O fim do Big Linux e um desabafo sobre as distribuições em geral

Depois de cerca de 8 anos de atividade foi lançada a última versão do BigLinux – literalmente última versão, conforme um anúncio do BIGBRUNO no fórum oficial. Uma das distros Linux nacionais mais conhecidas chegou ao fim, depois de várias outras que acabaram parando antes – como o próprio Kurumin aqui do GdH ou a tentativa de continuação dele, o Kurumin NG.

A comunidade se divide: de um lado os apoiadores do projeto sentirão uma grande falta, já que apesar de tudo a distro apresentava facilidades e inovações (como o BigBashView) e tinha sua base fiel de usuários. Do outro os haters, anti-distros e remixes de distros: sempre tem a história de que uma nova distro é desnecessária, de que é um Ubuntu com papel de parede diferente, etc.

O lado ruim: muitas distros atrapalham a popularização do Linux

Isso não deixa de ser verdade: uma distro a mais ou a menos não vai mudar nada na história do Linux, podendo colaborar para pior dependendo do caso. A grande diversidade de distros acaba prejudicando a escolha dos usuários finais e a compatibilidade para os desenvolvedores de software. Vide a Valve, que optou por testar o Steam e o L4D com referência no Ubuntu, distro para desktops mais popular hoje em dia; se ela escolhesse outra distro poderia ter problemas com a maior base de usuários (ao menos durante a fase de testes, já que no final deverá rodar em todas).

Até mesmo distros grandes e famosas acabam se tornando irrelevantes ou metidas em problemas dependendo do gerenciamento. O caso da Mandriva é um exemplo de distro grande com investimento em dinheiro, que por má administração e outros fatores deu no que deu. Ela não era uma distro amadora mantida por hobby, diferente do histórico de boa parte das distros nacionais. Sendo pessimista, ter o fork da Mageia apenas duplica o problema, já que a Mandriva continuará comunitária: os usuários terão mais duas opções para escolher, entre centenas. Isso dilui a base de usuários e torna tudo mais inconsistente. Se por um lado elas podem concorrer e acabar melhorando os recursos (a concorrência é boa…), por outro podem afastar usuários de ambas (menos usuários parece levar a um menor interesse dos desenvolvedores em fazer algo diferente, bom, etc).

Manter uma distro apenas por mantê-la não parece ser o melhor a fazer: há um grande desperdício de recursos (tempo, dinheiro, vida…). Nesse sentido, se há algo ruim das pernas e que não está sendo relevante, o melhor é que seja finalizado logo.

Nos desktops a importância do Linux não parece ser aquela que muitos imaginavam no começo da década passada. Há grandes sonhos, como um plano da Canonical para levar o Ubuntu a 5% dos PCs (bem melhor do que entre 1 e 2% que a mídia costuma divulgar). A Valve investindo em peso no Linux também poderá render bons frutos, mas até agora não há nada prático: o Ubuntu ainda não está nos 5% de PCs e os jogos da Valve ainda não foram lançados, de forma que é impossível medir o desempenho disso. É algo que muitos só acreditarão vendo, e com certa razão.

Hoje (feliz ou infelizmente, dependendo do ponto de vista) quase todo usuário novato acaba, de uma forma ou de outra, se rendendo ao Windows. O Linux continua com aquela imagem de sistema de nicho, de entusiastas… Ou de um pessoal com um conhecimento técnico mais avançado, que seja. Apesar dos inúmeros avanços técnicos das distros a situação atual não é tão diferente do passado, embora a base de usuários tenha crescido um pouco. Para complicar (ou ajudar :P) os próprios desktops estão perdendo espaço para outros produtos, como tablets e smartphones (não é necessário ligar o computador para checar o e-mail ou ver um vídeo, diferente de alguns anos atrás). Até o Windows sai perdendo, e corre atrás do prejuízo como pode com a nova versão…

Num plano maior, não apenas as distros feitas por uma ou duas pessoas (começando com remasters) acabam prejudicando a imagem do Linux para os leigos e para as massas: os próprios grandes projetos também colaboram para isso. As radicais mudanças no GNOME, a divergência do Unity da Canonical e do Cinnamon do Mint com o Gnome Shell… Tudo isso prejudica: não há uma interface padrão sólida o bastante para agradar a todos. E, na boa, provavelmente nunca existirá. Quem for esperar isso morrerá esperando.

Meus parágrafos anteriores até soam como uma crítica negativa, entendo. Mas é difícil retirar alguma coisa. Vamos agora ao ponto certo 🙂

O lado bom: a liberdade

Muita gente critica criadores de distros apenas por criticar. Infelizmente é comum ver isso em fóruns de discussão e grupos em geral, além de comentários em sites e blogs. Em vez de vermos argumentos interessantes, dicas de onde aquele trabalho poderia estar sendo aplicado, etc… É comum vermos ofensas para todos os lados, adjetivos pejorativos, etc. No final boa parte dos haters se esquecem de que Linux é software livre e, um dos objetivos do software livre é adaptá-lo ao seu gosto e distribui-lo a quem mais possa interessar. Não importa se é entre duas ou três pessoas, ou entre milhares, ou milhões… Não há obrigação de agradar a ninguém, especialmente quando o trabalho é feito de graça.

Quem faz uma distro com interesse em fazer algo bom, prático, amigável e etc, tem um ideal em mente e quer realizá-lo. Que mal há nisso? Se algum tempo estiver sendo desperdiçado, o tempo é da própria pessoa, então o ideal seria deixar cada um fazer o que quiser.

Se a distro de fulano for apenas um remaster com papel da parede trocado provavelmente isso não irá atrair tantos usuários, sendo interrompido logo nos primeiros meses. Sem dar chances a um projeto que começa como um remaster acabamos por cercar as liberdades, algo que vai contra a filosofia de software livre. Veja o Mint, por muito tempo tratado como um “Ubuntu verde”. Hoje tem o Cinnamon, que começou nele, e que tem tudo para ser um ambiente/shell de qualidade, já com sua base bastante fiel – e relativamente grande – de usuários. Se o desenvolvedor parasse lá atrás por ter ficado chateado com as pedradas recebidas por manter um remaster verde do Ubuntu, nada disso estaria acontecendo. Hoje a base de fãs/entusiastas do Cinnamon e do Mint faz valer a pena, apesar de todas as críticas.

O entusiasmo por distros ou ambiente padrão até parece religião: quando um não está satisfeito com algum dogma, vai lá e cria uma nova. Pode ser uma completamente nova, ou uma baseada na anterior, com algumas flexibilizações ou radicalizações ao gosto do seu criador. No final os membros e usuários de algumas distros lutam entre si (quase sempre virtualmente, pelo menos :p) como os membros de algumas religiões fazem mundo afora. O desgaste é geral para todos… E no final só o “Linux” sai perdendo.

Desenvolver um remaster é algo interessante, proporciona uma grande experiência no sistema, aprimora conhecimento de ferramentas de níveis mais baixos do Linux e tal. Basicamente toda distro começa com um ideal, e leva esse ideal adiante até onde não puder mais. Isso não é algo necessariamente ruim; e mesmo que seja ruim, não é algo que deveria ser “proibido”.

Software livre é isso

O Linux não está em 90% dos desktops, e nem precisa estar. Ele oferece o que outros sistemas populares não oferecem, a liberdade total. E isso, por si só, já basta. Usa quem quer. Nem todo mundo irá aderir à causa.

O fim do Big Linux se deu no seu tempo. Não adianta chorar pela distro: se fosse tão relevante assim não estaria acabando. Mas também não é preciso crucificar os desenvolvedores por algo que não puderam continuar como gostariam.

A vida acontece aqui e agora. Se você tem um sonho ou ideal, lute por ele enquanto pode. Assim a todo instante nasce e morre uma distro Linux. O “mercado” define sozinho quais ficam e quais acabam. Em software livre praticamente nunca vai existir um padrão aceito por todos. Se existir algo próximo disso um dia, nada impedirá alguém de ir lá, alterar uma ou outra coisa e recomeçar o ciclo…

Sobre o Autor

Redes Sociais:

Deixe seu comentário

X