando ao tema original, o PC original tinha, em sua versão mais simples, apenas 16 KB de memória RAM, com direito apenas ao gabinete e teclado. A partir daí, tudo era opcional, incluindo o monitor (você podia usar uma TV, embora a qualidade da imagem fosse ruim), os drives de disquete e o HD. Também estava disponível um conector para um gravador de fitas K7 (localizado ao lado do conector para o teclado), mas ele nunca foi muito usado e desapareceu a partir do XT.

Na configuração básica, o PC custava “apenas” 1.564 dólares da época, mas incluindo mais 48 KB de memória, dois drives de disquete e um monitor mono de 12″, o preço chegava facilmente a 2.500 dólares, que equivalem a mais de 7.000 dólares em valores atuais.

Na época, os HDs ainda eram um componente caro e exótico. Em 1981, um Seagate ST-506 (o modelo mais popular até então) custava mais de 1.000 dólares (da época) e tinha apenas 5 MB de capacidade.

Este HD da foto a seguir é um ST-225 (também da Seagate), um modelo de 20 MB, lançado em 1984, que foi muito usado nos micros 286. Esses primeiros modelos ainda utilizavam motores de passo para mover as cabeças de leitura (como nos drives de disquete), por isso os problemas eram comuns:

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Seagate ST-225, de 20 MB

Ao usar um PC sem HD, o sistema operacional e todos os programas eram carregados a partir de disquetes de 5¼. Inicialmente eram usados disquetes de 180 KB, mas eles foram logo substituídos por disquetes de 360 KB (onde eram usadas as duas faces do disco) e, alguns anos mais tarde, por disquetes de “alta densidade”, com 1.2 MB. Os disquetes de de 3.5″, com 1.44 MB, que usamos hoje em dia passaram a ser usados nos PCs apenas em 1987, com o lançamento do IBM PS/2. Existiu ainda um padrão de disquetes de 2.8 MB, lançado nos anos 90, que acabou não pegando.

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Disquetes de 5¼

O PC era monotarefa, de forma que para carregar outro programa, você precisava primeiro encerrar o primeiro e trocar o disquete dentro do drive. O segundo drive de disquetes era um item popular (e necessário), pois os disquetes de 5¼ eram muito frágeis e a mídia se degradava com o tempo, de forma que você precisava copiar os discos frequentemente.

Conforme foram sendo lançados PCs com mais memória RAM, surgiu o “macete” de criar um ramdisk (um pedaço da memória RAM usado como se fosse um HD) e usá-lo para copiar disquetes sem precisar de um segundo drive. Também era comum aparecerem versões “capadas” dos principais programas, com componentes e bibliotecas desativados ou removidos, de forma a rodar nos PCs com menos memória RAM. Naquela época, ainda não existia memória swap, de forma que se o PC não tivesse memória suficiente, os programas simplesmente não rodavam.

O sistema operacional usado no PC original era o MS-DOS 1.0 (na época ainda chamado de PC-DOS), que foi desenvolvido às pressas pela Microsoft com base num sistema operacional mais simples, o QDOS, que foi por sua vez comprado da Seattle Computers, uma pequena empresa desenvolvedora de sistemas. Na verdade, a Microsoft foi a segunda opção da IBM, depois de ter sua proposta de licença recusada pela Digital Research, que desenvolvia versões do seu CP/M para várias arquiteturas diferentes.

Na época, a IBM acreditava que ganharia dinheiro vendendo as máquinas e não vendendo sistemas operacionais e softwares, o que era considerado um negócio menor, dado de bandeja para a Microsoft.

Com o passar do tempo, os executivos da IBM se arrependeram amargamente da decisão, pois a concorrência entre os diversos fabricantes derrubou os preços e as margens de lucro dos PCs, enquanto a Microsoft conseguiu atingir um quase monopólio do sistema operacional para eles e, sem concorrentes de peso, passou a trabalhar com margens de lucro cada vez maiores.

Um fabricante de memórias, como a Micron, trabalha normalmente com margens de lucro abaixo de 1%. Conseguem ganhar dinheiro apenas por venderem quantidades muito grandes. Um integrador como a Dell trabalha com margens de 3 a 5% (e leva prejuízo às vezes, nas unidades que ficam muito tempo em estoque ou não vendem), enquanto a Microsoft (mesmo com toda a pirataria) trabalha com margens superiores a 80% vendendo o Windows e Office, um negócio da China.

Hoje em dia, a IBM sequer fabrica PCs. Mesmo os famosos notebooks IBM Thinkpad são agora fabricados e vendidos pela Lenovo, uma empresa Chinesa que comprou os direitos sobre a marca em 2000.

Voltando à história, dois anos depois foi lançado o PC XT, que apesar de continuar usando o 8088 de 4.77 MHz, vinha bem mais incrementado, com 256 KB de RAM, disco rígido de 10 MB, monitor CGA e o MS-DOS 2.0.

O XT se tornou um computador bastante popular, rapidamente clonado por outros fabricantes, que passaram a vender versões modificadas, com mais memória, HDs de maior capacidade, monitores coloridos e até mesmo versões com processadores da AMD, que vendia uma versão do 8088 capaz de operar a 10 MHz. Ele chegou a ser até mesmo fabricado no Brasil, durante a época da reserva de mercado.

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Placa-mãe de um clone do PC XT, com um 8088 da AMD

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