O império contra-ataca

Você deve ter notado que nos tópicos anteriores a Intel não foi citada uma única vez. O motivo é simples: a participação dos processadores Intel nos lançamentos recentes de smartphones é, pura e simplesmente, zero.

No passado, a Intel produzia a família XScale, baseada na plataforma ARM, com a qual desfrutou de um relativo sucesso, equipando diversos modelos de palmtops e alguns dos primeiros smartphones (como os aparelhos da linha Dell Axim e o Treo 650). Entretanto, em 2006 a Intel optou por vender a divisão para a Marvell, como parte de um projeto de reestruturação.

Do ponto de vista da Intel, fazia pouco sentido continuar investindo em chips ARM. O motivo não tem a ver com a viabilidade da plataforma, mas sim com o fato de chips ARM serem fabricados por diversos fabricantes, fazendo com que a competição seja acirrada e as margens de lucro muito baixas. Em vez de ser mais um fabricante de chips ARM, a Intel decidiu apostar nos chips x86, investindo em uma família de chips de baixo consumo que possa, eventualmente, ser usada em smartphones, concorrendo com os chips ARM.

Como você deve ter imaginado, o concorrente da Intel é o Atom, que utiliza uma arquitetura simplificada, que lembra um pouco a do antigo Pentium 1. Diferente de outros processadores atuais, o Atom possui apenas duas unidades de execução e processa as instruções em ordem, o que permitiu remover muitos dos componentes usados em outros processadores atuais, entre eles o circuito de branch prediction (responsável por reorganizar as instruções) e o scheduler, que armazena as instruções que serão processadas nos ciclos seguintes, de acordo com o determinado pelo circuito de branch prediction.

Com todas as reduções e otimizações, a Intel chegou ao Silverthorne, um chip com apenas 47 milhões de transístores, que ocupa uma área de apenas 25 milímetros quadrados (graças à técnica de fabricação de 0.045 micron). Para ter uma idéia, o Core 2 Duo com core Penryn possui 410 milhões de transístores e ocupa uma área de 107 mm². Neste slide da Intel, temos uma comparação entre o tamanho físico do Silverthorne e do Penryn:

Naturalmente, essa arquitetura simples resulta em um desempenho por ciclo de clock inferior ao de outros processadores x86 atuais. Um bom exemplo disso é que, mesmo operando a 1.6 GHz, o Silverthorne tem dificuldades em superar o antigo Celeron-M ULV de 900 MHz, que é usado no Asus Eee 701.

A idéia da Intel não é necessariamente produzir um processador de alto desempenho, mas sim produzir um processador de baixo consumo, que apresente um desempenho suficiente para tarefas básicas, como navegar e rodar aplicativos leves. A versão mais econômica do Silverthorne opera a apenas 500 MHz, mas oferece um TDP (consumo típico) de apenas 0.6 watts, o que é inferior até mesmo que o consumo muitos chips ARM, muito embora, a 500 MHz, o desempenho também não seja nada espetacular. As versões mais rápidas operam a até 1.8 GHz, mas, nesse caso, com TDP de 2.5 watts, que inviabiliza o uso em smartphones e outros dispositivos compactos.

A versão inicial do Atom, batizada de Menlow, é ainda destinada a netbooks e UMPCs, passando muito longe dos smartphones. Entretanto, a Intel está trabalhando em uma versão atualizada, batizada de Moorestown, com mais componentes integrados e um consumo elétrico mais baixo, que deve estar disponível a partir de 2010:


Plataforma Moorestown: um sistema x86 completo em apenas 4 chips

A Intel demonstrou um protótipo de um comunicador pessoal baseado no Moorestown no último IDF. Apesar de estranho, o formato alongado permite incluir uma tela de 1024 pixels de largura (embora com apenas 256 pixels de altura), que permite acessar páginas web sem redimensionamento do conteúdo. Ainda não é um smartphone, mas está chegando perto:

Se comparado com chips baseados no Cortex A8, como o OMAP3430, uma versão de baixo consumo do Moorestown perderia tanto em custo quanto com relação ao consumo elétrico. Se operasse à mesma frequência, ele poderia ganhar com relação à potência de processamento, mas por uma pequena margem. É provável que o Moorestown chegue a ser usado em alguns modelos de tablets ou até mesmo em alguns smartphones (o Android, por exemplo, pode ser portado para rodar sobre a plataforma sem muito esforço), mas eles, provavelmente, ainda serão aparelhos grandes e pesados, nos moldes do Nokia E90 e do HTC TyTN II.

Entretanto, a Intel já anunciou que está trabalhando em uma terceira geração da plataforma (que será fabricada em uma técnica de 0.032 micron e oferecerá um consumo elétrico mais baixo), com a qual ela pretende levar o Atom até os aparelhos mais compactos.

A idéia parece ser ganhar na base da força bruta, investindo pesadamente no desenvolvimento de versões cada vez mais otimizadas e fabricadas usando técnicas cada vez mais avançadas de produção, de forma a reduzir o consumo elétrico dos chips e integrar mais componentes a cada versão, até que eles, finalmente, passem a substituir os chips ARM em larga escala.

A grande aposta da Intel é que, por serem processadores x86, o Moorestown e os sucessores terão uma vantagem competitiva, já que permitirão rodar o Firefox e outros softwares completos sem necessidade de modificações nos binários. Naturalmente, eles têm também a desvantagem de não serem compatíveis com os softwares compilados para a plataforma ARM, o que torna o uso das instruções x86 uma faca de dois gumes.

Mesmo que fossem lançados aparelhos com potência suficiente para rodar distribuições Linux completas (ou mesmo alguma versão otimizada do Windows Vista), isso não seria necessariamente uma boa idéia, já que sistemas operacionais para desktop consomem muito processamento, o que, em um smartphone, significaria uma grande redução na autonomia. Sistemas baseados em Linux para smartphones, como o LiMo, ou o próprio Android, são baseados em versões fortemente modificadas e otimizadas do kernel, rodando uma interface leve e aplicativos otimizados, muito diferente da selva de componentes e serviços de uma distribuição Linux para desktops, como o Ubuntu.

Com relação à questão da eficiência, embora seja quase impossível produzir um chip x86 tão eficiente quanto um chip ARM (devido à necessidade de incluir no chip todos os componentes necessários para decodificar as instruções, de forma a manter compatibilidade com o conjunto de instruções x86), a Intel parece convencida que pode anular a diferença com o uso de técnicas mais avançadas de fabricação.

A Intel já domina a técnica de 0.045 mícron e já realiza testes com a geração seguinte, de 0.032 micron, enquanto fabricantes de chips ARM, como a Texas Instruments, ainda estão fazendo a migração dos 0.13 ou 0.09 para os 0.065 mícron. Considerando que um processador fabricado usando a técnica de 0.045 mícron tem um consumo elétrico até 50% inferior que outro similar fabricado usando a técnica de 0.065 mícron, pode realmente ser que a Intel ria por último, embora ainda tenha um longo caminho pela frente.

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