O velho problema dos travamentos

O velho problema dos travamentos

O que vocês acham de acordarem cedinho para trabalhar, mas na hora de tomar aquele banho, o chuveiro elétrico não funcionar? Ou durante o café da manhã, a torradeira travar e não liberar a tão esperada torrada que será lambuzada de manteiga? Ou ainda, o carro não pegar justamente quando falta menos de uma hora para chegar ao trabalho? Bem, este cenário pode ser simplesmente inadmissível, dependendo do bom humor de cada um; no entanto, muitos acham “normal” o Windows travar…

O Windows – como qualquer outro sistema operacional, bem como os aplicativos, drivers e outros softwares do gênero – sempre travou ao longo dos anos, desde a época de suas primeiras versões ao mais moderno e atualizado Windows 7. No entanto, ele ganhou a fama de ser um sistema operacional instável, graças em grande parte ao gerenciamento de processos, que antigamente não recebia tanta atenção o quanto nos dias atuais, onde a estabilidade passa a ser tão importante quanto o desempenho. Injustiça? Nem tanto; em todo o caso, o artigo de hoje terá como ênfase, a análise das principais causas para o travamento do Windows.

Então, vamos começar pela parte mais “dura”: o hardware. De modo mais direto, entenda como “a parte que a gente chuta”! 😉

Independente do sistema operacional em uso, qualquer PC desktop irá travar ou sofrer problemas relacionados à instabilidade, se a montagem, configuração e integração dos dispositivos físicos, não for feita de forma adequada. À começar pela “espinha dorsal” – placa-mãe, CPU e RAM – certifique-se de que todos estes componentes sejam compatíveis entre si. Parece óbvio? Para muitos técnicos de informática que se limitam a encaixar as peças, sim; mas para especialistas e entusiastas do assunto, existem alguns detalhes técnicos que podem se passar despercebidos, mas devem ser analisados mais minuciosamente…

À primeira vista, as placas-mãe adquiridas geralmente são compatíveis com as CPUs que os usuários desejam equipar seus PCs desktops. No entanto, uma determinada placa-mãe lançada em uma data específica, somente garantirá o suporte aos processadores lançados antes daquela época em questão. Muitos fabricantes lançam revisões da arquitetura, oferecendo processadores mais atuais, eficientes e estáveis. Embora “funcionem”, estes não são devidamente reconhecidos pelo sistema, tendo inclusive muitos de seus recursos desabilitados. Nesses casos, uma atualização de BIOS geralmente resolve, DESDE que o fabricante da placa-mãe informe o suporte oficial do novo processador, através dos changelogs (uma documentação que descreve as melhorias feitas nos softwares – neste caso, o firmware – desde a versão anterior). Ainda considerando a atualização de BIOS, nem todos os firmwares são isentos de erros, sendo necessário efetivar as devidas correções. Novamente, confiram nos changelogs oficiais se tais correções feitas afetam a estabilidade do sistema e faça o update, se necessário.

Já os módulos de memória, estes também podem padecer do mesmo mal que as CPUs: muitos módulos recém-lançados podem não ser totalmente compatíveis com as placas-mãe mais antigas; para variar, os updates de BIOS geralmente não contemplam o suporte a novos módulos de memória, embora funcionem na grande maioria dos casos (por isto, há uma tabela publicada no manual da placa-mãe, informando os fabricantes e modelos dos módulos de memória RAM testados pelo fabricante). Por fim, o manuseio descuidado também pode causar danos aos chips de memória, devido à ação destrutiva da transferência de carga elétrica entre diferentes corpos. Tal fenômeno é chamado de eletricidade estática e os chips de memória RAM são os mais afetados por ela, dada a delicadeza do processo de fabricação.

No primeiro caso, a primeira coisa fazer é observar os valores dos parâmetros configurados automaticamente através do chip SPD (Serial Presence Detect), responsável por informar o BIOS os valores corretos de frequência de operação, tempo de latência e tensão de alimentação, entre outras opções. Embora a detecção ocorra sem maiores inconvenientes, muitas vezes a placa-mãe não está preparada para trabalhar com estes valores, causando as instabilidades e os travamentos tão indesejados. A solução se resume em alterar tais parâmetros manualmente, utilizando valores mais conservadores para garantir a estabilidade, embora isto afete levemente o desempenho. Os parâmetros que possuem maior efeito na estabilidade do sistema são o CAS Latency e o Command Per Clock (também chamado de Command Rate). Para obter uma melhor compreensão sobre o significado de tais parâmetros com o objetivo de auxiliar o planejamento das mudanças, recomendo a leitura do capítulo sobre memórias (Hardware, Guia Prático).

Na dúvida ou não entendimento dos parâmetros listados, uma forma mais simples de promover as alterações sem “tecnicismos”, seria reduzir o clock padrão do módulo para valores mais baixos. Por exemplo, módulos DDR2 podem ser reduzidos de 800 para 667 MHz, ao passo que módulos DDR3 podem ser reduzidos de 1600 para 1333 MHz. Muitas vezes, as placas-mãe suportam oficialmente módulos até uma certa frequência específica, mas podem operar com módulos de frequências maiores, sujeitando-se a alguns problemas de compatibilidade. Uma Abit VA-10 que tive, baseada no chipset Via KM400 suportava oficialmente apenas os módulos DDR-333, embora os módulos DDR-400 pudessem funcionar nela. Ao reduzir a frequência de operação dos módulos, os parâmetros CAS Latency e o Command Per Clock poderão trabalhar com os seus valores default, sem afetar a estabilidade geral do sistema.

Por fim, há o truque de aumentar o valor de tensão fornecido para a alimentação da memória RAM. Os módulos DDR operam sob 2.5V, ao passo que os módulos DDR2 operam sob 1.8V e os atuais módulos DDR3 operam sob 1.5V (com alguns modelos funcionando a apenas 1.35V). Para garantir que os módulos funcionem de forma estável, algumas placas-mãe já promovem o acréscimo de 0,05V automaticamente. Por exemplo, não será difícil encontrar configurações de módulos DDR operando sob 2.55V ou 2.60V e DDR2 operando sob 1.85V., embora ainda não tenha encontrado exemplos práticos de módulos DDR3 operando com valores levemente maiores. Tais acréscimos também são muito utilizados em overclocks, necessários para garantir que as memórias funcionem a um clock maior sem desestabilizarem o sistema. Nem é preciso dizer que, superando a casa dos 5% de diferença, a vida útil dos módulos pode ser reduzida.

Já nos casos em que a suspeita das instabilidades recaem sobre o estado dos módulos, o principal responsável pelas anomalias é a eletricidade estática. Neste caso, melhor maneira de verificar se os chips não foram danificados, será com a realização de testes de leitura e escrita em todos os setores, com o uso de softwares especiais. Para esta necessidade, o famoso Mentest86 é uma das principais opções gratuitas. Mas uma observação se faz necessária: utilize a versão baseada em modo-texto, já que o Windows irá “mascarar” os resultados, pelo simples fato do utilitário estar impedido de testar as áreas da memória utilizadas pelo próprio Windows.

Mentest86 em funcionamento.

A seguir, dedicaremos as nossas atenções aos periféricos conectados. À começar pela placa de vídeo, esta é praticamente um subsistema computacional à parte, a qual é extremamente exigida em jogos e outras aplicações gráficas que exijam desempenho. Os modelos de entrada e mainstream não requerem a alimentação extra, as quais podem ser perfeitamente alimentadas pelo slot PCI-Express. No entanto modelos mais avançados exigem mais alimentação, o que torna o essencial o bom dimensionamento da fonte de alimentação adequada para o sistema como um todo. Por fim, o calor gerado por estes dispositivos pode sobrecarregar todo o sistema de refrigeração, obrigando os demais componentes internos a trabalharem sob condições de temperatura mais agressivas que as recomendadas.

Os demais periféricos – que não exigem tanta carga de processamento – podem perfeitamente trabalhar bem, sem exigir muito a alimentação e refrigeração do micro. No entanto, se os parâmetros destes dispositivos não forem devidamente configurados, poderemos ter problemas relacionados à conflitos de recursos, onde dois ou mais dispositivos podem requerer o mesmo IRQ, canal DMA, endereço de memória ou endereço de porta. Nestes casos, a configuração manual – embora complexa – poderá resolver o conflito, devolvendo a estabilidade do sistema.

Ao concluir inspeção de cada item, faz-se necessária uma análise superficial do estado geral da placa-mãe e os demais dispositivos conectados. Checar o estado das trilhas, dos capacitores e outros componentes eletrônicos, bem como a limpeza e organização geral, previne uma série de anomalias que podem vir a causar as instabilidades e travamentos. Por exemplo, slots PCI, bancos de memória e outros tipos de conectores e encaixes, precisam ser limpos de tempos em tempos, através do uso de soluções apropriadas (pano seco, álcool isopropílico e spray limpa-contatos). Já o emaranhado de fios e cabos flat precisam ser organizados, de forma a facilitar a ventilação interna do PC desktop.

Por fim, não deixem de gerenciar o fornecimento da energia elétrica adequado, assim como adotar as proteções adequadas para os problemas relacionados, como o uso de filtros de linha e nobreaks. Como este assunto é bem mais complexo para se resumir em um ou dois parágrafos, recomendo a leitura do tutorial “Filtros de linha, estabilizadores e nobreaks”, escrito pelo Morimoto.

E só. Na próxima oportunidade, estudaremos os problemas relacionados ao software, como o sistema operacional e todo o seu ecossistema: drivers, APIs e ferramentas e aplicativos. Ou seja: “a parte que a gente xinga”! &;-D

Veja também: ‘Caiu o sistema...’

Por Ednei Pacheco <ednei.pacheco [at] gmail.com>

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