Breve história das distribuições amigáveis

Breve história das distribuições amigáveis

Ubuntu, a distribuição friendly-user mais amigável e famosa no universo do Software Livre, não para de receber elogios e aplausos de seus admiradores. E não é para menos: inovando em diversos aspectos para facilitar ao máximo a vida do usuário e promovendo um marketing de alto nível, sem dúvida, o Ubuntu tem os seus méritos. Mas…

41f1db7

Se há algo que me deixa muito chateado – seja por parte de seus admiradores, da mídia ou da própria Canonical – está no fato dela ser anunciada de tal maneira como se fosse a única distribuição friendly-user no mundo, deixando à entender que as demais opções não promovem este antigo conceito! E não é bem assim…

Nos idos de 1994, as distribuições GNU/Linux da época tinham a fama de ser difícil uso (e bota difícil nisso, se comparado com os tempos atuais). O complicado processo de instalação, baseado em disquetes e sem um sistema de gerenciamento que simplificasse a administração dos softwares, tornavam complicadas as experiências com o Tux (se bem que o nosso querido mascote só foi adotado no ano seguinte). E olha que estamos falando de uma época em que o kernel Linux mal possuía os recursos essenciais e o sistema de busca do Google, sequer existia!

m59338a4b

Foi daí que surgiu um pequeno grupo de desenvolvedores americanos que decidiram criar uma distribuição GNU/Linux, mas com o diferencial de implementar uma série de recursos e funcionalidades para facilitar ao máximo a vida dos usuários mais inexperientes. Recursos, como o instalador amigável, o sistema central de gerenciamento de pacotes e os utilitários de configuração, ampliaram consideravelmente a base de usuários em sistemas GNU/Linux. Assim, nasceu o Red Hat Linux.

Pode parecer um verdadeiro absurdo em pensar que o sistema de gerenciamento de pacotes pré-compilados RPM era inovador (mesmo sabendo que até a mais insignificante distribuição atual possui alguma ferramenta do gênero), mas não é: antigamente, os softwares e seus componentes eram instalados manualmente, através do procedimento de compilação. Com o tempo, devido ao processo de amadurecimento dos softwares, mais componentes eram acrescentados, gerando com isto um complexo emaranhado de aplicativos e suas pendências para serem gerenciados individualmente (o resto, já sabem). Com o RPM, não só eram obtidas as aplicações necessárias no formato pré-compilado, como também eram informadas todas as suas pendências.

Também não poderia deixar de comentar o processo de instalação. Se antes, os métodos utilizados eram complexos e espartanos, a adoção de um instalador amigável se tornou outro fator imprescindível para o sucesso do Red Hat Linux, ainda que esta ferramenta rodasse em modo texto. As interfaces feitas através do ncurses – uma biblioteca que possibilitava construir caixas de diálogos amigáveis em modo texto – se revelaram muito eficientes na orientação de todo o processo de instalação da distribuição. Não era mais preciso ter que lidar com a terrível tela-preta do terminal!

Por fim, o desenvolvimento de uma série de utilitários de configuração, amenizou um grande tormento: o de realizar os ajustes e configurações manual de dispositivos e periféricos do sistema, através da linha de comando. A existência de ferramentas de detecção como o Kudzu, LinuxConf, SNDConfig, entre outras do gênero, tornaram a vida dos novos linuxers mais fácil e sem percalços. Ainda eram necessários alguns procedimentos técnicos para habilitar um dispositivo ou colocar os periféricos em funcionamento, mas tais ações já não se faziam tão frequentes o quanto antes.

Eis então, os três pilares de uma distribuição friendly-user:

  1. O sistema de gerenciamento de pacotes pré-compilados;

  2. O instalador com interface intuitiva e fácil de usar;

  3. As ferramentas automatizadas de ajuste e configuração.

E desde então, uma nova fase se iniciou. Com o grande sucesso alcançado pelo Red Hat, a conquista de uma imensa base de usuários para os padrões da época e a filosofia de liberdade e compartilhamento do Software Livre, surgiram as clássicas distribuições Red-likes…

Basicamente, uma distribuição Red-like é um projeto novo e independente, mas que mantém como base, o uso de uma distribuição Red Hat e a sua filosofia de trabalho: ser fácil de usar e administrar, graças ao uso de um sistema de gerenciamento de pacotes baseado no RPM, a utilização de instaladores intuitivos e fáceis de usar e a manutenção de ferramentas para ajuste e configuração do sistema. Para quê criar uma nova distribuição do zero, se a palavra de ordem do Software Livre é “reutilizar ao invés de reinventar a roda”, ainda mais tendo o código-fonte disponível da distribuição mais difundida do momento?

Conectiva, Mandrake e SuSE surgiram como as primeiras distribuições de grande sucesso, baseadas na Red Hat, embora muitas outras vieram nestes tempos. Mas enganam-se em pensar que elas apresentavam características idênticas, por tiverem as mesmas origens: cada uma possui seus diferenciais e também trouxeram inovações interessantes para a sua época…

A Conectiva começou basicamente como uma versão traduzida em pt_BR da Red Hat, mas tomou o seu próprio rumo, tornando-se independente. Já a Mandrake inovou ao trazer um sistema de instalação baseado em uma interface gráfica, detecção de hardware eficiente e um particionador de disco rígido com recursos de repartição e redimensionamento sem perdas de dados, tal como o Partition Magic. E a SuSE, antes baseado diretamente no Slackware, agregou uma série de ferramentas e utilitários do Red Hat, tendo em destaque o RPM (tornando-se uma autêntica Red-like) e em tempos depois, desenvolveu uma das mais poderosas ferramentas de configuração, o YAST.

Embora estas distribuições tivessem em comum o RPM como o sistema padrão de gerenciamento de pacotes, ainda não possuíam ferramentas de atualização online como o APT-GET. E cada uma buscou, à sua maneira, suprir estas deficiências: enquanto a Conectiva optou por portar APT-GET, a Mandrake e a SuSE optaram por desenvolver ferramentas próprias.

E mais alguns anos se passaram, embora as novidades tenham se concentrado mais no desenvolvimento do kernel e das aplicações, além do suporte ao hardware. Ao mesmo tempo em que o kernel 2.6 nascia, os ambientes gráficos ganhavam novos recursos e as aplicações desktops importantes como o OpenOffice.org e o Firefox começavam a amadurecer, a nVidia e a ATI desenvolviam drivers proprietários para as suas placas aceleradoras de vídeo. Quanto às tradicionais distribuições friendly-users, nada mais além de absorverem tais novidades e aprimorarem suas ferramentas, embora o surgimento dos live-CDs e algumas fusões se tornavam o centro das atenções: a Conectiva + Mandrake = Mandriva.

Já no final de 2004, eis então que surge o Ubuntu. Baseado em uma grande e estável distribuição que se diferenciava das demais por ser desenvolvida por uma comunidade e mantenedora de um formato de pacotes próprio, o Ubuntu acrescentou à ela inúmeras características – tanto funcionais quanto cosméticas -, tornando-se uma grande referência do Software Livre para os usuários desktops. Claro que outros detalhes também foram importantes, especialmente o marketing pessoal de seus usuários e a distribuição gratuita de mídias para a instalação. Enquanto que uma licença de uso do Windows custava uma pequena fortuna, até mesmo o CD do Ubuntu é gratuito!

À partir do Ubuntu, uma série de fatores culturais começaram a moldar o cenário dos sistemas GNU/Linux, graças especialmente a alta popularidade alcançada pela distribuição desenvolvida pela Canonical. A facilidade de uso e a usabilidade passaram a ser as características mais importantes para uma boa distribuição. E o sistema de gerenciamento de pacotes RPM, até então amplamente adotado pelas distribuições, começou aos poucos a perder visibilidade, já que novas distribuições nasciam sendo derivadas do Debian ou do Ubuntu. Por fim, a adoção do GNOME como o ambiente desktop padrão, tornou esta interface a número 1 do Tux, deixando o KDE – até então à frente da preferência como a mais popular – em segundo plano. Hoje em dia, poucas são as distribuições que se baseiam no KDE.

E chegamos aos dias atuais. Com mais de 50% de usuários desktops, grande influência no cenário do Software Livre e mantenedor de alguns projetos interessantes, o que esperar do Ubuntu para os próximos anos?

3d71d100

Talvez não venhamos a esperar algo mais do Ubuntu, mas sim, do Google Chrome OS. Se os agitadores de comunidades há tempos desejava uma empresa forte e popular por trás de uma distribuição, então parece que este momento chegou. Sob a batuta do Google e com alguns fatores à favor (a tendência na computação em nuvens e a proliferação de netbooks), mais novos episódios serão acrescentados à história das distribuições friendly-users. &;-D

Por Ednei Pacheco <ednei.pacheco [at] gmail.com>
http://by-darkstar.blogspot.com/

Sobre o Autor

Redes Sociais:

Deixe seu comentário

X