Na década de 1990 foi cunhado o termo “Wintel” para descrever a célebre aliança estratégica entre a Intel e a Microsoft que dominou os computadores pessoais por mais de duas décadas. A Intel produzia os processadores, chipsets e ditava os padrões de interfaces, enquanto a Microsoft produzia o Windows e outros softwares, moldando à base de código em torno dos recursos oferecidos pelos novos processadores. A regularidade com que novas versões do Windows eram lançadas e o fato de cada nova versão ser consideravelmente mais pesada que a anterior fazia com que os usuários acabassem trocando todo o PC, de forma que as duas lucravam. Oficialmente, nunca existiu uma aliança formal entre as duas empresas, mas isso nunca impediu que ambas colaborassem em torno do ganho comum.
Os primeiros sinais de ruptura na aliança começaram a surgir na segunda metade da década de 2000, quando a Intel se viu obrigada a reduzir o consumo elétrico dos processadores e aumentar sua eficiência, enquanto a Microsoft manteve a velha política de inchar a base de código, lançando o Windows Vista, que foi vítima de um alto nível de rejeição e fez com que muitos usuários optassem por continuar com o Windows XP, prejudicando assim também as vendas da Intel. O grande uso de processamento e memória do Vista acabou prejudicando a Intel também nos portáteis, especialmente nos netbooks, onde a falta de um sistema operacional leve vindo da Microsoft expôs a fragilidade do Atom.
O lançamento do Windows 7 amenizou bastante os problemas, já que o sistema logo se mostrou mais frugal que o Vista e as melhorias fizeram com que o ciclo de upgrades recomeçassem, com força, com muitos que tinham pulado uma ou duas gerações finalmente trocando seus PCs e indo diretamente do XP para o Seven. Entretanto, outro problema surgiu: a ascensão dos dispositivos móveis e dos processadores ARM.
Em resumo, a dupla Windows e x86 funciona bem nos desktops e estações de trabalho, devido à combinação de um bom desempenho dos processadores e da gigantesca variedade de aplicativos e jogos para o Windows. Entretanto, quando falamos em outras categorias de dispositivos, a aliança não funciona tão bem, como no caso dos servidores, onde o Windows muito frequentemente dá lugar ao Linux e mesmo nos Macs, onde processadores Intel são combinados com o OSX.
Nos dispositivos móveis a coisa não poderia ser muito diferente, já que a combinação de um processador x86 coma versão desktop do Windows resultaria em um smartphone pesado e com uma autonomia medida em minutos. Mesmo no caso dos tablets a combinação não funciona muito bem, já que a interface do Windows 7 não é otimizada para o uso em telas capacitivas e o fraco desempenho do Atom faz com que o desempenho fique longe do ideal, sem nem falar na baixa autonomia em relação ao iPad e aos tablets com o Android. A Intel continua com esperanças de que o uso de técnicas mais avançadas de produção e melhorias no nível de integração compensação a redução de eficiência causada pela carga de legado das instruções x86, mas esta esta vai ser uma batalha longa e difícil.
Embora a Microsoft desenvolva a tempos versões reduzidas do Windows destinadas a dispositivos móveis e sistemas embarcados, incluindo o Windows CE, o Windows Mobile e o Windows Phone 7, ela nunca tinha se pronunciado em relação a uma versão do Windows desktop para outras plataformas, mas isso mudou no início deste ano, com o anúncio de que a próxima versão do Windows também rodará em processador ARM.
Embora ainda existam dúvidas em relação à interface e a como a Microsoft pretende convencer os desenvolvedores a portarem seus aplicativos para a nova plataforma, este anúncio foi um divisor de águas, mostrando que apesar da longa parceria, a Microsoft está pronta para explorar novos horizontes, enxergando um futuro para o Windows em uma eventual era pós x86.
Paralelamente, a Microsoft adquiriu uma licença de arquitetura da ARM (que permite ter acesso ao microcódigo dos processadores, ganhando assim a possibilidade de realizar otimizações de baixo nível em seus sistemas, ou até mesmo criar versões modificadas dos chips) e embarcou em uma guerra legal contra os fabricantes de aparelhos com o Android.
A Intel por sua vez anda também pulando a cerca já a algum tempo. Além do suporte ao Linux e outros sistemas em servidores e da atual aliança com a Apple (que por sua vez anda dando suas escapadinhas com a AMD), a Intel tem se esforçado em convencer os fabricantes a lançarem tablets Android com o Atom, além de levar adiante seu próprio plano B em relação aos portáteis: o Meego, apesar da “traição” da Nokia, que foi seduzida pela Microsoft.
Embora continue dominante nos desktops e servidores, a Intel continua a derrapar nos sistemas móveis, perdendo rapidamente espaço para o Android e o iOS, bem como novatos com o WebOS e o (QNX da RIMM), que até o momento têm sido usados quase que exclusivamente sobre processadores ARM. Embora alguns fabricantes tenham apresentado tablets com o Android rodando sobre o Atom, eles sofrem com a baixa autonomia e com o exorbitante preço do Z670, que custa 3 vezes mais caro que o Tegra 2. A única grande vantagem do Atom é a compatibilidade com o Windows 7 (que pode rodar em dual-boot com o Android), mas é realmente muito estranho ver um tablet com uma tela de POST e um longo processo de inicialização:
Apesar das dificuldades, a Intel sabe bem que a velha combinação de seus processadores com o Windows não vai funcionar nos tablets e por isso tem se esforçado em fazer alianças para tentar infiltrar o Atom e o Sandy Bridge entre os tablets e smart-TVs, às custas da Microsoft, além de oferecer netbooks de baixo custo com o Atom e o Google Chrome OS.
Uma boa amostra dessa nova atitude foi dada em Janeiro na conferência de lançamento do Sandy Bridge. A Intel apresentou protótipos de tablets rodando o Meego e o Android, TVs inteligentes e set top boxes com o Android, mas nada de gadgets com o Windows. A Microsoft por sua vez retribuiu na CES, apresentando tablets com processadores ARM e apresentando a nova parceria com a Nokia, sem se referir diretamente à Intel.
Tudo isso mostra que embora a parceria extra-oficial continue nos desktops e notebooks, tanto a Intel quanto a Microsoft parecem ter planos diferentes para o setor móvel. A Intel vê um futuro no Meego e no Android, enquanto a Microsoft vê seu futuro nos processadores ARM e na aliança com a Nokia. Por enquanto, quem anda levando vantagem com tudo isso é a Apple, que apesar do ecossistema fechado continua a ser uma das poucas entre as grandes que está sendo capaz de se sair bem nos dois mercados, vendendo tanto computadores pessoais quanto tablets e telefones.
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