Hardware.com.br entrevista: Leonardo Munin, analista de pesquisa do mercado de celulares da IDC para América Latina

Hardware.com.br entrevista: Leonardo Munin, analista de pesquisa do mercado de celulares da IDC para América Latina

Conversamos com Leonardo Munin, analista de pesquisa do mercado de celulares da IDC para a América Latina. Dentre os assuntos debatidos estão a retomada da Nokia e BlackBerry ao mercado o panorama do mercado de smartphones no Brasil para 2017, entre outras coisas. 

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Hardware.com.br: Obrigado por conversar conosco Leonardo. Gostaríamos que você começasse comentando sobre essa fase de algumas marcas que não são tão tarimbadas no mercado de smartphones mas que estão ganhando espaço. Na última pesquisa divulgada pela IDC, vocês dizem que em 2014, 94% dos aparelhos vendidos no Brasil pertenciam as marcas globais, em 2016 esse percentual caiu para 80%. Você acha que nesse momento está mais “fácil” para que marcas como TP-Link, Quantum, Multilaser, entre outras, em relação ao que era antigamente?

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Leonardo Munin: Fácil não deve estar pra ninguém, mas com certeza esses fabricantes aproveitaram o momento de crise econômica e política, em que o consumo foi afetado por esses problemas, e então trabalharam em faixas mais de entrada, com preços menores. Com certeza tiveram essa entrada facilitada, por esse cenário de crise. Com a crise econômica houve essa abertura para outros fabricantes.

Além dessa questão de crise, que ajudou sim a ganhar fatia de mercado, a redução das operações da Sony e a saída do mercado da Nokia e Microsoft, deram oportunidade para que esses fabricantes não tão conhecidos anteriormente crescessem.

Hardware.com.br: O esforço desses fabricantes em contar com aparelhos com uma construção mais refinada, que vá além do corpo em plástico foi determinante também para esse crescimento? Podemos pegar o exemplo da TP-Link, que no ano passado trouxe smartphones de entrada da linha Neffos para o Brasil, que a construção era em plástico, já em 2017, essa mesma linha ganhará novos aparelhos que se encaixam naquela faixa de intermediários de gama alta, em que a construção e specs são melhores.

Leonardo Munin: Com certeza, o esforço desses fabricantes foi determinante, eles melhoraram bastante os aparelhos. Se você pegar pra comparar um aparelho da Alcatel, Positivo ou até da própria Multilaser hoje, com o que era entregue há dois anos, você perceberá uma diferença enorme em design, especificações, um telefone mais fluído.

O curioso é que o Brasil era o único país da América Latina que tinha esse cenário de que só as marcas globais eram as que dominavam. Sempre na América Latina a gente tinha um fabricante chinês ou um fabricante local. Até 2014 o Brasil estava focado muito em marca, porém a partir do cenário de crise, o preço voltou a ter mais relevância do que marca.

Hoje o mercado brasileiro é mais parecido com o do resto da região, ainda dominado por marcas globais, mas com algumas marcas locais fazendo volume. 

Hardware.com.br: Muito se comenta que o mercado de smartphones há muito tempo carece de inovação, que as mudanças ficam somente na questão da troca das especificações, e que o conceito da modularidade, seria essa grande inovação que muitos esperam. Porém, as experiencias até então não são positivas. O Google engavetou o Projet Ara, a LG fracassou com o G5, tanto que agora com o G6 abandonou o formato modular. Talvez só a Motorola tenha acertado, com o Moto Z e seus snaps, que funcionam bem. 

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Você acredita que a modularidade é realmente esse atributo para a inovação do mercado de smartphones, e já complementando, acredita que isso tornará algo amplo, com várias marcas investindo?

Leonardo Munin: Hoje os avanços são realmente mais difíceis, melhorar o smartphone se entende como aumentar os megapixels, aumentar a tela, trocar o processador. Fazer uma distinção entre o modelo anterior ou do concorrente é muito mais difícil do que era alguns anos atrás, então esse é o principal ponto. A parte de desenvolvimento de hardware, de inovação, com algum conceito disruptivo, realmente deu uma travada

Acredito que o diferencial dos smartphones, nem seja pelo campo da modularidade, e sim para acessórios em geral, e olhando de forma ampla pode até acrescentar o modular nisso, isto é, aquilo que você vai agregar ao seu aparelho.

No mês passado estive em Barcelona, na MWC 2017, e no caso da Motorola, eles devem continuar investindo nos snaps, com o lançamento de outros módulos, que devem chegar ao Brasil.

Então essa grande tendência é no campo dos acessórios, câmera 360º, teclado físico por Bluetooth, para facilitar a criação de conteúdo no aparelho, headsets de realidade virtual. As empresas também ficarão cada vez mais focadas na parte de software, interação do usuário com o aparelho, ou do aparelho com o usuário, ampliando a interatividade, e é claro a parte dos serviços, alguns “extras” para o usuário, que seriam exclusivos naquele modelo. 

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A parte health também é muito forte, hoje em dia os smartphone topo de linha medem o batimento cardíaco, estipula uma meta diária de exercícios, enfim, isso é um serviço que você está dando ao usuário, e isso pode ser visto pelo consumidor como um critério de desempate na hora de escolher o produto.

No caso do Brasil, o problema nisso, é que o aparelho já é caro, e acrescentando o preço do acessório, o aparelho fica ainda mais caro. Então esse é um ponto que precisa ser desenvolvido, para que os preços possam cair e que essas tecnologias se popularizem, para que isso não seja só um nicho em nosso país. 

Em termos de hardware, a faixa que está apresentando maior mudança, são os aparelhos intermediários. Hoje quase todos os aparelhos já estão vindo com 16 GB de memória interna, claro, que continuarão sendo lançados, produtos com menos, mas na grande maioria essa é a média. A questão do sensor de digitais, também está vindo para os aparelhos intermediários, não ficando limitados aos produtos mais premium, essas são algumas tendências. 

Hardware.com.br: Atualmente o consumidor intermediário se acostumou a sentir um pouco o que acontece no mercado premium, já que a construção dos intermediários é melhor, e recursos que só estavam nos aparelhos mais caros estão agora presentes nos intermediários, então o consumidor está passando por essa transição de conhecer um pouco mais o que acontece em uma categoria acima, certo?

Leonardo Munin: Com certeza, faz total sentido. No mercado geral, as tendências são essas, acessórios crescendo, agora em nichos específicos, como os intermediários, está acontecendo essa maior popularização dos 16 GB de memória interna, e também com 32 GB, o sensor de digitais e um número maior de modelos com telas de 5.2, 5.5, 5.7 polegadas.

Hardware.com.br: Esse ano a IDC diz que no Brasil acontecerá uma grande reposição de celulares, cerca de 21% da população deve migrar de um telefone celular convencional para um smartphone. Das três faixas de mercado (entrada, intermediário e premium), os intermediários são os que receberão um maior número de consumidores nesse ano?

Leonardo Munin: A gente considera como intermediário de uns R$ 700 até R$ 1.999, mas sendo mais seleto, podemos classificar de R$ 1.000 a R$ 2.000. Em 2015 dos 46.9 milhões de smartphones vendidos no Brasil somente 20% representavam os modelos acima dos R$ 1.000. Em 2016, dos 43.5 milhões de smartphones vendidos, 36% foram dessa faixa acima dos R$ 1.000, isso já mostra que nessa segunda compra o consumidor busca um aparelho melhor, e que é mais caro. E essa tendência deverá continuar em 2017.

O usuário que já teve esse primeiro contato com smartphone, que ele comprou lá em 2014, a bateria acaba, a tela é pequena, ele talvez não consiga rodar os jogos que ele gostaria ou a experiência dele está ruim, então ele se pré-dispõe a gastar um pouco mais nessa próxima compra, justamente porque ele vê valor agregado, ele vê que ele usa o aparelho constantemente, e que o smartphone está realmente se tornando o computador de bolso.

Olhando a base instalada de smartphones no Brasil, a gente vê que há muitos usuários com smartphones antigos, com um ciclo de vida que está passando de 2 anos de vida, que é o ciclo médio que a gente dá para os aparelhos no Brasil. Claro que se você comprar um produto mais top ficará com ele por mais tempo, e se ele for mais barato, esse tempo diminui um pouco, mas a média são 2 anos. Então há no Brasil ainda muitos aparelhos comprados em 2014 que ainda está ativo, e pegando como base esse ciclo médio dos dois anos, fica bem claro pra gente que haverá uma taxa bem alta de reposição em 2017. E nessa questão da reposição, de quem já tem um smartphone e está trocando por um outro, acreditamos que haverá novamente nessa faixa de modelos acima de R$ 1.000.

A previsão é que esse ano o mercado brasileiro cresça cerca de 3% em 2017, podendo chegar a quase 45 milhões de smartphones vendidos.

Hardware.com.br: Qual a sua opinião em relação a retomada da BlackBerry e da Nokia ao mercado? Elas que agora voltam no esquema de licenciar a marca para que outras empresas tomem a responsabilidade na produção (TLC no caso da BlackBerry e HDM Global no caso da Nokia). No caso da Nokia, além de novos smartphones, a companhia está apostando na volta do clássico 3310 e a BlackBerry voltou com Keyone, um smartphone que une o touch com o teclado físico. 

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Leonardo Munin: A Nokia ainda tem uma perspectiva de marca muito grande, quando a gente pergunta para os consumidores sobre que marcas eles irão considerar numa próxima compra, é incrível como a Nokia continua sendo citada, mesmo sem ter lançado um aparelho nos últimos anos, ainda assim eles têm um percentual de resposta muito grandes dos nossos entrevistados aqui no Brasil. Os produtos que eles lançaram não têm nada de tão diferente mas os preços lá foram são muito bons, e falando de Brasil, o preço é muito determinante para que se tenha sucesso.

No caso da Blackberry as coisas são um pouco diferentes, por mais que agora eles estejam utilizando Android, pra mim eles continuam sendo a melhor opção para quem quer teclado físico, que é muito segmentado. Então pra quem está pensando em um teclado físico no aparelho seja uma boa alternativa, mas não é mais tendência smartphone com teclado QWERTY. Você utilizando o teclado tem que cortar uma parte da tela. Esse novo aparelho deles conta com uma tela de 4,5 polegadas, foi a única marca que vi na MWC 2017 lançado um modelo com uma tela menor que 5 polegadas. Hoje em dia a tela é um grande fator de compra, então pelo Keyone ter uma tela menor isso torna o aparelho bem de nicho. Entre as duas, a Nokia tem mais chance de retomar a força no mercado

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Hardware.com.br: Como anda o mercado de features phones no Brasil?

Leonardo Munin: É importante pontuar duas coisas sobre o mercado de feature phones. O feature phone representou 11% do volume total de vendas de aparelhos, em unidades, o que numa primeira avalicação pode ser algo até muito representativo. Mas quando olhamos em valor os features phones não representaram nem 2% do mercado em receita. Foi uma surpresa pra gente esse crescimento de features phones no Brasil no ano passado, já que não vemos isso acontecendo em nenhuma lugar do mundo, porque é um mercado que apresentou quedas bem grandes. Esse crescimento é bem exclusivo do Brasil. 

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Para o fabricante o investimento nesses produtos não é tão importante, já que representa uma receita pequena. Talvez para marcas pequenas seja interessante, agora para as empresas grandes, não é esse o caminho para rentabilizar o negócio. 

O crescimento de feature phone no Brasil se dá por alguns fatores, como o problema de cobertura de sinal, em que regiões ainda carecem de 3G e 4G, então a pessoa ainda não se sente na obrigação de comprar um smartphone. Cidades pequenas que o 2G ainda domina, há um alto consumo de feature phone. O segundo ponto é o cenário de crise no país, sem ligar o usuário não fica, então como o bolso apertou, algumas pessoas compraram um feaute phone, numa medida temporária.

Também tem a questão dos usuários que realmente demoram a migrar de tecnologia, até o mercado de features phones tem nichos, há modelos destinados a terceira idade com algumas alterações no visor para facilitar a leitura. Então nesse caso os aparelhos acabam sendo bem aceitos.

O mercado de feature phones no Brasil também cresceu porque em 2015 houve uma falta muito grande de aparelhos, o panorama era um mercado muito desabastecido, e então teve uma grande varejista que pediu para os fabricantes feature phones, e todos os fabricantes acabaram trazendo esses aparelhos ao mesmo tempo, na hora que esse varejista foi comprar, ele não comprou de todo mundo, e isso desencadeou uma guerra de preços, então um feature phone que o preço médio é R$ 119, R$ 129, R$ 139, hoje em dia pode ser encontrado por R$99, R$ 89, R$ 79. Então o mercado teve esse crescimento por esse fator específico. Então em 2017 muitas marcas vão descontinuar feature phones, já que a receita é pequena.

Hardware.com.br: É muito díficil para um fabricante tentar implementar no Brasil modos alternativos de vender aparelhos? Podemos pegar como base a Xiaomi que chegou por aqui com um hype enorme e a príncipio focou em um modelo negócios similar ao praticado na China, que é vender os produtos em seu site e em momentos específicos. Quando eles resolveram abrir esse leque de operações foi meio tarde, o estrago já estava feito. Como você vê essa questão de aplicar modos diferentes pra venda.

Leonardo Munin: É muito complicado aplicar isso no Brasil, porque temos um varejo com muita representatividade, e quando você tem um canal de vendas com tanta força é difícil você brigar de igual para igual. Caso trabalhe só com vendas online e distribuição você irá se limitar de um jeito ou de outro. O vejo físico com o online representam quase 70% das vendas, então você deixar de lado um desses pontos ou demorar a entrar a missão fica mais difícil.

Voltando até aquela questão da Nokia, eu vejo essa volta com bons olhos, e que pode dar certo aqui no Brasil, mas é essencial que os aparelhos não demorem a chegar por aqui, a previsão é que devem chegar na América Latina no final do segundo semestre. No Brasil por uma série de questões não deve chegar tão cedo assim.

Hardware.com.br: Você acredita que ainda seja possível um novo sistema operacional móvel entrar no mercado e se firmar. Vimos o fracasso da Mozilla, Canonical e Microsoft em tentar ter um sistema realmente participativo. Dados recentes da IDC, isso falando numa questão global, mostram que a quota de mercado do Android em 2017 será de 87%, e em 2021 fechará em 87.3%, então não muda muda muito essa supremacia, e torna bem difícil grandes mudanças e até a entrada de possíveis aspirantes. 

Leonardo Munin: Não dá pra cravar, mais é muito díficil esperar alguma mudança nesse sentido. O cara que usa Apple dificilmente troca de ecossistema, porque geralmente ele também tem Mac, iPad, ele já está fixo em uma plataforma. E no caso do Android a quantidade de usuários que eles têm na América Latina é ainda mais representativa. Dos 142 milhões de aparelhos vendidos nessa região, 94% rodam Android. Além disso o Android vem melhorando em pontos que antes eram mais fracos, como a segurança, então há um grande investimento para “bloquear” a entrada de concorrentes.

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Hardware.com.br: Hoje em dia tirando a Apple, é difícil no Brasil uma marca de smartphones se manter se não focar em várias faixas de mercado? E quando se trabalha com produtos importados complica ainda mais as coisas, certo?

Leonardo Munin: Cada país tem sua peculiaridade, no Brasil você trabalhar com produto importado torna o seu negócio bem complicado, temos muita flutuação cambial, então quando o produto é importado qualquer alteração no câmbio pode ajudar como atrapalhar. Atuar em um nicho não quer dizer que você não se manterá vivo, mas terá que haver um grande esforço para uma operação bem estruturada, marketing, produção local

Hardware.com.br: Como em 2017 o Brasil irá passar por esse período de transição de muitas pessoas trocando de aparelho, que dicas você daria para esse pessoal. O melhor momento para a compra é realmente durante a Black Friday?

Leonardo Munin: O uso do smartphone vai muito de acordo com o seu uso, talvez um aparelho hoje de R$ 800 satisfaça suas necessidades, ou se você é aquele usuário mais exigente, que dá importância para um melhor rendimento em games e fotografia você irá querer comprar um aparelho melhor. Então cada um deve tentar entender e fazer sua relação custo x benefício, fazer comparativo das especificações, tentar entender cada um dessas especificações, porque nem sempre uma câmera com mais megapixels é melhor do que com que tem menos, já que além do sensor, há a questão do software embarcado, entre outros pontos. 

A Black Friday se tornou a principal data para os usuárários que desejem trocar de aparelho, e como as pessoas estão pretendendo gastar mais com a compra de um novo modelo, eles estão esperando justamente essa época do ano porque os descontos são mais representativos.

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Editor-chefe no Hardware.com.br, aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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