Em 15 de fevereiro de 1999, um grupo de 100 usuários de Linux decidiu enfrentar a Microsoft exigindo o reembolso do Windows que vinha instalado nos PCs. Amparados por uma cláusula no contrato de licença, eles organizaram um protesto em frente ao escritório da empresa na Califórnia. O episódio ficou conhecido como “Windows Refund Day”.
Quando instalar o Windows não era uma escolha
Na década de 1990, comprar um computador novo era sinônimo de levar o Windows junto — quer você quisesse ou não. A prática de incluir o sistema operacional da Microsoft nos PCs vendidos por fabricantes como IBM e HP era onipresente. Para a maioria dos consumidores, isso não era um problema. Mas para os adeptos do software livre, era inaceitável pagar por algo que não iriam usar.
Esses usuários de Linux se deparavam com uma cláusula curiosa no EULA (Contrato de Licença do Usuário Final), onde constava que, caso o comprador não aceitasse os termos do Windows, poderia solicitar o reembolso do sistema. Na prática, porém, isso quase nunca acontecia — e quando alguém tentava, era empurrado de um lado para o outro entre a fabricante do PC e a própria Microsoft.
Um caso anterior, de Geoff Bennett na Austrália em 1998, mostrou como era possível conseguir o reembolso — embora o processo tenha sido lento e tortuoso
O estopim para o protesto
A frustração cresceu até explodir no fatídico 15 de fevereiro de 1999, quando um grupo de usuários de Linux decidiu partir para o confronto direto com a gigante de Redmond.
Organizado pelo CABAL (Consortium of All Bay Area Linux), a manifestação contou com grupos Linux e FreeBSD da Bay Area e aconteceu na frente do escritório da Microsoft em Foster City, na Califórnia.
O objetivo? Cobrar o reembolso do valor correspondente à licença do Windows que, segundo eles, nunca deveria ter sido imposta. A iniciativa se estendeu a escritórios da Microsoft em cidades como Nova York, partes da Europa, Japão e Nova Zelândia — embora com participação reduzida.
Com cartazes, palavras de ordem e muito barulho, os manifestantes queriam fazer valer o que o contrato prometia — ainda que nenhuma empresa parecesse disposta a cumprir. A Microsoft, ciente do protesto, chegou a receber o grupo com um cartaz de “boas-vindas”.
Também enviou um porta-voz para desqualificar o movimento, classificando os manifestantes como “fanáticos”.
Tentativa de invasão e bloqueio preventivo
Embora o protesto tenha sido, em sua maioria, pacífico, um grupo de manifestantes tentou ir além. Eles tentaram acessar fisicamente o nono andar do prédio, onde ficava o escritório da Microsoft. Mas a empresa já havia antecipado a movimentação e bloqueado os elevadores e escadas de acesso, como relatou Marc Merlins, um dos presentes.
A cena, quase cinematográfica, ilustra bem a tensão entre a cultura corporativa fechada da Microsoft e a filosofia aberta e colaborativa do movimento Linux, que começava a ganhar tração na época.
E no fim, o que mudou?
Apesar da cobertura midiática e da repercussão, a Microsoft não cedeu. Nenhum reembolso foi concedido naquele dia. Em nota, a empresa destacou que os reembolsos eram de responsabilidade dos fabricantes de computadores.
Mas o episódio deixou uma marca: consolidou a insatisfação de uma comunidade crescente com a imposição de software proprietário nos PCs e ajudou a chamar atenção para práticas anticompetitivas que, anos depois, viriam a ser investigadas em tribunais ao redor do mundo.
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