Um dos diagnósticos mais comuns em oficinas de informática é o típico “máquina liga mas não dá sinal”. Isso pode ocorrer pelos mais diversos motivos, mas como identificar o problema da forma mais ágil possível? Baseado em alguns anos de experiência e observação, escrevi este tutorial de forma à abordar os problemas e procedimentos mais comuns no dia-a-dia de uma assistência.
Primeiros passos
Antes mesmo de abrir a máquina deve ser observada a tensão em que a fonte se encontra. A maioria das fontes (ou PCs) sai de fábrica chaveada em 220v (evitando assim, na maioria dos casos, que queime se for ligada em 220v e estiver chaveada em 110v por acidente), e a maioria dos estabilizadores trabalha com uma tensão de saída de 110v. O que ocorre na maioria dos casos é exatamente isso, a fonte dá partida mas a placa-mãe não dá sinal quando a fonte está em 220v e o estabilizador oferece 110v. Verificado isso, vamos abrir a máquina.
A primeira coisa que a mother faz ao ser ligada é um auto-teste e um teste do hardware necessário para o boot. Ao fazer estes testes, se houver algum problema que a placa tenha detectado em seu diagnóstico (como estar sem memória), ela emite “bips” pelo falante e através de uma codificação tenta informar o problema. Por exemplo, nas placas atuais, ao tentar ligá-la sem placa de vídeo ela emite três bips rápidos.
Algumas marcas como a Soyo tentaram implementar em suas placas um BIOS com um recurso de voz, em que era “falado” o problema, como “Your keyboard is not connected” (Seu teclado não está conectado), mas acabou sendo inutilizado. Este recurso poupa muito tempo do técnico na hora de detectar o defeito. Como alguns micros vem sem o falante interno da máquina, recomendo sempre ter um na bancada da oficina para teste, afinal é muito mais fácil observar pelos bips o que a placa está querendo informar do que ir testando componente por componente para encontrar o problema. A seqüência de bips e seus significados varia de fabricante para fabricante (principalmente nas máquinas mais antigas), e normalmente é encontrada no manual ou no Google :).
Tecnicamente o único motivo para uma placa-mãe não dar boot e não “bipar” (emitir sons pelo alto-falante tentando informar ao usuário qual o problema) é devido à dois problemas que podem ocorrer: ou ela mesma estar danificada, ou o processador. Sem o processador a placa não tem possibilidade de iniciar o restante dos dispositivos e fazer os testes iniciais.
Agora imagine que há algum tipo de sujeira nos contatos do pente de memória com o soquete fechando um curto, ou que a própria memória esteja em curto. Nunca peguei um BIOS que, nesse exemplo desses os bips correspondentes ao de erro de memória, ou que falasse algo do tipo “Your memory is dirty” (risos), a placa simplesmente não ligou. É muito importante salientar isso, não só para esse exemplo de curto na memória como para qualquer defeito, pois caso contrário sempre iriamos condenar a placa-mãe ou o processador.
CMOS
O CMOS é o programa armazenado no BIOS, ou alguns até podem dizer que o BIOS é o programa armazenado na EPROM, ou até mesmo que o CMOS é o programa armazenado na EPROM. O que importa saber disso tudo é que um dos CIs da mother é uma EPROM (chip), que armazena o programa responsável por dar a partida na máquina, o CMOS ou BIOS.
Se alguma configuração crucial estiver errada, ou o BIOS tenha perdido os valores de configurações importantes (caso relativamente comum em placas de baixo custo, ou que tenham vindo com um erro de programação de fábrica) pode ocorrer da placa não dar sinal algum. Dar um “clear CMOS” ou “reset” é o procedimento técnico mais básico de todos, e resolve o problema em uma boa parcela dos casos. Talvez possa parecer até básico demais ter dedicado um tópico apenas para falar do BIOS, mas já perdi a conta de máquinas que chegaram em minhas mãos e já tinham passado por outros técnicos que haviam “condenado-as”, sendo que um simples clear CMOS resolveu.
Como comentei, placas com tecnologia atual podem vir com algum erro de programação no BIOS nas primeiras versões, então é importante sempre olhar no site do fabricante se não há alguma atualização disponível nesses casos.
Resetar o BIOS é um procedimento bem simples: na maioria das placas, em uma região próxima da EPROM vai haver um jumper (JP) e em alguns casos de cor distinta (vermelho ou azul) dos outros da placa. Com a máquina desligada, basta mover a posição do jumper, aguardar cerca de cinco segundos e voltá-lo para a posição original.
Caso não consiga identificar o jumper correspondente ao clear CMOS, ou não tiver o manual da placa em mãos, é possível também remover a bateria da placa, o resultado é o mesmo.
Com a popularização do overclock foi criado um recurso bem útil aos adeptos da técnica. É bem comum em um overclock mal sucedido (já que esta técnica é baseada em alterar valores direto no BIOS) a mother não dar mais sinal de vida e não ser possível retornar ao BIOS sem um clear. Esse recurso, chamado de “Watch Dog” (Cão de Guarda), consiste em resetar o BIOS sem precisar mexer no jumper, ou até na bateria. Consiste em uma tecnologia implementada hoje em grande parte das mothers em que, ao ligar a máquina já com a tecla Insert pressionada, o BIOS retorna valores como clocks, tensões e latências para o seu padrão, e isso pode trazer o computador de volta à vida sem nem precisar abri-lo.
Mexendo no hardware propriamente dito
Para dar partida no micro precisamos de cinco componentes: fonte de alimentação (também chamada de PSU), placa-mãe, processador, memória e placa de vídeo (VGA).
Sendo estes os componentes vitais, a primeira posição a ser tomada é desconectar qualquer outro periférico: retirar placas de expansão, desconectar cabos flat (tanto IDE quanto do disquete), cabos de alimentação sem ser da placa mãe e processador, se houver. Já peguei vários casos de drives de disquete com mau contato na alimentação e isso ocasionava algum tipo de curto e a máquina às vezes nem dava partida.
Limpeza
Computadores que ficam em linhas de produção de indústrias, ou que por algum outro motivo recebem muito pó tem uma tendência bem grande de entrar em curto por sujeira. Detectado que o problema está realmente em um ou mais componentes vitais para o boot da máquina, utilizar o pincel e a borracha é o próximo passo.
Procure utilizar pincéis que sejam macios e que não sejam de material condutor (procure por pincéis de pêlos de cavalo, por exemplo), e borrachas brancas. Desconecte memórias, placa de vídeo e processador. Se o cooler do processador tiver muitos resíduos, ou a pasta térmica foi mal aplicada, procure limpá-lo e reaplicar a pasta. Passe o pincel por toda placa, principalmente nos slots de expansão (incluindo o da VGA) e nos soquetes de memória.
A borracha branca deve ser utilizada para limpar o barramento tanto das memórias quanto das placas. Há técnicos que condenam a utilização da borracha, dizendo que retira parte dos contatos e outras coisas. Existem outras alternativas, como utilizar álcool isopropílico para limpeza, todavia nunca vi nenhum componente apresentando problemas por conta disso, mas é claro, utilizando uma borracha branca, macia e aplicada de forma suave.
Se até esse momento a máquina não der sinal, podemos ter certeza que há realmente algum componente defeituoso, e aí entra a parte do teste de substituição.
A memória é um dos componentes mais sujeitos à defeito, e por estarmos além de tudo procurando agilidade do serviço e por ser um componente simples de trocar, ela pode ser a primeira a entrar no teste.
Em alguns casos, dependendo da máquina é difícil encontrar peças para teste, como memória EDO, ou um processador de Slot 1 (alguns modelos de Pentium II, por exemplo). Particularmente tenho sempre algumas peças que sobram de máquinas de upgrade, ou que negocio para essa finalidade. Apesar de, por exemplo, um 486 com problema na placa-mãe, a mão de obra poder sair mais cara do que o valor da máquina e ser totalmente inviável, o cliente vai se sentir mais confortável se apontarmos o problema e não dissermos simplesmente “é inviável o conserto”. É uma questão mais ética, mas sempre é bom salientar que seria um bom momento para um upgrade, e não “remendar” uma máquina com vinte anos que está totalmente sujeita a apresentar defeitos.
Quando a máquina não liga mesmo com toda a limpeza e troca de memória, costumo partir para um método mais direto: tirar a placa mãe do gabinete, passar um jato de ar (para ter certeza que realmente não é algum resíduo causando curto) e monta-la em cima da bancada com outra fonte, processador, placa de vídeo e memória.
Placa de vídeo (VGA)
Se a mother em vigor possuir placa de vídeo onboard, teste com uma offboard. Procure sempre utilizar placas PCI para o teste, ou se houver slot, use ISA também. Há sempre possibilidades de um canal AGP queimado, apesar de ser um caso não tão comum.
Fonte (PSU)
Fontes com potência baixa, ou que não estejam oferecendo os valores de corrente e tensão que deveriam, podem fazer com que o micro não dê partida. Ainda mais em casos de máquinas com placas mais sofisticadas (que consomem mais corrente), ou VGAs de alto consumo. Procure sempre ter uma fonte confiável na bancada para testes.
Memória
Teste sempre os pentes de memória em outros canais da mother, já peguei alguns casos de canais estarem queimados. Uma dica bem simples (que também pode ser aplicada à VGA), se não houver peças de teste em mãos é, no caso da máquina nem “bipar”, remover a memória e tentar ligar o PC, observando se a mother “bipa” pedindo memória. Parece bem indiferente esse teste, mas com ele podemos praticamente concluir que, se com o pente a máquina não bipa, a memória utilizada está em curto, é incompatível, ou algo semelhante.
Processador (CPU)
Quando trocar o processador, nunca se esqueça de resetar o BIOS. Se o valor do vcore (alimentação do processador) estiver especificado manualmente no CMOS e colocarmos um CPU com vcore de valor diferente, podemos danificá-lo.
O processador é o único componente que a placa não vai bipar se estiver em falta, ou com defeito, mas em compensação, tirando motivos de super aquecimento, ou cooler mal instalado (ou incompatível com o porte do processador), é o último componente que se deve desconfiar. Também por ser de difícil acesso, procure deixá-lo por último na hora do teste.
Se nesse ponto ainda não tivemos sucesso em ligar a máquina podemos ter quase certeza que a culpada realmente é a placa-mãe, que por essa prática, se torna o componente mais difícil de concluir como sendo o responsável pelo defeito. Normalmente ainda costumo testar todos os outros componentes em outra mother para ter certeza que era realmente apenas ela o problema.
Capacitores
O capacitor é um dos componentes eletrônicos mais encontrados em uma placa-mãe, principalmente na região dos mosfets, que é responsável pela regulação e alimentação do processador. O problema dos capacitores é que são muito sensíveis à oscilações de tensão, e nas placas de baixo custo são empregados os mais modestos possíveis. O motivo desse tópico especial para os capacitores é a facilidade visual em diagnosticá-los como defeituosos.
Capacitor normal
Um capacitor, quando estiver “estufado”, não funciona da maneira adequada, e fica com a seguinte aparência:
Em geral, os capacitores que dilatam são os que trabalham com mais corrente: os da região que alimenta o processador. A questão é que muitas vezes a culpada pelos “capacitores estufados” não é a placa, e sim a fonte, afinal é ela que os alimenta.
Já tive casos como placas EPoX (que são de alto nível, principalmente para overclock, com toda essa parte elétrica mais reforçada) com capacitores estufados. É claro, pode realmente ser algum problema direto na parte elétrica da placa, mas na grande maioria dos casos, principalmente quando é a região dos mosfests afetada, passo sempre um orçamento com a troca da fonte inclusa (e claro, salientando para o cliente porquê a fonte está sendo trocada).
Já tive várias placas “ressucitadas” trocando capacitores. Isso exige certa habilidade com estanhador e um conhecimento de eletrônica, mas é uma solução bem viável, principalmente em placas que valem a pena um conserto, como o caso dessa EPoX que teve seus capacitores trocados e funciona até hoje.
A fonte tem mais capacitores ainda, e também estão sujeitos à esse tipo de problema, por isso não esqueça de abri-la e observar sua integridade.
Considerações finais
Para quem está acostumado à um ambiente de laboratório, sabe que muitas vezes a informática fica bem longe apenas do 0 e 1, e que as situações possíveis são infinitas. Entretanto, o que foi abordado nesse tutorial serve como boa base para identificar rapidamente o problema e solucioná-lo, ainda mais nessa área, que cresce e exige profissionais cada vez mais qualificados. Esse tipo de serviço (como praticamente qualquer um envolvendo problemas de hardware) é extremamente estressante. Como última dica posso recomendar um bom ambiente de trabalho, calma, e não se esqueça… É apenas uma máquina :).
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