A recente queda de um drone russo S-70 Okhotnik-B em território ucraniano revelou detalhes interessantes sobre o uso de tecnologia ocidental em equipamentos militares russos.
Apesar das diversas sanções impostas pelos Estados Unidos e União Europeia contra a Rússia desde a invasão à Ucrânia em 2022, o país parece ter encontrado formas de contornar essas restrições e manter seus sistemas militares abastecidos com componentes eletrônicos ocidentais. A descoberta gerou uma nova rodada de discussões sobre a eficácia das sanções e os mecanismos de obtenção desses materiais sensíveis.
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A queda do S-70 e a inspeção pela Ucrânia
O drone S-70 Okhotnik-B, desenvolvido pela Sukhoi, é um veículo aéreo não tripulado com capacidade de ataque e tecnologia stealth, supostamente desenhado para atuar como um “ala” autônomo ao lado do caça Su-57. Com design de asa voadora, similar a aeronaves furtivas americanas como o B-2, o S-70 possui uma envergadura de 20 metros e pode transportar até uma tonelada de munição.
Entretanto, a missão deste drone, que entrou em ação em 2023, foi comprometida quando ele perdeu o controle sobre o espaço aéreo ucraniano e foi abatido por um caça aliado para evitar que caísse em mãos inimigas.
Apesar das tentativas dos russos de evitar a captura, o drone caiu quase intacto 16 quilômetros dentro da fronteira ucraniana, permitindo que especialistas militares da Ucrânia, ligados ao Departamento de Inteligência Militar (GUR), conduzissem uma inspeção minuciosa. O resultado dessa inspeção foi revelador: o drone continha uma vasta gama de componentes eletrônicos de origem ocidental, todos eles barrados pelas sanções em vigor.
Chips ocidentais no coração da tecnologia militar russa
De acordo com relatórios divulgados pelo site ExtremeTech, a inteligência ucraniana encontrou no S-70 mais de 30 componentes diferentes de fabricantes ocidentais, como Texas Instruments, Micron, STMicroelectronics, Infineon e Xilinx. Esses chips e microcontroladores, teoricamente indisponíveis para compra pela Rússia, desempenham funções críticas nos sistemas eletrônicos do drone, como controle de voo, comunicação e sensores.
O portal War Sanctions fez um levantamento detalhado dos componentes ocidentais presentes em equipamentos militares russos. Segundo o GUR, mais de 4.000 componentes de origem ocidental foram identificados em pelo menos 147 equipamentos russos nos últimos anos. A existência desses componentes levanta dúvidas sérias sobre a eficácia das sanções e revela as rotas alternativas usadas pela Rússia para obtê-los.
Embora as fabricantes envolvidas, como a Micron e a Texas Instruments, afirmem não ter vendido diretamente componentes à Rússia, é evidente que intermediários estão facilitando o acesso ao mercado sancionado. Esses componentes chegam à Rússia por meio de países como China, Turquia e Irã, que servem como canais de “descaminho”. Pequim, por exemplo, é um dos maiores aliados do Kremlin, fornecendo suporte logístico e garantindo a entrada de suprimentos críticos, apesar das restrições internacionais.
Turquia e Irã também desempenham papéis importantes na obtenção de componentes eletrônicos sancionados. A Turquia, sob o governo de Recep Tayyip Erdoğan, tem sido ambígua em sua postura, ora colaborando com o Ocidente, ora mantendo relações estreitas com a Rússia. Já o Irã, conhecido por também contornar sanções, ajuda a transferir a tecnologia necessária para os russos, criando uma rede paralela de abastecimento.
Sanções têm pouco impacto real para a Rússia
O fato de a Rússia conseguir utilizar tais componentes revela uma realidade preocupante para os países que apostam nas sanções como forma de pressionar Moscou. Enquanto as sanções dos EUA e da União Europeia deveriam limitar a capacidade da Rússia de desenvolver e empregar tecnologia avançada, a prática mostra que o mercado global está cheio de intermediários dispostos a lucrar.
O impacto das sanções, portanto, parece ser muito menor do que o esperado, e em alguns casos, até mesmo contraproducente, como apontado por especialistas.
A inspeção do S-70 também indica a dependência contínua da Rússia em relação à tecnologia ocidental, um ponto vulnerável que pode ser explorado, mas que também reforça a complexidade das cadeias de fornecimento global. As potências ocidentais precisam de medidas mais eficazes para restringir o acesso da Rússia a esses componentes críticos, talvez buscando rastrear com mais rigor o fluxo de tecnologias e seus possíveis desvios.
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