Em 2022, expliquei neste artigo como é possível filmes antiquíssimos, como o clássico Poderoso Chefão, serem relançados em 4K com uma qualidade que parece ter sido captado nos últimos anos, com equipamentos modernos. Lembrando que o lendário longa-metragem dirigido por Francis Ford Coppola foi lançado em 1972.
Também comentei aqui a grata surpresa de assistir este ano no Disney+ e versão remasterizada do show Queen Rock Montreal, de 1981, também disponibilizado em 4K.
Será que algo semelhante pode acontecer com os lendários seriados Chaves e Chapolin? É sobre isso o tema deste artigo!
O processo de remasterização
Para entender por que filmes como O Poderoso Chefão e o show do Queen podem ser remasterizados em 4K, é preciso compreender o papel fundamental da película de filme. Quando uma obra é captada em película, é possível escanear os negativos em alta definição e, com a ajuda de restauradores e coloristas, é possível restaurar e remasterizar o conteúdo para ser relançado em resoluções como 4K ou até superiores.
Obras que foram captadas em película mantém de pé todo um mercado de relançamento de versões especiais e comemorativas de filmes e outras produções que muitas pessoas estão dispostas a pagar para assistirem numa qualidade que está totalmente alinhada com o que temos de mais atual em termos de resolução.
Dada a dimensão do legado de Bolaños, apreciadores da obra em diversos países, como o Brasil, já sonharam com essa mesma possibilidade. Ver os inúmeros episódios e momentos clássicos dos seriados com um tratamento digno de nota.
O caso de Chaves e Chapolin: outra realidade
Infelizmente, boa parte das produções de Roberto Gómez Bolaños, incluindo Chaves e Chapolin, foram gravadas em videotape, não em película. Os episódios iniciais de Chaves e Chapolin, lançados em 1973, foram captados em VT no formato Quadruplex, o primeiro sistema de gravação de vídeo, lançado pela Ampex em 1956. As fitas eram de 7 polegadas, comportando 60 minutos de gravação.
O Brasil passou a utilizar o videotape dois anos depois de seu lançamento, a primeira emissora do país a utilizar foi a TV Tupi, na apresentação de “O Duelo, de Guimarães Rosa.
A diferença é crucial: enquanto a película oferece uma densidade de informações muito maior, permitindo ampliação e restauração em alta definição, o videotape limita bastante a qualidade final. Videotapes, especialmente os antigos, têm resolução muito inferior e degradam com o tempo, o que torna a restauração em 4K praticamente impossível.
Existe alguma obra de Bolaños captada em película? Sim, o filme “El Chanfre”, lançado em 1979. Aliás, lembra aquele episódio do Chaves “Vamos ao Cinema” em que o menino do barril fala “teria sido melhor ir ver o filme do Pelé”. Isso foi uma adaptação da dublagem brasileira. No original ele fala “mejor hubieramos ido a ver al Chanfle”, uma propaganda ao filme.
Equipamentos Usados nas Gravações
Nas fases iniciais, Chaves e Chapolin foram gravados com a câmera GE PE350, da marca General Electric.
Em seguida, também utilizaram modelos da série TK da RCA, como a TK44A e a TK45, esse segundo modelo foi utilizado por diversas emissoras brasileiras, como Tupi, Globo e Bandeirantes. As lentes das câmeras eram da marca alemã Schneider-Kreuznach, e câmeras da francesa Thomson-CSF, modelos da linha TTV, como o 1515, também foram empregadas em algumas fases da produção de Chaves e Chapolin.
Sobre a TK-44, o La Cinémathèque française, que se dedica à preservação, restauração e a divulgação do patrimônio cinematográfico, diz que muitas câmeras TK 44 foram utilizadas em estações de TV até o final dos anos 80, e que os engenheiros e operadores de câmera gostavam da facilidade de manutenção, facilidade de operação e as imagens de cores brilhantes e quentes que ela produzia.
Lançada em 1980, o modelo da Thomson era compacto, e foi um grande sucesso de vendas na época. Foi a primeira câmera do mundo a utilizar uma conexão por cabo triaxial entre a cabeça e o corpo, capaz de cobrir uma distância de 1500 metros, garantindo maior mobilidade e flexibilidade na operação.
O papel do SBT na distribuição no Brasil
No Brasil, o SBT começou a exibir Chaves e Chapolin em 1984, 11 anos após o primeiro episódio de Chaves ser transmitido no México. As cópias dos episódios eram enviadas em U-Matic, padrão da Sony, segundo esse relato de José Salathiel Lage, que comandava o núcleo de dublagem do SBT no começo da década de 80.
Cópias em Quadruplex, que garantiam mais qualidade, também foram recebidos pelo SBT. Essas cópias seguem até hoje nos arquivos da emissora. Essas fitas eram do segundo formato de Quadruplex, conhecido como 1-inch Type C, evolução ao primeiro padrão que era o EIAJ. As fitas que chegaram ao SBT também eram da Sony, modelo Sony V1-K.
Especificamente sobre o Brasil, o sistema de cores é diferente do que é utilizado no México. Lá é utilizado o NTSC, enquanto o Brasil lida com o PAL-M. Portanto, a primeira ação foi realizar a conversão de cores, adaptando a nossa realidade de transmissão.
Além de toda a questão da dublagem, elemento que foi determinante para o sucesso das obras no Brasil. Naquela época era comum que o material recebesse diversas cópias em formatos distintos. Para o diretor de dublagem e comitês de avaliação do material as cópias eram em VHS, já para o estúdio de dublagem e responsáveis pela mixagem o envio era em U-Matic que garantia mais qualidade.
Você também deve ler!
Novo comercial da Samsung recria cena icônica de Chaves
A desorganização da Televisa com o envio, principalmente em relação ao ordenamento dos episódios, também exigia que o SBT realizasse um trabalho de classificação e organização.
As remasterizações da Televisa
Falando em Televisa, a emissora original da Chaves deixa os fãs revoltados em relação ao cuidado técnico dado à obra ao longo dos anos. Diversas análises em fóruns especializados em Chaves destacam que a emissora vem aplicando remasterizações em cima de remasterizações anteriores, um trabalho que não é a maneira ideal, do ponto de vista a buscar a melhor qualidade final para a exibição.
A remasterização mais recente já está sendo aplicada em episódios exibidos na plataforma Vix, que pertence ao canal. Após anos de impasse entre a Televisa, dona das imagens captadas, e a família Chespirito, responsável pelos direitos da obra, um acordo foi selado e Chaves e Chapolin voltaram a ser exibidos desde a última quarta-feira (18) na plataforma que não está disponível no Brasil.
Há uma grande expectativa em relação ao retorno dos seriados ao Brasil. Além do SBT, Amazon Prime e até mesmo o Grupo Globo estão negociando para exibir os episódios. Para aqueles ligados aos aspectos mais técnicos, a expectativa também passa por essa curiosidade sobre como será a exibição. A Televisa e o Grupo Chespirito vão exigir a exibição com o tratamento atual nas imagens? O tempo dirá.
Para quem está acostumado a lidar com edição de imagens, perceberá que o resultado remete aos recursos via software de elevar a definição em pontos que originalmente não estavam presentes.
O resultado é algo que tenta ir além das capacidades e propriedades de captura original do material, tornando tudo mais nítido e marcado, mas também absurdamente mais artificial e mais chapado. Em termos de coloração, também é possível notar imagens bem mais saturadas.
Mesmo que não seja possível um remaster ao nível de arquivos originais captados em película, é possível aplicar tratamentos bem mais dignos do que o que a Televisa está oferecendo.
Mas tudo isso esbarra em custos, tempo, e, saindo da bolha dos mais interessados em tecnologia, não é algo que a grande massa vai analisar e se atentar. Portanto, pode acabar não compensando.
Você já sabia sobre todos esses detalhes mais técnicos em relação a Chaves e Chapolin? Está ansioso para que a exibição das séries retorne ao Brasil? Comente abaixo.
Aproveire também para assistir ao vídeo que fizemos relembrando um jogo criado por um desenvolvedor brasileiro que fez muito sucesso no Brasil, o clássico Street Chaves:
Veja também
Sobre o Autor
Deixe seu comentário