A saga dos ‘Eco-eletrônicos’

A saga dos ‘Eco-eletrônicos’
Atualmente, além de iPhones, Eee PCs, mini-notebooks e outras popularidades no ramo da informática, ouvimos muito sobre eletrônicos ‘amigos do meio ambiente’. Seja qual for o motivo pelo qual o produto possui este título, ele entra na mídia como uma mercadoria-modelo, indiscutivelmente ecológica, e isso se torna o principal atrativo de marketing da novidade, que passa a ser agradável aos ouvidos dos consumidores, a grande maioria preocupada e ao mesmo tempo muito desinformada. Mas será que tais smartphones, notebooks, PCs e outros produtos com título “Eco-coisa” realmente são amigos da natureza?

Antes de prosseguirmos, vamos citar alguns exemplos. Enquanto escrevo este artigo, dia 14 de agosto de 2008, foram lançados duas novidades neste ramo: o “eco-monitor” da Fujitsu, e o “eco-celular” da Samsung.

Segundo o anúncio da Fujitsu Siemens, ela lançou o primeiro monitor do mundo a consumir absolutamente nada de energia durante o modo stand-by, o que a companhia chama de “Eco mode”. Os dois monitores “SCENICVIEW ECO”, um de 20 polegadas (P20W-5 ECO) e outro de 22 polegadas (P22W-5 ECO), possuem uma fonte que automaticamente se desliga quando o monitor entra em modo de economia de energia. Isso faz com que a Fujitsu afirme que o produto consuma zero Watt durante esse estado, em comparação com o gasto de 1 a 6 Watts dos monitores concorrentes.

O elemento ‘chaveador’ localizado na fonte é controlado pelo computador no qual o monitor está conectado: quando o último desliga, a fonte corta a eletricidade, e o monitor volta a ser ligado com um pulso elétrico a partir do PC. O recurso funciona tanto em saídas analógicas, quanto digitais.

MONITOR
Já a novidade da Samsung é o celular de modelo “E200 Eco”, um celular que ao invés de ser revestido por plástico comum, como todos os outros – é feito de um bioplástico, que segundo a empresa, é produzido a partir de materiais derivados de vegetais como o milho. De acordo com a Samsung, uma tonelada de bioplástico utilizado no aparelho reduz a emissão de 2,16 toneladas de dióxido de carbono, se comparado com o plástico policarbonato, produzido a partir do petróleo. O novo celular ainda vem em uma embalagem de puro papel reciclado.

CELULAR
Outros dois modelos “ecológicos” também foram lançados, o W510 e F268:

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Agora vamos aos fatos: repare que, em ambas as propagandas, há um diverso jogo de marketing por cima dos modelos: folhas espalhadas pelos fundos, tudo na cor verde, e mais exaderadamente no celular da Samsung: réplicas de milhos, de folhas, palhas e tudo mais – se a Samsung fosse tão preocupada com o meio ambiente, não esperdiçaria tanto monitor ligado com a palavra “Eco” e tanto objeto de decoração que, depois da exposição, provavelmente pararão no lixo (reciclável, será?). Repare também que ambos os lançamentos possuem o termo “Eco” no nome de cada modelo.

Antes de discutirmos mais sobre isso, vamos à mais alguns lançamentos: um mini-PC da Dell, em abril, e um desktop da Lenovo, no final de 2007:

“A Dell anunciou hoje (23/04/08) um computador ambientalmente responsável “nunca visto antes”, que vem folheado em madeira de bambu e ocupa 81% menos espaço que um gabinete de PC tradicional. Não foram divulgados grandes detalhes, mas o que se sabe a partir do Earth2Tech é que ele utiliza 70% de material reciclado em sua produção, como garrafas, jarras de vidro, embalagens PEAD (detergente, etc), e que provavelmente estará disponível ainda esse ano, por um preço entre 500 e 700 dólares.”

DELL

“A Lenovo lançou nesta quarta (12/09/07) o ThinkCenter A61e, um novo desktop feito para agradar os defensores do meio ambiente. O sistema possui dimensões compactas, e é 90% feito de material reciclável. Seu consumo ativo de energia é também baixo, usando um AMD Athlon 64 X2 e Sempron de 45 Watts, sendo a eficiência tão grande que pode ser ligado exclusivamente à um painel de energia solar, diz a Lenovo. Com os 85% de eficiência energética e 90% de material reciclável, o novo computador contribui para o meio ambiente – e imagem da empresa.”

LENOVO
Agora vamos aos pontos principais. No primeiro caso, ressalto que o que faz um monitor ou qualquer outro produto ser ecológico não é apenas uma característica, e sim a maioria; o simples fato de um equipamento eletrônico consumir menos energia não o torna ‘ecológico’, e sim mais amigo do meio ambiente, mais responsável. Se o monitor fosse feito mais de 80% em material reciclado (e não “reciclável” apenas), fosse durável, resistente, muito econômico (zero Watt em stand-by, e pouquíssimo ligado), tivesse um firmware bem inteligente, e não poluísse a natureza em seu processo de produção, aí sim, eu poderia afirmar depois de tudo isso ser comprovado, que se trata realmente de um “produto ecológico”. O mesmo posso dizer com relação ao celular da Samsung: o celular em si não é ecológico, apenas sua embalagem e seu revestimento são; ele continua com uma bateria tóxica, e componentes internos, software e outros componentes iguaizinhos os não-ecológicos.

No caso da Lenovo, vale lembrar que há uma grande diferença entre o termo “reciclável” e “reciclado”. Muitos PCs hoje são ditos como “amigos da natureza” tendo uma determinada porcentagem de material reciclável. O problema é que um PC feito de material “reciclável” é feito de material novo, assim como qualquer outro PC, mas que pode ser reciclado ao menos parcialmente após o término de sua vida útil. Já um PC feito de material “reciclado” significa que ele removeu materiais dispensados no ambiente (lixo), reciclou-os e usou na fabricação do produto.

Com a Dell, eu particularmente considero um caso em especial. Ela não fez um marketing tão agressivo do lado ecológico do produto, e nem soltou muitos detalhes do mesmo. Contudo, este mini-PC, em comparação aos demais da categoria, traz um dado realmente interessante: o fato de ser feito 70% de material reciclado, e ser todo revestido por bambu ao invés de plástico.

Em suma, não é prudente afirmar que um eletrônico qualquer é ecológico quando apenas uma ou duas características deste o são: a maioria dos recursos de determinado produto deve ser voltado à preservação e manutenção do meio ambiente, deve-se pensar no todo, e não apenas em uma parte: desde o processo de extração da matéria prima, transformação desta, fabricação, montagem, embalagem, uso, toxicidade, durabilidade, consumo, descarte e recomendavelmente o re-uso. Ou seja, de nada adianta a empresa plantar árvores, revestir os aparelhos de material reciclável, ou fazê-los economizar energia se não for pensado de maneira sistêmica em todos os processos envolvendo o produto; Deve-se calcular o que o produto poluiu ou degradou na produção, na utilização e qual será seu comportamento depois que não tiver mais utilidade. Não adianta ter a carcaça amiga da natureza ou consumir pouca energia, por exemplo, se o processo de produção gasta o dobro de água e emite três vezes mais poluentes.

E cuidado: o marketing “eco-coisas” das empresas está comendo solto. Antes de acreditar em uma propaganda ou até notícia (tem muita mídia desinformada também) de eletrônico “amigo do meio ambiente”, pesquise todos estes fatos apresentados aqui, pense se o produto é ecológico ou só uma parte dele é. E cabe a nós também exigirmos produtos que visem, nem que seja ao segundo plano (porque obviamente, o primeiro plano para as empresas privadas é o lucro), a conservação da natureza de forma efetiva, sem “quebra-galhos” ou propagandas enganosas, cheia de folhinhas para cá e para lá.

É muitíssimo importante sim essas iniciativas, mas desde que sejam com o pé no chão e visando projetos mais complexos. Não é por causa de alguns (um ou dois) motivos que um eletrônico deve se tornar “Eco”, e sim por muitos ou todos. Fiquem de olho e mente abertos, pessoal 🙂

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