Debian adopts time-based releases — somebody check the temperature in hell
Autor original: Ryan Cartwright
Publicado originalmente no: freesoftwaremagazine.com
Tradução: Roberto Bechtlufft
Talvez você já tenha lido que o projeto Debian (minha distribuição GNU/Linux favorita) optou por um cronograma fixo para o lançamento de suas próximas versões. Isso surpreendeu a muita gente, o que provavelmente inclui alguns desenvolvedores do Debian, em particular devido à política do projeto de “lançar quando estiver pronto”, que já vem de longa data. Afinal, o que levou a essa mudança? E será que a ideia é boa?
Em defesa do “lançar quando estiver pronto”
A defesa da política de “lançar quando estiver pronto” tem argumentos legítimos. Com essa política, você pode garantir que o software que está lançando é estável mesmo (ao menos na sua opinião), e que conta com os recursos que você disse que contaria. Lançamentos agendados pressionam os desenvolvedores, e podem fazer com que pacotes não tão estáveis sejam incluídos, ou com que pacotes mais recentes simplesmente fiquem de fora. Tradicionalmente, o Debian vem evitando colocar essa pressão sobre os mantenedores e desenvolvedores de pacotes, e como resultado disso ele se tornou uma das distribuições favoritas de sysadmins de todo o mundo.
Mas é fato que o Debian já foi bastante criticado pelo tempo que separa suas versões estáveis. Alguns pacotes chave às vezes aparecem atrasados uma ou duas versões no Debian stable, em comparação ao que encontramos em outras distribuições GNU/Linux. Isso se aplica particularmente na arena dos desktops GNU/Linux. Na verdade, pode-se dizer que um dos chamarizes do Ubuntu foi ter congelado o Debian unstable e criado uma versão estável com mais regularidade do que o Debian faz com sua versão testing. Mas a legitimidade do rótulo de “estável” no Ubuntu já foi questionada antes, e é verdade que as versões estáveis do Debian costumam permanecer estáveis de forma mais confiável do que as versões do Ubuntu. Essa estabilidade é até usada para propagandear a distro. O FAQ inclui esta declaração:
Pode-se dizer com segurança que os pacotes não possuem bugs graves conhecidos, nem brechas de segurança etc. Os pacotes do stable (a versão estável) se integram perfeitamente aos outros pacotes estáveis. Essas características são muito importantes em servidores de produção que precisam funcionar 24 horas por dia, sete dias por semana.
e
Como se pode ver, a estabilidade e a inovação estão em pontas opostas do espectro. Se você precisa de estabilidade: instale a distribuição estável.
Os negritos são meus.
Por que mudar agora?
E por que o Debian mudou de política agora? O anúncio oficial diz:
Os “congelamentos” periódicos vão permitir ao Projeto Debian unir a previsibilidade dos lançamentos com data marcada à bem estabelecida política de lançamentos baseados nos recursos. A nova política de congelamento vai oferecer maior previsibilidade quanto ao lançamento de novas versões aos usuários do Debian, e também vai possibilitar aos seus desenvolvedores um melhor planejamento de longo prazo. Um ciclo de lançamentos de dois anos dará mais tempo para a realização de mudanças que possam causar confusão, reduzindo os inconvenientes causados aos usuários. Esses congelamentos previsíveis também devem reduzir o tempo médio dos congelamentos.
Mas espere aí, quais usuários estão reclamando dessas inconveniências? A maioria dos usuários do Debian que eu conheço não é mais adolescente e é meio reacionária. Não é por acaso que o cão pastor da tirinha “Bizarre Cathedral“, publicada na Free Software Magazine, usa uma camisa do Debian. A maioria desses usuários gosta do fato do Debian ser lançado apenas quando está pronto. A versão estável do Debian sempre foi exatamente isso – estável.
E quanto aos lançamentos baseados em recursos: o Debian só anunciou datas para congelamentos, e não para lançamentos. O código sempre será congelado em Dezembro. Mas segundo o anúncio oficial, a versão final será lançada no primeiro semestre do ano seguinte. Ainda que isso ofereça alguma possibilidade de adiamento da versão final, não há um escopo muito grande. O que eu gostaria de saber é como eles pretendem unir com êxito os lançamentos agendados e os baseados em recursos. A impressão que eu tenho é que um dos dois vai acabar prevalecendo, e geralmente as datas fixas ganham dos recursos.
Já sentiu vergonha do seu pai?
A decisão parece ter sido motivada em algum grau pelo Ubuntu. Conversei sobre o assunto com um amigo que é usuário de longa data do Debian, e ele descreveu a decisão desta forma: o Ubuntu, que é o filho, está forçando o papai Debian a dançar umas músicas mais modernas. Nós já vimos (ou já fomos) pais que tentam dançar com seus filhos, e eles sempre parecem meio ridículos.
Eu não consigo entender qual é a necessidade de se fazer essa mudança. Parece até que não há outras distribuições baseadas no Debian com ciclos de lançamento menores. Se é isso o que os usuários querem, por que não ficam com essas distros? Vai ser interessante ver se o Ubuntu vai basear suas versões LTS nas versões estáveis agendadas do Debian daqui para a frente, e eu acho que isso pode ter sido parte do motivo dessa decisão.
Menino mau!
Então, caso vocês ainda não tenham sacado, aqui vai o meu veredito: essa foi uma decisão ruim, Debian. O Debian stable tem uma merecida reputação de ser estável. Eles sempre se baseou em recursos e não em datas, e muitos sysadmins e servidores se beneficiaram disso. Agora eu temo que possamos ver um declínio na confiabilidade do Debian stable ou, o que é pior, que passemos a ter aqueles lançamentos confusos que logo são remendados com vários patches de segurança, com os quais os usuários de um certo sistema operacional proprietário estão mais acostumados. É claro que esses patches vão chegar mais rápido e ser mais fáceis de instalar em um sistema Debian. Eu conheço várias pessoas que usam outras distribuições GNU/Linux e quase todas são mais cautelosas do que eu na hora de atualizar para uma versão nova. Eu não estou dizendo que o Fedora, o Ubuntu, o OpenSuSE e afins não contam com lançamentos estáveis, mas atualizar o Debian stable para uma nova versão costuma dar menos dor de cabeça ao sysadmin em questão.
Ao menos era assim que funcionava.
Créditos a Ryan Cartwright – freesoftwaremagazine.com
Tradução por Roberto Bechtlufft <info at bechtranslations.com.br>
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