Jobs na Atari: confira em detalhes como foi primeiro emprego de Steve no Vale do Silício

Antes de fundar a Apple, Jobs trabalhou na Atari. Confira em detalhes como foi sua passagem por lá nos anos 70.

Steve Jobs foi contratado pela Atari em 1974 como técnico de hardware. Dormia no chão, tomava banho esporadicamente, insultava colegas — e ainda assim foi essencial para um dos jogos mais icônicos da empresa. Mas quando tentou apresentar seu projeto de computador pessoal, foi rejeitado. Essa decisão levou à criação da Apple — e talvez a um dos maiores erros estratégicos da história da tecnologia. Este é o relato definitivo sobre a passagem de Jobs pela Atari.

A entrada pela porta da frente, mesmo sem convite

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Aos 19 anos, Jobs tinha abandonado o Reed College e voltado a morar com os pais em Los Altos. Ao ver um anúncio no San Jose Mercury News que dizia “Ganhe dinheiro e se divirta”, ele decidiu: iria trabalhar na Atari.

Foi até a sede da empresa, descalço, e disse que só sairia dali com um emprego. Al Alcorn, engenheiro-chefe, o descreveu como “um hippie na recepção”. Jobs foi contratado como técnico noturno, com salário de US$ 5/hora. Era o funcionário número 40 da empresa.

Ficha de emprego de Steve Jobs na Atari
Ficha de emprego de Steve Jobs na Atari

A ficha de emprego que Jobs preencheu se tornou lendária. À pergunta sobre meios de transporte, respondeu:
“Possível, mas improvável.”
E no campo “habilidades com computadores”:
“Sim.”

Essa irreverência não o impediu de entrar. Pelo contrário — era quase um pré-requisito para sobreviver ao ambiente anárquico da Atari.

Breakout, Wozniak e a traição ao amigo

Em 1975, Bushnell atribuiu a Jobs o desenvolvimento de um novo jogo baseado em Pong, mas single-player. O projeto seria Breakout, um futuro clássico dos arcades.

Sabendo de suas limitações técnicas, Jobs convocou seu amigo Steve Wozniak. Para estimular a economia de chips, Bushnell ofereceu um bônus: quanto menos componentes usados, maior o pagamento.

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Escritório da Atari nos anos 70

Bushnell ofereceu um bônus de US$ 5 000 se Jobs conseguisse reduzir o número de chips. Ele cumpriu a missão com a ajuda de Wozniak — mas manteve o bônus para si. Wozniak recebeu apenas US$ 350 e afirmou ter acreditado por anos que deveriam ter ganhado US$ 700 ou até US$ 1000.

A viagem à Índia 

Logo após Breakout, Jobs decidiu viajar à Índia em busca de iluminação espiritual. Convenceu Al Alcorn a justificar sua ausência com uma missão técnica para resolver problemas elétricos em fliperamas europeus.

“Quero ir para a Índia para o Kumbha Mela, que começa em abril. Vou partir em algum momento de março, ainda não tenho certeza. Se você quiser, e eu ainda estiver aqui quando você chegar, podemos subir juntos para as montanhas e você poderá me contar seus pensamentos e sentimentos, que não entendi totalmente pela sua carta”, escreveu Jobs em carta para o seu amigo de infância Tim Brown.

A Atari pagou metade da viagem. Na Índia, Jobs desistiu do guru que buscava, mergulhou no zen e retornou meses depois com a mente transformada — e um choque cultural profundo. Ao voltar, reapareceu na Atari e pediu seu cargo de volta. Foi aceito. 

O projeto de computador pessoal que a Atari rejeitou

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Commodore PET,

Com a popularização do Altair 8800 e Commodore PET, Jobs e Wozniak projetaram um computador pessoal compacto, com peças da própria Atari. A ideia era apresentar o projeto para a empresa, e oferecer a oportunidade de ser a pioneira nesse novo mercado.

Esse projeto foi apresentado em 1976. Nolan Bushnell ainda era o CEO da Atari, mas o cenário interno já havia mudado drasticamente: naquele mesmo ano, a Warner Communications havia adquirido o controle da companhia.

A partir dali, decisões estratégicas passaram a ser ditadas pela sede em Nova York, e a ordem era clara: manter o foco exclusivo em videogames e sistemas fechados. O projeto foi recusado. A ideia de abrir a arquitetura ou explorar o mercado de computadores pessoais não fazia parte da cartilha da nova gestão.

A segunda rejeição: quando a Atari recusou comprar a Apple

Meses depois de ver seu projeto de computador pessoal rejeitado internamente, Jobs retornou à Atari — agora como fundador de uma nova empresa. A Apple já existia, mas ainda era um embrião.

Jobs procurou a Atari com uma proposta ousada: vender a Apple em troca de um aporte de US$ 50 mil. A oferta incluía 30% de participação na empresa.

A resposta foi mais um “não”. O executivo Joe Keenan, então presidente da Atari sob o comando da Warner Communications, não levou Jobs a sério. Segundo versões que circularam posteriormente, sua reação teria sido ríspida:

Tire os pés da minha mesa. Saia daqui. Você fede. E nós não vamos comprar o seu produto.”
Frase atribuída a Joe Keenan.

A versão mais famosa é que Keenan teria considerado o jovem empreendedor “desalinhado, malvestido e imaturo” — e não confiável o suficiente para um investimento.

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Steve Wozniak e Steve Jobs

Quem confirma esse segundo episódio, de forma mais branda, é Allan Alcorn, engenheiro da Atari e mentor de Jobs nos tempos de funcionário. Segundo ele:

“Eu vi aquilo. Pensei, ‘uau.’ Achei aquilo realmente, realmente legal, mas não enxerguei nenhum mercado real na época — erro meu”.

Essa segunda rejeição teria um efeito duradouro. O nome Apple surgiu durante uma fase frutariana, após um período em uma fazenda no Oregon. Jobs disse que o nome soava “divertido, alegre e nada intimidador”. Mas havia também um elemento de provocação embutido na escolha: “Apple” viria antes de “Atari” na lista telefônica.

Anos depois, em uma apresentação nos anos 80, Jobs reafirmaria essa motivação ao dizer: “Eu trabalhei na Atari. Apple ainda nos colocaria na frente deles na lista telefônica.”

A miopia estratégica que enterrou a Atari

Nolan Bushnell, anos depois, lamentaria as decisões. “A Warner enterrou o Atari 800”, disse. A máquina tinha chipset superior, mas nunca atraiu desenvolvedores. Enquanto Jobs “evangelizava” programadores, a Atari ameaçava processar qualquer um que ousasse criar software para seus sistemas.

Chris Crawford, engenheiro da empresa, chegou a vazar documentos técnicos para desenvolvedores externos. Alan Miller implorou para que o Atari 400/800 fosse aberto. A resposta foi sempre a mesma: não.

O que Jobs levou da Atari para a Apple

Jobs sempre foi honesto sobre seu tempo na empresa. Disse que a eletrônica era uma forma de “colocar comida na mesa”, não sua vocação artística. Mas também admitiu: foi lá que entendeu o poder do design simples, das interfaces intuitivas e da liderança carismática.

A Apple nasceria com esses valores. Mas com uma diferença: Jobs controlaria tudo. Nada de hierarquias permissivas, como na Atari. A lição do caos serviu como bússola para sua obsessão por controle total.

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Editor-chefe no Hardware.com.br/GameVicio Aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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