Até agora, este artigo vem apontando apenas fatos, usando referências substanciais. Mas ao tentar prever o futuro, vamos entrar na seara das opiniões e da especulação informada. Eis alguns possíveis cenários futuros:
O melhor cenário para a Microsoft: domínio dos portáteis – A favor desse cenário está o fato de que as próprias definições desses mercados relativamente novos são instáveis. A Microsoft (ou qualquer outro nome grande que tome parte dessa briga) poderia alterar o cenário muito rapidamente. Prova disso é a Apple, que assim o fez em 2010 ao apresentar o iPad. Por que a Microsoft não poderia fazer o mesmo?
A Microsoft ganhou experiência nestes sectores do mercado na década passada, e tem um produto competitivo, o novíssimo Windows Phone 7. Mas isso não quer dizer que ela vá competir em pé de igualdade. Se a Microsoft puder transportar sua imensa base instalada de software para computadores pessoais para os dispositivos portáteis, unindo-os de maneira inseparável, ela pode ampliar seu domínio em sistemas operacionais rumo a essas novas plataformas. O objetivo da Microsoft é fazer uso de sua força monopolista do mercado, assim como faz nos computadores pessoais, e impedir que o consumidor tenha escolha.
Outro ponto a seu favor: a Microsoft já deu provas de ser capaz de reagir muito rapidamente ao que ela identifica como uma ameaça. Quando os netbooks foram lançados em 2007, os relatórios iniciais alegaram que a maior fatia desse mercado seria do Linux. A Microsoft logo virou a mesa, mantendo o Windows XP no mercado (em vendas e suporte) por mais tempo do que planejara inicialmente, e lançou o novo sistema operacional Windows 7 em sua limitada Starter Edition (41). Hoje, a Microsoft é líder em sistemas operacionais para netbook (42, 43).
Contrariando esse cenário de dominância da Microsoft, temos vários fatos importantes. Primeiro, os netbooks. Os netbooks são apenas laptops menores. Eles são computadores pessoais em termos de interface e design, e não algo radicalmente diferente como os tablets ou os smartphones.
A Microsoft conseguiu estender seu monopólio para os netbooks porque os mesmos fabricantes e parceiros de OEM estão envolvidos com os netbooks e laptops. Estas relações desiguais com OEMs são a base para o monopólio da Microsoft nos sistemas operacionais de PCs (44, 45, 46, 47, 48). A Microsoft trabalha com esses parceiros de maneira que os dois lados saiam ganhando, usando sua estratégia de obsolência planejada (49). Logo, a Microsoft estendeu facilmente seu monopólio de sistemas operacionais para os netbooks.
Se a Microsoft pudesse usar seu poder monopolista para levar seu domínio em sistemas operacionais para dispositivos portáteis, ela certamente já teria feito isso. Na área de smartphones, é preciso relacionar-se e fechar acordos com empresas completamente diferentes. Até agora, isso também vale para a área de tablets.
Os concorrentes da Microsoft nesses novos mercados são grandes e fortes. Não se trata da situação em que um grupo de pequenos inovadores abre as portas de um mercado e fica à espera de um grande participante que vá dominar tudo. Os grandes atores já estão atuando, e estão vencendo a Microsoft.
A Apple é muito inovadora e entende o que atrai o consumidor. Com o iPod, o iPhone, e agora com o iPad, a Apple deu umas boas pauladas na Microsoft, apresentando novos conceitos e sendo a pioneira em mercados totalmente novos.
O Google é novo nessa área de dispositivos portáteis, mas está apresentando ótimos produtos na forma do Android e do Chrome. O Google dá força aos seus sistemas operacionais com o Google Apps e um estoque imenso de aplicativos para portáteis, evitando possíveis vínculos ao Microsoft Office e ao setor de software de computadores pessoais dominado pela Microsoft. O trabalho do Google provavelmente vai fazer naufragar o desejo da Microsoft de unir de maneira inseparável seus programas lançados para computadores pessoais aos novos mercados de portáteis.
No segmento de smartphones, concorrentes como BlackBerry OS e Symbian OS vivem lá. Eles foram feitos para isso. E a RIM acaba de lançar seu próprio tablet, o PlayBook, que roda o BlackBerry Tablet OS (baseado no QNX).
Com esse tipo de oposição variada e forte em um mercado relativamente estabelecido, não parece muito provável que a Microsoft vá conseguir monopolizar o mercado de sistemas operacionais para portáteis do mesmo jeito que fez nos computadores pessoais.
Chances disso acontecer: pequenas.
O pior cenário para a Microsoft: o fracasso nos portáteis – Neste cenário, a Microsoft não consegue ser uma das maiores participantes do quadro ainda em evolução dos portáteis para o consumidor.
A favor deste argumento está o fato da família de sistemas operacionais Windows ter pouca aplicabilidade orgânica nos portáteis. Os PCs são fundamentalmente diferentes dos portáteis, e a Microsoft não entende essas diferenças. Prova disso é que ela promove sua oferta como “Windows”, um rótulo fatalmente associado à onda tecnológica anterior, dos computadores pessoais. O Windows é uma marca negativa.
Quem defende esse ponto de vista cita a fatia de mercado em queda do Windows Mobile, e vê nessa queda uma tendência irreversível (50, 51). No ano passado vários analistas do ramo de computadores e da imprensa popular expressaram opiniões como (52):
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“Para todos os efeitos práticos, o Windows Mobile é uma plataforma morta” – ZDnet (53)
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“O Windows Mobile já virou coisa do passado” – CNet (54)
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“[O Windows Mobile] não para de perder mercado, e seu futuro parece negro” – Washington Post (55)
Há vários fatos que contrariam a realização do pior cenário para a Microsoft. Sem entrar na avaliação do Windows Phone 7, o que importa é que ele é uma oferta novinha em folha, sem relação com o Windows Mobile. Os comentários acima dizem respeito ao passado, e não ao Windows Phone 7 e ao futuro.
A Microsoft não está recuando nem se retirando do mercado de smartphones. Ela está se esforçando mais, fazendo outra incursão com um produto novo e que passou por uma reengenharia total. A empresa quer o mercado, e está brigando por ele.
Os dispositivos portáteis ainda são uma categoria amorfa em evolução, com muitos nichos e segmentações a serem definidas. Parece muito pouco provável que uma empresa com bolsos profundos e tecnólogos altamente qualificados como a Microsoft não possa abocanhar uma boa fatia de mercado ao investir e brigar por ele.
Finalmente, a Microsoft já mostrou ser capaz de entrar atrasada em um mercado após anos de muita pesquisa e ainda assim se dar bem. É só ver o sucesso que a empresa está fazendo com a linha Xbox/Xbox 360.
Parece muito pouco provável que a Microsoft vá fracassar terrivelmente nos portáteis, a não ser que ela se afaste desses mercados por vontade própria, mas o Windows Phone 7 prova que a empresa não tem intenção de fazer isso.
Chances disso acontecer: pequenas.
O cenário mais provável para a Microsoft: mais um gigante na briga – O cenário mais provável para a Microsoft nesse mercado de dispositivos portáteis ainda não amadurecido é também o cenário ideal para os consumidores. Nele, a Microsoft é uma dentre várias grandes empresas, bem financiadas e altamente capazes, brigando em um mercado altamente competitivo.
Nos computadores pessoais, a Microsoft detém facilmente o monopólio, mesmo com concorrentes agressivos como a Apple e o Linux. Isso acontece porque os concorrentes não podem quebrar um monopólio, mesmo em casos extremos, como quando seus produtos são gratuitos (é só ver o caso do Linux). Um mercado monopolista não tem concorrência.
A Microsoft exerce seu poder monopolista por meio de um relacionamento desigual com os fabricantes e OEMs. Ela também cria uma situação na qual os dois lados saem ganhando, com a estratégia da obsolescência planejada (56). Isso explica como a empresa ultrapassou o Linux rapidamente nos netbooks.
Apoiando esta visão está o fato da maior fatia de mercado da Microsoft estar nos Estados Unidos – onde conquistou o status de um monopólio aceito legalmente – ao contrário do que acontece no oriente, onde ela é regularmente levada à justiça e sofre restrições por parte do governo.
A situação é completamente diferente na arena dos dispositivos portáteis. A Microsoft não conseguiu estender seu monopólio a dispositivos menores do que os netbooks, como mostram as estatísticas. O seu relacionamento com fabricantes e OEMs não se aplica a esses mercados. Em vez disso, a empresa precisa fazer novas alianças, criar novos canais de distribuição e traçar outras estratégias de marketing, concorrendo cabeça a cabeça com empresas de mesmo porte, como o Google e a Apple.
Durante seu julgamento antitruste nos Estados Unidos, os executivos da Microsoft enfatizaram várias vezes que só queriam uma concorrência justa. Pois é isso que eles terão nesses novos mercados.
Há quem preveja o futuro da Microsoft nesses mercados com base unicamente em suas avaliações pessoais do Windows Phone 7. Mas para julgar o Windows Phone 7, é preciso deixar o hype inicial morrer e ver os números reais de vendas. Vamos esperar entre seis meses e um ano para avaliar o impacto do produto.
Mais importante é que o Windows Phone 7 sozinho não vai ditar mais o futuro da Microsoft em portáteis do que o Windows Mobile. Ao substituir o Windows Mobile pelo Windows Phone 7, a Microsoft mostra estar disposta a explorar novas direções e apresentar novos produtos. A empresa pretende vincular seu futuro ao sucesso, e não a um produto.
No quadro geral, o resultado mais provável na área de sistemas operacionais para dispositivos portáteis é o de que a Microsoft não consiga monopolizar ou dominar o mercado, mas que seja sempre uma grande participante dele.
Eu acredito que a Microsoft vai lutar para mais uma vez ser parte de um pequeno grupo de concorrentes essenciais. A melhor analogia histórica é a forma como a IBM alcançou o sucesso no mercado de médio porte para servidores Unix na década de 90. Chegando atrasada, ela lutou muito e conseguiu um empate com a Sun e a HP no mercado de servidores Unix que havia menosprezado anteriormente.
Este cenário é o melhor para o consumidor, que vai desfrutar dos benefícios de uma concorrência justa e plena que ainda não existe no mercado de sistemas operacionais para computadores pessoais.
Chances disso acontecer: altas.
E qual é a importância disso?
Que importância tem isso? A concorrência traz benefícios ao consumidor.
Se você for um comprador em potencial de smartphones ou tablets, vai poder fazer escolhas melhores se conhecer mais sobre esses mercados antes de fazer a compra. Você não vai investir sua grana em um produto que pode ficar órfão ou em uma empresa que vai ser derrotada no mercado. Você quer um produto com chances de atrair toneladas de aplicativos.
Para quem trabalha na área da computação, que muda tão rapidamente e exige habilidades que surgem em um dia e desaparecem no outro várias vezes durante sua carreira, é vital prever como o mercado vai evoluir. Quem não sabe avaliar bem a situação põe em risco seu ganha-pão.
Na minha carreira, já vi várias tecnologias importantes ganharem destaque e sumirem poucos anos depois. Muitas carreiras morreram junto com elas. O primeiro passo para manter sua carreira nos trilhos é identificar com precisão as tendências do mercado.
Mesmo que você ache que este artigo errou o alvo, ele cumpriu sua tarefa de fazê-lo pensar no assunto e estabelecer sua própria análise. Se puder, contribua deixando um comentário com a sua opinião. Eu agradeço.
No mês que vem…
Como alguns leitores sabem, eu tenho escrito uma série de artigos mensais para o OS News sobre como fazer para que computadores antigos continuem sendo úteis (listados abaixo). O artigo do mês que vem vai retomar esse assunto, tratando de uma técnica valiosa para que esses computadores antigos possam ser úteis novamente: o uso de vários sistemas operacionais. Essa abordagem une todas as vantagens da instalação pré-existente do Windows às vantagens do software livre e de código aberto. O artigo vai descrever e comparar diferentes técnicas para rodar vários sistemas operacionais em um único computador.
Howard Fosdick é presidente da FCI e consultor independente especializado em bancos de dados e sistemas operacionais. Ocasionalmente ele exerce a função de analista da indústria para fornecedores de software – mas nunca na área de dispositivos portáteis! Entre em contato com ele pelo email contactfci arroba sbcglobal ponto net.
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Como a restauração vence a obsolência planejada
O que realmente acontece com os computadores “reciclados”?
Uma visão geral de como revitalizar computadores antigos para reutilização
Um procedimento passo a passo para tornar o Windows mais seguro
Como melhorar o desempenho de qualquer versão do Windows
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Como rodar vários sistemas operacionais
Em breve
Créditos a Howard Fosdick – osnews.com
Tradução por Roberto Bechtlufft <info at bechtranslations.com.br>
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