In defense of Ubuntu
Autor original: Jonathan Corbet
Publicado originalmente no: http://lwn.net/
Tradução: Roberto Bechtlufft
Não é difícil encontrar críticas ao Ubuntu e à Canonical, a corporação que o patrocina. Dependendo de quem faz a crítica, o Ubuntu e a Canonical são culpados por lucrar às custas da comunidade do software livre sem dar nada em troca, por causar forks em projetos e distribuições importantes, por legitimar o uso de componentes de sistema que só estão disponíveis em forma binária e muito mais. De todas as queixas, a que mais se ouve é a que fala sobre “contribuir com a comunidade”. Se formos acreditar nessas queixas, o Ubuntu é uma operação parasítica que não entende como a comunidade funciona e que é prejudicial à comunidade como um todo.
Este editor gostaria de sugerir que tais acusações são um tanto exageradas. O Ubuntu está longe de ser perfeito, e com certeza poderia dar mais em troca do que vem dando, mas o Ubuntu não merece críticas tão pesadas quanto as que vem recebendo de certos setores da comunidade.
O interessante é que os distribuidores parecem ter um lugar especial no setor de críticas. A Red Hat, pelo que dizem, só visa os lucros, e no passado, empurrou goela abaixo de seus usuários, sofredores de longa data, uma quantidade excessiva de programas com tecnologia de ponta. O Fedora é acusado de não ser suficientemente livre, usar software recente demais, e de se recusar a tornar mais prática e automática a reprodução de vídeos em flash. A Novell/SUSE fez um pacto com o demônio. O Debian, dizem, é ao mesmo tempo caótico e burocrático demais, e nunca lança uma nova versão na data combinada. Há quem diga que a comunidade do Gentoo não funciona direito e que é composta por gente que não tem o que fazer. E o Ubuntu é acusado de afanar o trabalho dos outros e não dar nada em troca, ou sequer dar crédito à comunidade da qual obtém seus programas.
Não é de se estranhar que os distribuidores sejam especialmente agraciados por esse tipo de crítica. A maioria dos usuários de software livre nunca lida diretamente com os projetos upstream, que criam os softwares que eles usam. Ao invés disso, contam apenas com um único intermediário: o distribuidor. Com isso, o distribuidor tem muita influência sobre o tipo de experiência do usuário. Quando as coisas não vão bem, o primeiro a ser acusado, obviamente, é o desenvolvedor. Muitos têm suas próprias opiniões sobre o distribuidor, mas sabem pouco sobre os projetos que realmente desenvolvem os programas.
Dessa maneira, boa parte das críticas ao Ubuntu vem da comunidade de desenvolvedores, que tem uma visão mais detalhada do ecossistema. Vale à pena pensar no motivo disso. Mesmo que o Ubuntu não contribua tanto quanto o esperado, certamente ele contribui com alguma coisa. Há desenvolvedores do Ubuntu que são desenvolvedores do Debian, do X.org, do GNOME e por aí vai. Se pudermos confiar nesta página, os desenvolvedores do Ubuntu tambêm contribuem com o HURD. Desculpem, mas a página não explica o porquê.
Os desenvolvedores que massacram o Ubuntu mantêm-se em silêncio quanto ao número de patches submetidos ao kernel pela turma do Mandriva. Não têm nada a dizer sobre a retribuição do Xandros ao Debian. Ninguém faz um somatório das contribuições do Gentoo. Não parecem haver reclamações sobre a presença do Slackware na comunidade. Os desenvolvedores do Arch Linux não ouvem críticas por não estarem fazendo o suficiente. Não há artigos de alto nível sobre como a rPath está se aproveitando dos desenvolvedores de software livre. E ainda assim, as contribuições do Ubuntu provavelmente ultrapassam as de todas as distribuições mencionadas, com a possível (mas bastante incerta) exceção do Gentoo. Pelo visto, o Ubuntu é julgado sob padrões mais elevados por seus críticos.
Um dos motivos para o tratamento especial recebido pelo Ubuntu certamente vem da sua aura de moleque descolado que pintou no pedaço de uma hora para outra. Um sucesso tão súbito pode gerar uma boa dose de animosidade, especialmente quando se tem a impressão de que boa parte desse sucesso se deve ao trabalho de terceiros. É raro o fórum ou lista de discussão de uma distribuição que não receba as ocasionais mensagens de “estou de saco cheio da sua distribuição, vou mudar para o Ubuntu”; com o tempo, isso vai cansando. E quando uma coisa se torna cansativa e irritante, é tentador reagir de forma explosiva.
Mas o verdadeiro motivo deve estar em outro lugar: o próprio Ubuntu contribuiu para ser analisado sob um padrão mais alto.Ele foi colocado como uma distribuição fortemente voltada para a comunidade, com a missão de salvar o mundo pelo software livre. As distribuições derivadas do Debian que não fazem muita propaganda de suas comunidades (como o Xandros, por exemplo) são menos atacadas por sua falta de participação na comunidade. Ninguém espera nada deles, por isso ninguém reclama. Mas as pessoas esperam algo diferente do Ubuntu; supõe-se que ele seja parte da comunidade. É por isso que quando o Ubuntu não contribui com patches ao upstream ou quando mantém forks de componentes de software importantes, ou quando ferramentas como o Launchpad continuam sendo proprietárias, que fica a sensação de promessa não cumprida.
Não há dúvidas de que o Ubuntu pode fazer melhor do que isso. Mas não podemos esquecer do que o Ubuntu já fez. O Ubuntu criou uma distribuição que atrai uma classe totalmente diferente de usuários Linux. O fato de que boa parte do trabalho veio de outro lugar não muda o fato de que o Ubuntu mostrou o quão amigável e fácil de usar um Linux pode ser. E no processo, isso fez com que o Debian se tornasse adequado a um grupo maior de usuários. O Ubuntu mostrou que uma distribuição baseada no Debian pode lançar versões estáveis regularmente, e ainda assim incluir programas atuais. O Ubuntu cumpriu a promessa de oferecer suporte, contando com um suporte de alta qualidade na área de segurança. E tudo isso se passou de uma maneira que, segundo dizem, algum dia deve se tornar comercialmente viável.
Além de tudo isso, o Ubuntu emprega vários desenvolvedores que trabalham na comunidade. Sim, seria bom que houvessem mais desses desenvolvedores. Também seria bom se mais correções e melhorias escapassem dos repositórios do Ubuntu e chegassem ao upstream. Encorajar o Ubuntu a fazê-lo deve contribuir para que isso aconteça. Mas, ao encorajarmos o Ubuntu a fazer jus ao seu objetivo ambicioso de ser um membro pleno de nossa comunidade, não devemos perder a perspectiva. Não há dúvidas de que a existência do Ubuntu tem sido enriquecedora para todos nós.
Créditos a Jonathan Corbet – http://lwn.net/
Tradução por Roberto Bechtlufft <robertobech at gmail.com>
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