“A presente proposta visa a proibição da comercialização ou disponibilização desse tipo de jogo ou aplicação em nosso país, de modo a diminuir a chance de ocorrência de tragédias como a que observamos recentemente na cidade de Suzano. É preciso ao menos dificultar que a nossa sociedade, em especial nossos jovens, entrem num clima de selvageria que leve a atos tão desastrosos. Para isso, é preciso punir mais severamente quem dissemina a incitação à violência e ao crime por meios de grande alcance, como a internet e os meios de comunicação de massa. Desta forma, propomos triplicar as penas para o tipo penal de “incitação ao crime” para quem se utiliza de meio de grande alcance, bem como incluímos a distribuição e o desenvolvimento de jogos violentos como práticas que concorrem para o mesmo delito”.
O que você leu acima é um trecho do projeto de lei 1577/2019, de autoria do Deputado Federal Júnior Bozzella (PSL-SP), mais um representante da classe política que compreende que massacres como o que aconteceu na escola em Suzano tem relação com o contato de jovens com jogos violentos.
O projeto de lei visa “criminalizar o desenvolvimento, a importação, a venda, a cessão, o empréstimo, a disponibilização ou o aluguel
de aplicativos ou jogos eletrônicos com conteúdo que incite a violência e dá outras providências, além de promover uma alteração no Marco Civil da Internet de modo que as lojas de aplicativos e outros métodos para a disponibilização de jogos possam retirar de sua oferta esse tipo de conteúdo extremamente nocivo”.
Assistimos com frequência políticos transferindo responsabilidade, direcionando o discurso que tenta mascarar a própria ineficiência de seus métodos. No caso do massacre em Suzano tivemos, por exemplo, a declaração do Major Olímpio (PSL-SP), que pontuou: “um cidadão com uma arma regular dentro da escola, professor, um servente ou policial aposentado que trabalha lá, ele poderia ter minimizado o tamanho da tragédia”. Realmente poderia ter sido minimizado, mas continuaria destacando em letras garrafais a ineficiência do estado em prover segurança, ainda mais naquela escola, a Professor Raul Brasil, que é justamente estadual.
E agora temos mais um desdobramento do assunto, trazer os games para a roda, mais uma tentativa de criminalizar jogos violentos, que, aliás, o projeto nem define o que seria violento, nesse balaio pode entrar muita coisa. O projeto também deixa à deriva o sistema de classificação indicativa, que, assim como em tantos outros aspectos, deve ser melhor compreendido pelos pais ou qualquer outro responsável legal. Agora, associar que uma criança que joga GTA, por exemplo, é potencialmente um aspirante a assassino é uma besteira gigantesca. Os próprios estudos sobre essa relação games x comportamento variam bastante.
Além de games, seguindo essa linha de pensamento do projeto, podemos incluir também filmes, séries, e qualquer outro tipo de conteúdo. Essa é realmente a saída? Penalizar o mercado? “Impedir o desenvolvimento, a importação, a venda, a cessão, o empréstimo, a disponibilização ou o aluguel de aplicativos ou jogos eletrônicos”, tratado pelo projeto como conteúdo que incita violência?
Esse argumento é tão esdrúxulo quanto dizer que um politico que posa fazendo arminha com a mão incita violência.
O projeto de lei de Junior Bozzella ainda tem um caminho extenso até se tornar realmente lei. Em 2009 vimos uma tentativa parecida, com o PL-6042/2009, de Carlos Bezerra, do MDB do Mato Grosso. Alguns anos antes, em 2006, houve o projeto PL-170/06, do senador Valdir Raupp (PMDB-RO) que merece até um destaque já que propunha tornar crime o “comércio de jogos ofensivos aos “costumes e às tradições dos povos, aos seus cultos, credos, religiões e símbolos.“
Espero que mais uma vez o projeto da vez seja anexado à pilha de soluções inúteis já propostas no Brasil.
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