Quem acompanhou a evolução dos computadores fabricados no Brasil durante a reserva de mercado, ou já estudou sobre a história da informática, com certeza se lembra do MSX, que, depois dos PC’s e dos Mac’s, foi possivelmente a terceira plataforma de computadores pessoais mais utilizados, concorrendo com o Amiga.
Na verdade, o MSX fez tanto sucesso, que até hoje existe uma comunidade de usuários e desenvolvedores que gosta, usa e desenvolve coisas novas sobre a plataforma.
A poucos dias, recebi um contato do Ricardo Jurczyk Pinheiro, anunciando a MSX Rio, que reproduzo abaixo:
A MSXRio é o encontro carioca e fluminense de usuários de microcomputadores MSX. São micros japoneses, e no Brasil feitos pela Gradiente (Expert) e Sharp (Hotbit) entre 1985 e 1992. O MSX é uma máquina simples, com bom poder computacional, fácil de usar e barata.
Maiores informações no site: http://www.msxrio.com.br
A conversa acabou se transformando numa entrevista, onde ele fala um pouco sobre a história do MSX e como a plataforma é mantida viva até hoje, com novidades surpreendentes. Vamos começar com um texto rápido que conta a história do MSX, que está disponível no site do evento:
Em 1985 foi lançada a segunda versão, MSX2, com novidades na parte gráfica, gerenciamento de memória e vídeo, como poder de controlar um superimpose (usado para produção de vídeo). Foi um sucesso retumbante, alcançando um enorme sucesso no Japão e Europa em geral. No mesmo ano, no Brasil, a SHARP e a GRADIENTE fabricaram e lançaram seus MSX, ambos da primeira versão (MSX 1). Seus micros, Hotbit e Expert (respectivamente) foram a grande vedete de feiras de informática e eletrodomésticos, alcançando ao longo dos anos o total de 400.000 máquinas fabricadas.
Em 1988, o MSX chegava a 2 milhões de micros vendidos no mundo, e o título de “melhor microcomputador de 8 bits do mundo”, assim como o MSX2+ era lançado. Suas melhorias enfocavam novamente a parte gráfica e a capacidade de geração de som, tornando o MSX um microcomputador multimídia, antes mesmo que o termo tivesse sido cunhado. Em 1990, 4 milhões de MSX já tinham sido vendidos ao redor do mundo.
Vários periféricos haviam sido desenvolvidos ao longo dos anos, desde disk-drives, portas seriais, interfaces MIDI (para comunicação com teclados eletrônicos), digitalizadores de imagem, expansões de memória (até o limite de 4 Mb), interfaces para conexão de discos rígidos, modems, canetas óticas, mouses, leitoras de código de barras, impressoras coloridas, e até mesmo pequenos robôs que poderiam ser controlados pelo MSX. Software também foi produzido: compiladores, aplicativos, utilitários e é claro, muitos jogos. Tudo isso, ao longo dos anos, contribuiu e muito para a popularização do MSX pelo mundo.
No ano de 1990 aconteceu o último episódio (oficial) da saga MSX que trouxe um inédito avanço para o padrão; em outubro de 1990 foi lançado o MSX Turbo-R FSA1ST. O MSX Turbo-R é semelhante a um MSX2+, com a diferença de que a CPU central não era mais o Z80 mas o veloz R800 que agora sim passaria a ser de 16 bits. Logo, um Turbo-R consegue ser em média até 10 vezes mais rápido que um MSX2+ normal. O Turbo-R também continha um processador de som auxiliar o PCM (Pulse Code Modulator) para digitalizar (sampler) e reproduzir sons com amostragem de até 15,75 KHz.
Em 1991 foi lançado o MSX Turbo-R FSA1GT, que trazia mais RAM (512 Kb, ao invés dos 256 Kb do ST), além de uma interface MIDI para conexão digital de instrumentos musicais, controlando até 32 canais de som simultâneos. O GT também trazia embutido em ROM um ambiente gráfico, o MSX-View. O View contém programas como editores de texto, editores gráficos, planilhas integradas, gerenciador de arquivos, tudo sendo acionado por um mouse (o que hoje popularizou-se mais com o Windows dos PC’s).
Em 1993, para tristeza dos usuários, o MSX, depois de mais de 5 milhões de micros vendidos em todo o mundo, pára de ser fabricado. A Panasonic alegou que o problema não era queda nas vendas (que estavam muito boas), mas porque a empresa não tinha mais interesse em microcomputadores, investindo então no desenvolvimento do videogame 3DO. Mas nesta época, já existiam vários grupos de usuários organizados que produziam software e hardware de qualidade para o MSX, e ainda incontáveis usuários espalhados pelos quatro cantos da terra. Na sua maioria estes usuários eram (e são) jovens estudantes que sabem explorar bem os recursos da máquina, e não é difícil conhecer entre eles engenheiros eletrônicos e exímios programadores. Alguns, inclusive, se encontram aqui no Brasil.
Daí veio a atual fase, a dos usuários tomando a consciência de que são eles é que fazem o MSX, criaram-se então muitos mais grupos de usuários e de programadores que criam programas de qualidade para o MSX, fazem feiras só de MSX onde demonstram e comercializam seus programas e equipamentos, se reunem, discutem, publicam fanzines e revistas, se organizam, trocam programas; e principalmente criam uma razoável quantidade de software e hardware com uma qualidade profissional de fazer inveja a micros de 32 bits! Na Internet, inúmeras homepages surgem falando de MSX, trazendo jogos antigos e novos, discutindo aplicações, esquemas de hardware, vendendo produtos, entre muitas outras coisas.
Recentemente, a empresa japonesa ASCII Corp. (detentora mundial da marca MSX) anunciou que tem novos planos para o padrão, que incluem o relançamento do microcomputador no Japão em 2003, para entrar no mercado que já lhe pertenceu: o mercado dos microcomputadores de baixo custo e fácil uso. Resta a nós, usuários, aguardar, ansiosos, pela volta do “mais mágico dos computadores” ao mercado.
Vamos então à entrevista 🙂
1- O MSX deixou de ser fabricado em volume há mais de uma década. Como a plataforma tem sido mantida viva até hoje?
Basicamente pelo trabalho de muita gente, que gosta da plataforma, ao redor do mundo. Nisso, a comunidade MSXzeira é muito parecida com a comunidade open-source: Todos gostam das suas respectivas plataformas, desenvolvem, criam, mexem, divulgam e tornam-na um pouco mais conhecida a cada dia.
No mundo, o maior site é o MSX Resource Center (http://www.msx.org), com tradução para vários idiomas, inclusive o português. No Brasil, temos várias listas de discussão, sendo que a mais antiga e maior delas é a MSXBR-L (http://www.msx.org.br). Há muitos sites divulgando a plataforma, e muita gente desenvolvendo para o MSX. Os maiores exemplos são:
- O Uzix, um Unix para MSX, com direito a acesso à Internet (http://uzix.sf.net);
- O Knightmare Gold, um remake do clássico Knightmare para MSX 2, com música de CD (http://www.caetano.eng.br/MSXPage/KMG/);
- A interface IDE para MSX, o que nos dá a chance de finalmente colocar um HD, CD-ROM, DVD-ROM, etc., no MSX (http://www.msxprojetos.com.br);
- Os jogos do Slotman, notório desenvolvedor de jogos para PC e MSX (http://www.icongames.com.br/msxfiles/).
Entre muitos outros. Há muita gente refazendo etiquetas de jogos, digitalizando livros e revistas antigas (com autorização dos autores), organizando arquivos antigos e disponibilizando para quem quiser pegar (ftp://ftp.funet.fi/pub/msx/), até fazendo camisas com o logo, pins e canetas personalizadas! Tem de tudo na comunidade, e quem quer ajudar, tem chance.
2- Qual a configuração do seu MSX, quais acessórios adicionou ao longos dos anos e para quais aplicações o utiliza?
Eu tenho 2 MSX, no momento, e estou na espera de mais 2. Por que 4? Ora, são os 4 Hobbits, ora! =) Todos os meus micros são “membros” da Sociedade do Anel, e os MSXs são os hobbits:
O “Frodo” é o meu MSX Turbo-R. Tenho ele desde 1997, e comprei-o no exterior, via Internet. Ele veio da Finlândia (embora seja um micro japonês). Ele tem 512 Kb de RAM, um expansor de slots (feito pelo Ademir Carchano, http://www.msxprojetos.com.br), uma controladora SCSI, com um HD de 2 Gb, CD-ROM e Zip-Drive. Ele também tem um monitor RGB, colorido, da Philips, mouse (Yamaha), etc.
O “Pippin” é um Philips NMS-8250, um MSX 2 da Philips que foi transformado para 2+, bem parecido com o Expert, mas adaptado com um terceiro slot interno. Nele pretendo colocar uma interface IDE e um cartão Compact Flash, para usar como HD.
Uma coisa legal é que quase tudo do MSX é externo. Logo, fica fácil trocar os dispositivos. Eu tenho ainda uma MegaRAM, um cartucho SCC, um segundo expansor de slots, um digitalizador da Sony (HBI-V1, que me permite fazer alguns vídeos curtos), entre outras coisas. Em resumo, muita coisa!
No momento tenho usado bem menos do que eu gostaria de usá-los. Jogar é uma coisa que todo MSXzeiro gosta, pois os jogos são simples e desafiantes, divertidos e bem-feitos. Mas também gosto de usar ele para programar (Pascal, C), editar alguns textos, fazer coisas simples que eu faço no PC, mas que é viável também no MSX. Navegar na Internet ainda não, ainda não providenciei uma placa de rede para nenhum deles (se bem que eu queria uma wireless).
3- Além do sistema original, quais outros sistemas operacionais estão disponíveis para o MSX?
Como já citei, temos o Uzix, que é um trabalho longo, árduo e quase sem reconhecimento, feito pelo Adriano Cunha. O site é http://uzix.sf.net. O Uzix é um Unix baseado na 7a edição do sistema (AT&T). O Adriano pegou o trabalho de um sujeito, chamado Douglas Braun, e, movido de um “santo orgulho” (tal qual o Linus Torvalds), resolveu portar e adaptar o bicho. Anos depois, temos um sistema multitarefa rodando numa máquina que não tem MMU, por exemplo. Com uma interface serial, hoje, dá para conectar (via SLIP) a uma máquina Linux e trocar arquivos, mandar ping (e responder), usar o telnet e outras coisas. Ah, também ler emails (mailf) e bater papo no IRC (ZICA), fora a Web.
Nessa foto aqui, temos o Adriano com o seu micro, ligado a um celular GPRS, usando ele para acessar a Internet:
Aqui vão outras fotos do Uzix:
O próprio Adriano começou um segundo projeto, usando como base o SOLX-DOS, um DOS baseado no MSX-DOS e desenvolvido pela Microsol Tecnologia (de Fortaleza, CE), mas não sabemos como está o trabalho, ou o que ele quer fazer.
Existem outros projetos, inclusive de ambientes operacionais. Um que surgiu recentemente, muito interessante, é o SymbOS (http://www.symbos.de), uma interface gráfica com a cara do Windows 95. Originalmente, o autor a desenvolveu para o Amstrad, um micro europeu que não chegou ao Brasil. Mas ele gostou do MSX e resolveu portar. Hoje temos um ambiente bem simpático e funcional, multitarefa e cheio de recursos.
Tem uma imagem do trabalho desse alemão, que está aqui:
4- É possível acessar a Web num MSX? Como funciona?
Sim, é possível. O esquema é interessante: O MSX não tem poder de processamento para renderizar uma página HTML em tempo aceitável, logo, a idéia é usar servidores intermediários no caminho (os WILD servers). O navegador (no nosso caso, o Fudebrowser, que é um navegador fudeba) solicita a página ao servidor WILD mais perto. Ele, por sua vez, pega a página, renderiza numa forma que o MSX entenda, e repassa a ele, que abre e navega normalmente. É semelhante ao WAP, dos celulares. Entenda que é um pouco complicado, mas é possível, conforme podemos ver nessas fotos aqui:
5- Como alguém interessado poderia adquirir um MSX hoje em dia? Quais acessórios seriam recomendados e onde encontrá-los?
Olha, para adquirir um MSX 1 é fácil. Hoje em dia não é difícil achar alguém vendendo um velho Expert e/ou Hotbit nos leilões online, mas muitos pensam em fazer fortuna e cobram caro por uma máquina que não vale muito.
Outro problema é que a brincadeira realmente começa com um MSX 2 e para conseguir um é mais complicado. Ou você compra um já transformado (preço em média em torno de R$ 150 a 300), ou adquire um MSX importado. Os preços oscilam num intervalo de até R$ 100 para um MSX 1 com drive e outros apetrechos, a até R$ 1000 por um Turbo-R completo (que é uma raridade, o meu, por exemplo, veio sem caixa, mas com os manuais em japonês).
Sobre os acessórios; de cara recomendo um drive de 3,5″, mas assim que puder, pode ir pensando numa IDE (R$ 180 no site da MSXProjetos). Se possível, expanda a memória para 256 Kb, ou mais, o que ajuda bastante.
A partir daí, tem o MegaRAM, SCC, Music-Module, SCSI, vai o que o usuário souber aproveitar a oportunidade e tiver dinheiro em caixa. É difícil encontrar certas coisas à venda, e mais difícil ainda encontrá-los tendo algum dinheiro no bolso =). Mas vale muito a pena, é sempre um prazer mexer nos MSX, esse que é “o mais mágico dos microcomputadores”.
6- Poderia nos falar um pouco mais sobre o MSXRio e dar um preview de algumas das novidades que serão apresentadas?
A MSXRio é um encontro de fãs. Logo, quem quiser ir lá conferir, que não venha com discurso de “ah, micro velho, meu PC é melhor, bla bla bla bla”. Se quiser ir para esse tipo de crítica tola, então não perca seu tempo. Nós não somos muito amistosos esse tipo de gente. =)
As palestras ainda estão sendo fechadas. Pensamos numa mesa-redonda sobre o futuro do MSX, e os projetos da MSX Association (http://www.msxa.org) e que tem sido assunto repetidamente no nosso fanzine, o MSX-Force. Teremos uma nova edição do fanzine nessa edição da MSXRio, a propósito. Vamos demonstrar o SymbOS, o Uzix, vamos conversar um bocado, apresentar nossos micros e mostrar novidades, em termos de demonstrações, aplicativos e é claro, jogos. Vai ser muito divertido, e convidamos a todos que venham se divertir também! http://www.msxrio.com.br
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