A última sexta-feira (3) marcou o centésimo dia da invasão da Rússia à Ucrânia, que mostrou ao mundo que a internet é um importante campo de batalha.
Hoje (8), no 105º dia do conflito, enquanto os soldados na Ucrânia continuam a lutar contra os avanços da Rússia no leste do país, ocorre outra batalha, pelo controle da internet ucraniana.
Em áreas da Ucrânia sob ocupação militar da Rússia, o acesso à internet não existe ou está desestabilizado, deixando a população local isolada do resto do mundo.
Em 26 de fevereiro, dois dias após o início da invasão, Elon Musk enviou satélites da Starlink para fornecer internet à Ucrânia.
No entanto, como revela o vice-primeiro-ministro da Ucrânia, no início de maio, os usuários das redes da Starlink correspondiam por cerca de 150 mil pessoas, ou seja, 0,5% da população do país.
Rough data on Starlink's usage: around 150K active users per day. This is crucial support for Ukraine's infrastructure and restoring the destroyed territories. Ukraine will stay connected no matter what. pic.twitter.com/XWjyxPQJyX
— Mykhailo Fedorov (@FedorovMykhailo) May 2, 2022
Starlink: Elon Musk leva internet à Ucrânia
Agora, sobretudo, surgiu uma nova estratégia em que a internet está voltando a funcionar, mas o controle do tráfego online não é da Ucrânia. Em vez disso, o controle do tráfego passou para as mãos dos sistemas de rede do governo da Rússia.
Essa estratégia começou em meados de maio, quando a sede de um provedor de internet chamado Status, na cidade de Kherson, no sul da Ucrânia, foi invadido por soldados russos que obrigaram os donos da empresa a conectar o ISP a uma rede na Crimeia.
A informação foi divulgada pelo Serviço de Proteção Especial de Comunicações e Informação do Governo da Ucrânia.
Sistema de vigilância russo monitora atividade online de ucranianos
A Rússia controla e governa a Crimeia como parte da Federação Russa, embora para a comunidade internacional a região faça parte da Ucrânia. Portanto, como a Crimeia atualmente está sob controle da Rússia, a internet de Kherson passou a ser algo que diz respeito ao Estado russo.
Assim, no dia 30 de maio, o tráfego de internet da empresa Skynet foi configurado para fluir através da Miranda Media. A Miranda Media é uma empresa da Crimeia afiliada da Rostelecom, a companhia de telecomunicações da Rússia controlada pelo governo Putin.
Essa mudança no controle do tráfego significa, obviamente, que os dados dos usuários da Skynet serão estarão sob a monitoração pelo sistema de vigilância do governo russo, o SORM.
SORM é uma sigla para Sistema para Atividades Investigativas Operacionais, sendo responsável por interceptações de telecomunicações que operam na Rússia.
Com o monitoramento da Rússia do acesso à internet em tal região da Ucrânia, os usuários podem perder o direito de navegar livremente, de acordo com o chefe do serviço de proteção à informação da Ucrânia, Victor Zhora.
“O uso do sistema SORM na Ucrânia é inaceitável. Esse tipo de sistema de vigilância que a Rússia implementou é uma violação clara aos direitos humanos. O objetivo do inimigo é eliminar o acesso do nosso povo a informações verdadeiras, disponibilizando apenas propaganda russa”, afirma Zhora.
Governo da Ucrânia pode prender quem fornecer internet controlada pela Rússia
Com isso, cidadãos da Ucrânia em cidades ocupadas, como Kherson, enfrentam uma escolha difícil. Eles precisam optar entre se desconectar da internet e, desse modo, não poder se comunicar com os entes queridos, ou usar uma rede operando sob a vigilância do governo russo.
Embora a segunda opção seja arriscada, muitos cidadãos dessas cidades optaram por se manter conectados, para o desagrado dos governantes da Ucrânia. Na verdade, desagrado por parte da Ucrânia é eufemismo, pois o governo do país ameaça prender quem ceder ao controle da internet no país pela Rússia.
Esse é o caso de Hudz Dmitriy Aleksandrovich, CEO da Skynet, o provedor de internet consideravelmente pequeno da cidade de Kherson. Após a captura da cidade pela Rússia, no início de março, os clientes da empresa de Aleksandrovich não conseguiram acessar a internet e ficaram isolados dos seus entes queridos.
A única forma de voltar online, no entanto, era se conectar à Miranda Media, a rede controlada pelo governo russo citada acima. A decisão tomada por Aleksandrovich foi a de continuar a fornecer internet aos seus consumidores, decidindo se conectar à Miranda Media.
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Hoje (8), no entanto, Aleksandrovich afirmou em entrevista que o serviço de segurança da Ucrânia o acuso de ser um traidor e prendeu um dos seus colegas na região de Dnipropetrovsk, próxima de Kherson e ainda sob controle ucraniano.
O CEO da ISP também teme pela sua prisão, mas ele está fora do alcance do governo ucraniano devido à ocupação russa em Kherson.
“Se você for médico, você ajudará as pessoas, todas elas. Eu não sou um traidor. Somos [Skynet] um provedor de internet — nós devemos ajudar as pessoas. Esse é o meu dever”, afirmou Aleksandrovich.
Ao todo, há mais de 700 provedores de internet nos territórios da Ucrânia ocupados atualmente pela Rússia, de acordo com Lillia Malon, comissária da infraestrutura digital da Ucrânia.
Segundo Malon, todos esses provedores estão vulneráveis à interferência russa. “Para a Rússia, é um objetivo e um alvo crucial destruir a infraestrutura da internet da Ucrânia, ou capturá-la. Entretanto, nós acreditamos e temos esperança que esse território retornará a ser nosso em breve e esse problema desaparecerá”, afirmou Malon.