O drama do mercado de PCs

O drama do mercado de PCs

Não sei você, mas eu já desacreditei e desencanei do mercado de PCs, confesso que em alguns momentos entrei naquele debate otimista de que essa fase nebulosa das vendas dos desktops iria passar e que eles estariam novamente na mira dos consumidores, mas é claro que esse ponto de vista foi somente uma dose pessoal de otimismo, já que na prática o que temos é um cenário totalmente adverso, que anda prejudicando tanto os fabricantes quanto lojistas tradicionais que se estabeleceram justamente com a venda de máquinas de mesa.

Em 2015, por exemplo, noticiamos que mais de 1800 lojas de informática foram fechadas e uma declaração do Márcio Eduardo Neves, gerente comercial da Edimaq retrata bem o que está acontecendo: “Praticamente ninguém entra aqui para comprar computador de mesa, que ficou restrito ao mundo corporativo. Passamos a vender smartphones e acessórios para continuar no mercado”

Assim como muitas empresas foram obrigadas a passar por uma reformulação em sua história para suportar as manias que o mercado joga à nossa frente, os tradicionais lojistas de computadores de mesa também estão tendo que se adaptar na marra para continuar com as portas abertas.

Além dos lojistas os fornecedores também estão tendo que mudar, e de forma radical, tentando pescar a atenção do consumidor de outras formas, e daqui para a frente essa transformação terá que ser ainda mais significativa, é o que diz o Gartner. Segundo a empresa de consultoria, representada pela vice-presidente de pesquisas, Tracy Tsai, os fabricantes enfrentarão um grande dilema até 2020: escolher entre reformular completamente seus negócios ou simplesmente abandonar o mercado de PCs.

Mais uma vez o ano de 2020 é citado, e não é de forma aleatória, 2020 é o que podemos considerar como o ano de estruturação e esquecimento de muitas coisas na tecnologia. Em relação a estruturação podemos colocar na roda a internet de todas as coisas, e a padronização do 5G, já em relação ao esquecimento, os PCs convencionais são os grandes expoentes.

No passado os PCs tradicionais se popularizaram principalmente por uma estratégia de preços agressiva. Você deve lembrar dos tais “PC família”, termo que ficou muito conhecido no Brasil, que era justamente a ideia de que famílias com renda mais baixa pudessem comprar um computador, essa fase foi crucial para o que chamamos de inclusão digital.

Porém essa estratégia de preços não funciona mais, conquistar participação de mercado por essa forma não é mais o suficiente, como aponta o Gartner. E isso só irá se intensificar nos próximos 5 anos.

“Os atuais fabricantes precisam se ajustar às novas realidades que estão moldando o consumo, como o fato de que os usuários estão estendendo a vida útil dos computadores até o fim, os aplicativos de negócios e o armazenamento estão sendo transferidos para a nuvem e o desempenho dos PCs deixa de ser tão importante”

Esse ajuste às novas realidades é necessário pela forma como lidamos hoje com os dispositivos, cada mais inteligentes, conectados e interativos. Atualmente a experiência como um todo vale mais do que o conjunto das especificações e o preço. É por isso que vemos cada vez mais os fabricantes apostando em novos conceitos como os híbridos, que aliam o notebook que seria um computador estático com o tablet que remonta à mobilidade.

Como estão as vendas dos PCs?

Na última medição do Gartner, referente ao terceiro trimestre de 2016 as vendas caíram 5,7%, o total de PCs vendidos foi de 68,9 milhões de unidades, no mesmo período do ano passado as vendas registradas foram de 79 milhões.

A empresa de consultoria também faz uma estimativa da base instalada de computadores, que envolve os PCs de mesa, portáteis, e ultramóveis premium entre 2015 e 2019. Confira abaixo:

2015: 1,485,276 milhões de unidades

2016: 1,442,329 milhões de unidades

2017: 1,400,050 millhões de unidades

2018: 1,362,622 milhões de unidades

2019: 1,333,450 milhões de unidades

 

O líder do mercado continua sendo a Lenovo, com 20.9% de share, seguido pela HP, com 20.4%. Quem está esperando por uma reviravolta no mercado no próximo ano (mais uma dose de otimismo) é melhor não ficar tão confiante, já que a previsão de crescimento é de apenas 0,4%.

Voltado aquele comparativo com o que temos hoje com o que provavelmente teremos em 2020, os números são ainda mais alarmantes. Até o terceiro trimestre de 2016 foram vendidos quase 70 milhões de PCs, em 2020 o Gartner diz que esse número pode chegar a menos de 30 milhões.

Se já está complicado para as 5 primeiras companhias que carregam o mercado de PCs nas costas, imagine para as de menor expressão. Muitas irão abandonar esse barco.

Calma aí, mas e o mercado de PC gaming?

Assim como o mercado de PCs começou em um nicho, ele está retornando a esse ponto, e esse nicho que a cada ano apresenta números mais favoráveis é o gaming, as opções voltadas para o público que tem como objetivo desfrutar dos mais variados jogos do mercado.

Durante a última edição Campus Party na Argentina realizada no mês pessado, Alexandre Ziebert, gerente de technical marketing da NVIDIA para a América Latina, revelou alguns dados interessantes sobre esse mercado:

– Atualmente o PC gaming corresponde a 6% do mercado, em 2020 será 14%

– Já em milhões de unidades, o mercado PC Gaming tem hoje cerca de 6 milhões de PCs, em 2020 a previsão é de no mínimo 8 milhões de unidades.

– O fluxo de pessoas com PCs básicos que também farão a troca para PCs gaming também aumentará: passando de 5% para 12%

– O ciclo de upgrade em PCs gaming também será impulsionado, atualmente o usuário realiza esse proceso numa média de 4 a 5 anos, em 2020 a previsão é que essa média caia para 3 anos.

O que o Gartner recomenda para que os fabricantes possam salvar suas operações no mercado de PCs?

O Gartner além de apresentar esse panorama nada otimista, mas realista, dos próximos anos do mercado de PCs também divulgou uma cartilha com quatro estratégias alternativas que os fabricantes podem adotar para que consigam se adaptar e continuar sobrevivendo.

Novos modelos de negócio:

Essa opção é a mais conservadora, com o fornecedor gerindo a operação de um negócio e comercializando um computador atual. Isso requer altos volumes para gerar um fluxo de caixa suficiente para cobrir o custo do negócio, portanto, em um mercado em declínio, a consolidação dos fornecedores é inevitável.

“Os fornecedores de PCs precisam agilizar as operações, deixar de focar em conquistar participação de mercado e aumentar a proporção de vendas de produtos intermediários e sofisticados para melhorar os resultados operacionais e a sustentabilidade do negócio em longo prazo”, afirma Tsai.

Outro fator-chave que precisa ser alterado é o esquema de compensação de vendas. As empresas precisam de incentivos para gerenciar suas equipes de vendas internas e vendas por canais, migrando o foco do volume e market share para as margens e lucratividade.

Segundo Tsai, os fornecedores também precisam deixar de enfocar no que o distribuidor e o revendedor querem para se concentrar nas necessidades dos usuários.” 

Produtos atuais e novos modelos de negócio:

Nesse caso os fornecedores de computadores deveriam formar um novo grupo que possa experimentar novos modelos de negócios e receitas para PCs, como tratar o computador como um serviço. Nesse cenário, o modelo de negócio é ágil, permite assumir riscos e aceitar falhas.

As empresas podem, por exemplo, fazer parcerias com uma editora de conteúdo educacional digital. Os computadores 2 em 1 do fornecedor são oferecidos com conteúdo digital por meio de uma assinatura, enquanto o PC é gratuito para os usuários e subsidiado pela editora.

Novos produtos com modelos de negocio atual:

Nessa abordagem o importante é explorar a oferta de novos produtos e novas oportunidades de mercado, como tornar os PCs mais inteligentes em termos de detecção, fala, emoção e toque, expandir novos produtos para as casas conectadas ou desenvolver dispositivos específicos para mercados verticais. É uma forma gradual de os fornecedores de PCs criarem novos produtos com base em seus modelos de negócios atuais.

Novos produtos com um novo modelo de negócio:

Nesse cenário, os fornecedores de PCs podem estabelecer uma nova unidade de negócios para gerir suas atividades de um modo diferente e explorar novas soluções de tecnologia, criando uma linha de produtos inteiramente nova.

Isso incluiria trabalhar com parceiros de novos canais e fornecedores de software independentes, além de fazer parcerias com startups. Os recursos e modelos de receita podem ser completamente diferentes da estrutura existente de um fornecedor.

Um exemplo citado pelo Gartner é o de “robôs-assistentes pessoais”. Um computador pode servir como um “mordomo de avisos” em casa, uma combinação de um robô que conversa e um assistente pessoal virtual ativado por voz, com receita proveniente dos desenvolvedores, materiais de terceiros e prestadores de serviços, como aqueles do varejo, saúde, educação, vídeo ou música.

 

Essa queda livre do mercado de PCs também é claramente retratada quando o assunto é o acesso à web, por mais que em alguns países o uso do desktop para essa finalidade ainda é superior, a média mundial é mais favorável ao mobile. Dados da StatCounter de outubro de 2016 revela que o acesso via mobile, liderado pelos smartphones, é de 51,3%, contra 48,7% dos desktop. Caso queira saber mais detalhes dessa transição, clique aqui e leia nosso artigo.

A vice-presidente de pesquisas do Gartner diz que os fornecedores de computadores e líderes de mercado precisam pensar sobre os resultado dos negócios com base nessas 4 alternativas citadas acima. “Algumas empresas talvez precisem de um negócio completamente novo e de uma estratégia de produtos para reverter essa situação. Os fornecedores precisam identificar suas principais competências, avaliar seus recursos internos e adotar um ou mais modelos de negócio alternativos e de inovação de produtos para permanecer ou sair do mecado”, conclui Tsai.

Sobre o Autor

Editor-chefe no Hardware.com.br, aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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