No início dos anos 2000, os jovens e apreciadores de música foram surpreendidos por uma nova banda, formada quatro anos antes, que despontava para o sucesso. Uma mescla de vários fatores fez com que o Linkin Park fosse uma revelação do início da década passada. Seu vocalista, Chester Bennington, misturava rap, rock e nu metal em sua voz ao mesmo tempo alta e rouca de forma magistral, diferente de tudo que havia até então. Com seus gritos e rítmo alucinante, o Linkin Park logo conquistou uma legião de fãs e seu CD, Hybrid Theory, que carregava o primeiro nome escolhido para a banda, logo estourou nas paradas de sucesso. Três anos depois, o disco Meteora trazia o estilo que se tornara uma marca de sucesso da banda de volta às paradas.
Após o sucesso do segundo álbum, a banda continuou em turnê e se dedicou a outros trabalhos. Foi só em 2007 que o tão aguardado novo álbum de estúdio seria lançado. Durante o processo de produção de Minutes to Midnight, a banda disse que estava experimentando novos estilos e que colocaria rock onde deveria haver rap e rap onde deveria haver rock. No final, o álbum foi uma surpresa para todos: o estilo musical do Linkin Park estava totalmente diferente do que os fãs conheciam. O que teria acontecido? Algumas teorias na Internet diziam que o vocalista estava ficando sem cordas vocais e outras, levantadas até por alguns veículos especializados, chegaram a dizer que o Linkin Park queria se tornar o novo U2.
A verdade é que a mudança radical, decidida unilateralmente pelos integrantes do grupo, não agradou à maioria dos fãs. O novo estilo, com músicas lentas e melosas, em nada tinha a ver com os trabalhos anteriores e, certamente, alguém que não conhecesse a banda poderia facilmente dizer que o artista dos dois primeiros discos não é o mesmo dos dois últimos.
Uma situação similar a essa está ocorrendo neste momento nos sistemas operacionais. A cada dia, as principais interfaces gráficas da atualidade lançam novos e inovadores recursos que fazem muitos usuários torcerem o nariz na hora de fazer o upgrade. Aparentemente, os desenvolvedores estão com uma doença rara, nova e ainda não estudada: a Síndrome de Linkin Park.
Tudo começou em 2008 quando o pessoal do KDE lançou a versão 4 de seu ambiente desktop. Muitos estavam céticos em relação ao que poderia ser melhorado em relação à versão 3.5, lançada em Novembro de 2005, que aprimorava muitos dos recursos da versão 3.0, lançada em 2002, que já havia atingido um grau praticamente máximo de estabilidade, de usabilidade e de simplicidade. Mas eles insistiram na ideia e o lançamento foi quase um desastre.
Para começar, o novo KDE era visivelmente mais pesado do que a versão anterior – tanto no aspecto técnico quanto no aspecto visual e psicológico. Além disso, não sobraram críticas comparando o visual do KDE com o do então novo Windows Vista.
O modo de operação do ambiente também deixou muitos com um pé atrás. A começar que a versão original, ao introduzir o conceito de plasma e de widgets, não permitia que ícones fossem colocados na área de trabalho, mas apenas em uma pasta especial flutuante. Isso sem falar que muitos novos aplicativos decepcionaram: o reprodutor de vídeos Kaffeine, que na versão 3 tinha vários recursos, foi praticamente “capado” em sua nova versão. Alguns usuários, inclusive, não gostaram sequer do novo terminal Konsole.
O estopim foi quando os desenvolvedores do KDE 4, que também apresentava vários bugs, disseram que aquela versão era destinada aos desenvolvedores e aos usuários prematuros, apesar de a mesma ter sido anunciada como uma versão estável. De fato, a versão “estável” recebeu correções mensais até junho. A situação chegou a tal ponto que Linus Torvalds, criador do Linux e ávido usuário e defensor do KDE, chegou ao ponto de mudar seu desktop pessoal para GNOME, que ele próprio havia criticado anteriormente. Isso era tudo que o Ubuntu e as distros baseadas em GNOME estavam esperando.
Então, chegou a vez da turma do GNOME inovar. E a inovação gerou polêmica. Para começar, para utilizar a nova versão do ambiente gráfico em sua totalidade, seria necessário possuir uma placa 3D, o que nem todos os computadores tem, senão o usuário cairia em um modo de fallback com funcionalidade limitada. Segundo, as mudanças nas janelas dos aplicativos, em especial a remoção dos botões de maximizar e de minimizar. Os desenvolvedores justificam que, com a nova interface, não haveria nada para minimizar e a operação de maximizar seria feita arrastando-se a janela para o topo da tela, isso sem falar na maneira incomum de organizar os aplicativos e documentos.
Embora com menos críticas do que o KDE 4, alguns usuários torceram o nariz para a nova versão e, segundo fontes não oficiais, o pobre Linus Torvalds teria novamente mudado seu desktop, dessa vez para XFCE.
Embora muitos usuários de Windows já estivessem comemorando sua vitória, pois o Linux estava perdendo pouco a pouco sua facilidade de uso graças às novas interfaces, as quais também foram responsáveis por invalidar definitivamente o mantra de que uma versão atual de uma distro Linux pode ser instalada em um micro antigo, a Microsoft veio com a nova e revolucionária interface do Windows 8, que assim como a do Windows 95 em sua época, revolucionou os conceitos do sistema. Embora ninguém ainda tenha visto como o Windows 8 será ou vai funcionar exatamente, o anúncio de que a nova interface vai unir o desktop de PCs e de tablets e que o clássico Explorer com sua barra de tarefas vai rodar como um aplicativo no sistema faz com que muitos defensores do reino de Redmond comecem a sentir um frio na barriga.
O que está acontecendo, afinal?
De acordo com o filósofo brasileiro Boaventura de Sousa Santos, vivemos em um período de transição paradigmática, um período que nos leva a pensar. Essa transição torna-se evidente no meio informático. Mais do que nunca, estamos derrubando velhos conceitos e colocando outros no lugar. No entanto, a velocidada na qual a mudança é processada chega a assustar.
Temos a impressão de que as mentes criativas ficaram dormindo por um longo tempo e acordaram de repente com uma grande quantidade de energia acumulada. É como se dissessem: “O que estamos fazendo parados aqui? Vamos nos mexer!” ou então “Galera, 2012 está aí, vamos fazer tudo que sempre tivemos vontade” ou ainda “Viram como os desktops dos filmes são legais? Vamos fazer igual!”.
Embora a ideia de colocar-se a mesma interface em desktops, em netbooks, em tablets, em smartphones e em uma infinidade de dispositivos computacionais móveis, bem como de promover um casamento entre as interfaces web e dos programas soe poética, na vida real ela tem poucas chances de dar certo, pois o público-alvo e o modo de operação dos dispositivos é diferente.
Por exemplo: eu considero que a melhor maneira de se maximizar uma janela em uma tela sensível ao toque seja, de fato, arrastá-la para o topo da tela por um motivo bem simples: dependendo da qualidade do material do qual é feito a tela, da resolução da mesma e do tamanho dos dedos do usuário, tentar pressionar um botão maximizar pode trazer resultados inesperados, como minimizá-la ou fechá-la acidentalmente, ao passo que arrastá-la pela barra de título, que tem uma grande área disponível, criará um gesto de única interpretação. No entanto, essa lógica não se aplica quando transpomos a ideia para um desktop com mouse ou um notebook com touchpad, pois é muito mais rápido pressionar um simples botão é mais rápido do que ficar arrastando a janela por aí (eu mesmo já maximizei muitas janelas acidentalmente ao tentar movê-las).
Além disso, quando vejo a interface do Windows 8 e do GNOME 3, tenho a impressão de que, além de tentar trazer a experiência dos filmes para o mundo real, eles estão tentando transformar os desktops em videogames (já imaginei que, daqui há alguns anos, ao abrir um arquivo ou programa, a tela ficará preta e voltará com o aplicativo ocupando sua totalidade). De fato, botões grandes e coloridos com incríveis efeitos especiais podem ser muito atraentes para os novos usuários, mas aqueles que já possuem alguma experiência poderão pensar que estão sendo tratados como crianças. Atualmente, percebe-se um esforço para esconder do usuário toda a parte de configuração do sistema, mas até que ponto isso é benéfico? Será que um técnico que precisa resolver um problema vai encontrar a solução que necessita rapidamente com os novos recursos?
Parece que a explosão criativa que estamos presenciando não está agradando à maioria dos usuários que já tem alguma experiência. Embora os übergeeks que usam apenas um Fluxbox com algumas janelas de terminal abertas devam estar dando risada das preocupações dos usuários de KDE e de GNOME, e nem considerando os de Windows, a questão é válida, afinal, nós somos os principais interessados na aparência e na usabilidade de nossos desktops e queremos algo leve, agradável e simples de usar que não roube as atenções para si mas, sim, para o programa que precisamos naquele momento.
Pelo visto, nossa época será conhecida como a era das grandes inovações que não agradaram. Espero que em breve alguém descubra a cura para a síndrome de Linkin Park e que os desenvolvedores entendam, finalmente, que devem equilibrar sua vontade com o que é melhor para os usuários.
Por: André Ferreira Machado <andreferreiramachado em gmail ponto com>
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