Overclock

Overclock

Se você chegou até aqui, já deve ter percebido que a frequência de operação dos processadores (e também das memórias e outros circuitos) não é fixa, mas sim definida pela combinação da frequência do barramento (ou da frequência base, no caso do i7 e dos Phenom) e de um multiplicador.

Assim como um atleta, que pode correr mais rápido ou mais devagar, o clock do processador pode ser também ajustado para mais ou para menos, de acordo com a necessidade. Você pode obter mais desempenho aumentando a frequência até o máximo suportado por ele (overclock), indo muitas vezes 40 ou até 60% além da frequência padrão, ou, caso desejado, reduzir a frequência (underclock), fazendo com que o processador aqueça menos e consuma menos energia.

A motivação óbvia é extrair mais desempenho do processador sem precisar pagar mais por isso, o que é sempre uma boa notícia em épocas de crise. Normalmente, mesmo os piores processadores para overclock podem oferecer um ganho adicional de 8 ou 10% e alguns processadores específicos podem oferecer 50% ou mais.

O Pentium E5200, por exemplo, utiliza FSB de 200 MHz (com 4 transferências por ciclo, o que resulta nos 800 MHz anunciados) e multiplicador de 12.5x. Assim como em quase todos os processadores atuais, o multiplicador é travado, por isso qualquer alteração na frequência precisa ser feita ajustando a frequência do FSB através do setup. Aumentando a frequência para 266 MHz o processador passa a trabalhar a 3325 MHz e, ao aumentá-la para 300 MHz você obtém 3.75 GHz, frequências nas quais o humilde Pentium E pode superar a maioria dos Core 2 Quad em jogos e outros aplicativos não otimizados para o uso de 4 núcleos.

Naturalmente, a operação estável depende também do cooler, qualidade da placa-mãe, frequência das memórias, e de outros fatores, mas a ideia básica é essa.

A explicação para margens tão grandes de overclock é a forma como os processadores são produzidos e vendidos. Para cortar custos e simplificar a produção, os fabricantes utilizam a mesma linha de produção para produzir todos os processadores de uma determinada família. Temos então uma única linha para todos os processadores baseados no núcleo Penryn, por exemplo, da qual saem todos os Core 2 Duo, Core 2 Quad (obtidos através da combinação de dois processadores dual-core) e Pentium E de 0.045 micron.

Mesmo dois processadores produzidos sobre o mesmo wafer nunca são exatamente iguais, já que pequenas diferenças de foco durante o processo de litografia e pequenas variações na superfície do wafer fazem com que alguns processadores sejam mais perfeitos que outros, o que se traduz em diferenças nas frequências de clock suportadas e até mesmo no consumo elétrico de cada unidade.

Depois que o wafer é cortado, os processadores são testados individualmente e as melhores unidades são destinadas às famílias com clock maior, enquanto as demais vão para as linhas de baixo custo. Em um terceiro nível temos os processadores com defeitos em partes do cache L2 ou em alguns dos núcleos, que têm parte do die desativado e (no caso da Intel) são vendidos como Pentiums E ou Celerons.

O processo de separação e classificação dos processadores é chamado de “binning”, e o de aproveitamento dos núcleos com pequenos defeitos é chamado de “die-harvesting”, dois termos que você ouvirá muito ao ler material técnico.

Este processo tem o objetivo de extrair o máximo de processadores funcionais de cada wafer e, ao mesmo tempo, possibilitar a segmentação do mercado, com processadores de alto, médio e baixo custo saindo das mesmas fábricas, e executivos felizes com os lucros:

O que abre margem para overclocks generosos em alguns modelos é o fato de que os clocks dos processadores vendidos não são determinados pela real capacidade dos processadores, mas sim por estudos de mercado, que calculam os preços de acordo com a demanda e as ofertas dos concorrentes. A isso, se soma o simples fato de que sempre existe mais demanda pelos processadores mais baratos (que são vendidos a partir de US$ 39 no exterior) do que pelos modelos high-end (que podem custar até US$ 999).

Com isso, os fabricantes acabam sendo obrigados a vender processadores perfeitamente saudáveis (capazes de trabalhar a frequências muito mais altas) como modelos de baixo custo, o que abre brecha para grandes overclocks.

Em vez de gastar todas as suas economias em um modelo high-end, você pode comprar o modelo mais barato dentro da linha (ou o segundo mais barato, quando a diferença for pequena) e simplesmente cobrir a diferença com um bom overclock, investindo a economia em outros componentes do micro. Quanto menos dinheiro você tem para gastar, mais vantajoso um bom overclock pode ser.

De uma forma geral, os processadores mais vantajosos são os modelos dual-core que utilizam uma frequência de FSB mais baixa, como no caso dos Pentium E, que trabalham com bus de 800 MHz (contra os 1066 dos Core 2 Duo) e os Core i3. O motivo é simples: com exceção dos processadores das séries Extreme (Intel) e Black Edition (AMD), todos os modelos vendidos possuem o multiplicador travado, de forma que aumentar a frequência do FSB é o único jeito de fazer overclock. Com um FSB baixo, você tem uma margem muito maior para fazer overclock, sem precisar de uma super placa-mãe.

Uma certa dose de sorte é também um fator importante, já que comprar um processador com uma margem maior ou menor de overclock é uma espécie de loteria. A dica básica é sempre procurar pelas séries de fabricação mais recente, já que os processos de fabricação são aperfeiçoados ao longo do tempo, fazendo com que os processadores produzidos suportem overclocks cada vez maiores, até que uma nova técnica de produção seja introduzida, recomeçando o ciclo. Quase sempre, as melhores séries para overclock estão justamente entre as últimas produzidas, quando o modelo já está para ser descontinuado.

Outro componente fundamental é a placa-mãe, que precisa oferecer um bom conjunto de ajustes de frequências e tensões, além de ser capaz de se manter estável a frequências bem mais altas que as default.

De uma forma geral, qualquer placa mid-range da Gigabyte, Asus ou mesmo da ECS vai oferecer um conjunto suficiente de opções, mas é importante evitar as placas da Intel, que, apesar da boa qualidade, praticamente não oferecem opções de ajustes.

A placa-mãe é sempre o melhor lugar para investir parte do dinheiro economizado no processador. Se puder pagar um pouco mais por uma placa com capacitores sólidos, baseada em um chipset para estações de trabalho (como a Gigabyte EP45-UD3L e a Asus P5Q para o Core 2 Duo, que são baseadas no P45), você dificilmente vai se arrepender.

Existem também placas destinadas a entusiastas, como a Asus Rampage II Extreme (baseada no chipset X58), que são bem mais caras e oferecem diferenciais como circuitos reguladores de tensão superdimensionados, com conjuntos mais completos de opções no setup, exaustores de cobre e heat-pipes para a refrigeração do chipset e dos MOSFETs.

Elas sem dúvidas oferecem margens de overclock maiores que as placas mainstream dos mesmos fabricantes, mas a diferença de custo não compensa. Elas são mais voltadas para quem tem dinheiro para gastar e quer simplesmente obter as maiores frequências possíveis e não para quem está preocupado com o custo-benefício. Assim como em outras áreas, o overclock se comercializou com o tempo, e os fabricantes passaram a explorar o mercado com produtos de nicho, vendidos com margens de lucro maiores.

Finalmente, temos a questão do cooler e da refrigeração geral do PC. Os coolers que acompanham os processadores in-a-box são dimensionados para atenderem o processador na frequência default, mas oferecem margens pequenas ao fazer overclock. Em muitos casos, é possível ir relativamente longe usando o cooler stock (desde que você use um gabinete bem ventilado), mas a temperatura se tornará um limitante muito antes do processador atingir seu máximo.

Para atingir os melhores resultados, o melhor é comprar um processador retail (os modelos sem o cooler, que são um pouco mais baratos) e reservar 100 ou 150 reais para comprar um cooler de maior calibre.

A regra básica é que você precisa de um cooler capaz de atender com folga a um modelo high-end com uma frequência similar à que você pretende atingir com o overclock. Se você pretende chegar aos 4 GHz, por exemplo, procure um cooler adequado a um processador dessa frequência.

A questão da dissipação térmica é um dos principais motivos de os processadores dual-core permitirem quase sempre overclock muito mais generosos que os quad-cores. Com apenas dois núcleos, a dissipação térmica do processador em full-load é quase a metade da de um processador quad-core da mesma arquitetura operando à mesma frequência.

Outra dica é que, no caso dos processadores soquete 775, você pode em muitos casos aproveitar coolers antigos, de processadores Pentium D. Como eles possuem uma dissipação térmica muito alta (a maior parte dos modelos trabalham com um TDP de 130 watts, assim como os Core 2 Quad), os coolers quase sempre atendem aos processadores Core 2 Duo e Pentium E com uma boa folga.

Concluindo, muito se fala sobre os riscos de fazer overclock, principalmente nos casos mais extremos. É bem verdade que casos de processadores e até mesmo placas-mãe danificadas são relativamente comuns, mas, quase sempre, eles são causados por aumentos excessivos nas tensões ou outros abusos e não devido ao aumento no clock propriamente dito.

De uma forma geral, podemos dizer que simplesmente aumentar a frequência de operação, sem mexer nas tensões oferece um risco muito pequeno, já que o processador simplesmente vai travar por um erro qualquer de processamento ao ultrapassar a frequência máxima suportada. Nesse caso, basta limpar o CMOS (caso necessário) e começar novamente.

O nível seguinte de risco consiste em aumentar levemente as tensões (algo entre 4 e 6%), o que continua dentro da margem de tolerância dos circuitos e permite estabilizar o processador em frequências um pouco mais altas. O maior risco nesse caso passa a ser o aquecimento, já que ao aumentar simultaneamente o clock e a tensão, a dissipação térmica do processador passa a crescer de forma geométrica. Em situações normais, o superaquecimento não é um grande risco (o processador simplesmente vai travar ou reduzir o clock ao atingir uma certa temperatura, evitando danos permanentes), mas o uso prolongado do processador em altas temperaturas pode reduzir a vida útil.

O terceiro nível é aumentar muito a tensão do processador ou das memórias (muitos chegam a aumentar em 15% ou mais) o que é realmente perigoso e pode causar danos em um período de tempo relativamente curto (mesmo que o processador funcione estavelmente com uma tensão 15 ou 20% superior à padrão, pode ter certeza que a vida útil será bem menor). Quase sempre, as histórias de horror envolvendo processadores e placas queimadas, são justamente causadas por exageros no aumento das tensões.

Apesar do nível extremo de miniaturização dos transistores, um processador atual tem sua vida útil estimada em décadas, e não em meses ou anos. Se você continuasse utilizando seu PC continuamente, o processador seria, bem provavelmente, o último componente a falhar, bem depois da fonte, coolers, HDs e placa-mãe.

Em condições normais, o “desgaste” do processador devido ao overclock acontece gradativamente, seguindo o rumo da vida útil normal do processador, que é afetada também por variáveis como a temperatura e a estabilidade das tensões oferecidas pela placa-mãe. Salvo defeitos e acidentes em geral, as falhas catastróficas de processadores são muito raras. Em 99.9% dos casos o que acontece é um envelhecimento gradual, que lhe obriga a reduzir a frequência em pequenos incrementos para manter a estabilidade.

Seu Phenom II com overclock para 3.6 GHz pode começar a apresentar sinais de instabilidade depois de um ou dois anos de uso, por exemplo, obrigando-o a reduzir a frequência para 3.54 GHz. Depois de mais um ou dois anos, você pode ser obrigado a reduzir a frequência mais um pouco, e assim por diante.

Um bom exemplo é um Celeron 300 (um Mendocino) que montei em 1999. Ele funcionou por quase três anos em overclock para 450 MHz e depois mais dois anos em overclock para 436 MHz, até ser finalmente aposentado. Hoje em dia ele não funciona mais estavelmente nos 450 MHz iniciais, mas ainda é valente o suficiente para manter os 436 MHz da segunda fase com estabilidade. Se tivesse escolhido usar um overclock inicial mais leve (para 390 MHz, por exemplo) o resultado final seria provavelmente o mesmo. Assim como em tantos outros casos, o processador deixou de ser usado por ter se tornado obsoleto, e não devido ao overclock.

A velocidade com que o processo é acelerado depende do nível de overclock que você pretender atingir, o que nos leva à distinção entre duas categorias de overclockers (usuários que fazem overclock). A primeira é a dos usuários “normais”, que simplesmente querem um pouco mais de desempenho, sem precisar pagar mais por isso. Se você é um deles, vai querer evitar overclocks extremos e grandes aumentos nas tensões, já que a ideia é que o micro continue funcionando de forma estável por vários anos.

A segunda categoria é a dos entusiastas, que simplesmente querem atingir o melhor desempenho possível, mesmo que seja por um curto espaço de tempo. Fazer parte desse grupo significa investir um bom tempo em testar várias combinações de configurações e rodar benchmarks, além de gastar um bom dinheiro em coolers e outros acessórios e, esporadicamente, também em um processador ou uma placa-mãe nova.

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