Guerra dos navegadores: como a Microsoft triturou a Netscape e sem querer ajudou a criar o Firefox

A Microsoft esmagou a Netscape nos anos 90, mas dessa batalha nasceu o Firefox; conheça essa história

Em janeiro de 1993, o NCSA Mosaic, criado por Marc Andreessen e Eric Bina na Universidade de Illinois, transformou a internet em algo visual e acessível. Pela primeira vez, era possível ver texto e imagens juntos, com botões como o “voltar” e suporte ao protocolo HTTP/1.0.

O Mosaic não foi o primeiro navegador, mas foi o que realmente popularizou a web gráfica, abrindo caminho para que milhões de pessoas pudessem experimentar a internet fora dos laboratórios acadêmicos.

O “momento Netscape” e a bolha da internet

Netscape

Empolgado com o sucesso, Andreessen se uniu a Jim Clark, fundador da Silicon Graphics, para lançar o Netscape Navigator em 1994. O impacto foi imediato: já em 1995, o navegador controlava cerca de 75% a 80% do mercado.

O IPO da empresa foi um marco histórico da era digital: as ações saíram a US$ 28 e dispararam para US$ 58 no mesmo dia. Esse fenômeno ficou conhecido como o “momento Netscape”, um símbolo da chegada da internet comercial e da futura bolha das ponto.com.

A ficha caiu para a Microsoft

internet

A Microsoft inicialmente subestimou a internet, mas em 1995, Bill Gates percebeu que navegadores poderiam se tornar mais importantes que o próprio Windows.

O risco era claro: se os usuários passassem a viver dentro dos browsers, o sistema operacional perderia relevância. Foi também neste ano que a internet comercial começou a operar no Brasil, e Gates foi entrevistado por Jô Soares, um papo sobre o futuro dos computadores.

O dia em que Bill Gates foi entrevistado pelo Jô Soares e falou sobre o futuro dos computadores

A resposta foi imediata: em agosto de 1995 nasceu o Internet Explorer (IE), construído a partir do código licenciado do Spyglass Mosaic por cerca de US$ 2 milhões.

Estratégia agressiva: vencer a qualquer custo

O IE chegou de forma agressiva: gratuito, em contraste com o Netscape pago, e embarcado diretamente no Windows, que já dominava os PCs do mundo inteiro. Aos poucos, a Microsoft começou a integrar o navegador tão profundamente ao sistema que removê-lo se tornava quase impossível.

Em 1997, o lançamento do Internet Explorer 4.0 trouxe novidades técnicas como suporte a CSS e reforçou a simbiose entre navegador e sistema operacional.

A virada de mercado e o contragolpe judicial

A estratégia da Microsoft entregou resultados dramáticos. Em meados de 1998, o Internet Explorer tomou a dianteira, com 48,3% de participação, enquanto o Netscape tinha 41,5%.

Apenas dois anos depois, em 2000, o domínio do IE estava consolidado: o navegador controlava mais de 86% do mercado, e o Netscape despencava para menos de 14%

Essa conquista, porém, não nasceu da sorte. O juiz Thomas Penfield Jackson, no processo antitruste, documentou como a Microsoft privilegiou o Internet Explorer e marginalizou o concorrente. A empresa ofereceu vantagens de distribuição ao IE, restringiu canais ao Netscape e dificultou o desenvolvimento da plataforma rival, práticas que, segundo ele, configuraram abuso de monopólio

O entao CEO da Microsoft Bill Gates durante uma audiencia em 1998. CreditoDouglas GrahamQuarterlyGetty Images
O então CEO da Microsoft, Bill Gates, durante uma audiência em 1998. Crédito: Douglas Graham / Getty Images

O movimento, porém, não passou despercebido. Ainda em 1998, o Departamento de Justiça dos EUA abriu um processo antitruste contra a Microsoft. O caso ganhou contornos dramáticos quando o juiz Thomas Penfield Jackson, em 1999, decidiu que a empresa deveria ser dividida em duas — uma dedicada ao Windows e outra para softwares como o Internet Explorer. Seria a punição antitruste mais dura em décadas.

Agora, olhando para o presente, vemos uma certa relação dessa história na Europa, só que desta vez envolvendo o Google. A Comissão Europeia, sob a recém-implantada Digital Markets Act (DMA), intensificou a pressão regulatória sobre a empresa. O Google enfrenta acusações tanto pela promoção abusiva de seus serviços no Google Search como por impor restrições a desenvolvedores no Google Play, violações que podem gerar multas de até 10% do faturamento global.

Além disso, no Reino Unido, a autoridade de concorrência (CMA) está exigindo que o Google ofereça alternativas de buscas aos usuários no Chrome e no sistema Android, uma medida que pode redesenhar o equilíbrio digital local.

No caso da Microsoft, a empresa escapou da divisão, mas foi obrigada a abrir suas interfaces para concorrentes, abandonar práticas consideradas abusivas e submeter-se à supervisão governamental por anos.

O declínio da Netscape e o nascimento do Firefox

Quando pensamos no encerramento da Netscape, a palavra “falência” vem à mente. Mas a trajetória é mais sutil. Netscape não faliu; ela foi engolida. Em novembro de 1998, a empresa foi adquirida pela AOL por US$ 4,2 bilhões em ações, num negócio que logo atingiu aproximadamente US$ 10 bilhões em valuation.

Apesar da aquisição, o navegador não se recuperou. A Netscape tentou lançar novas versões — como o Netscape 6 e 7, mas o domínio do Internet Explorer era avassalador. Entre 2002 e 2003 o IE atingiu o ápice, com cerca de 95% de quota de mercado.

No final de 2003, o quadro já era insolúvel. A AOL dispensou parte de seus últimos desenvolvedores de browser, deixando a marca à beira da extinção. A situação chegou ao fim em 2008, quando a AOL anunciou o desligamento definitivo do Netscape Navigator, marcando o encerramento de um capítulo da internet

Mas a Netscape deixou um legado que vive até hoje. Em 1998, antes de ser engolida de vez, ela liberou o código-fonte do navegador, isso deu origem ao Projeto Mozilla, que com financiamento inicial da própria Netscape impulsionou o desenvolvimento de uma comunidade livre.

Esse movimento gerou o código do Firefox, lançado em 2004 por meio da Mozilla Foundation, que, mesmo perdendo relevância nos últimos, se transformou em um navegador lendário, assim como foi o Netscape.

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Editor-chefe no Hardware.com.br/GameVicio Aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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