O Android Dev Phone 1

O Android Dev Phone 1

The Android Dev Phone 1
Autor original: Jonathan Corbet
Publicado originalmente no:
lwn.net
Tradução: Roberto Bechtlufft

Minha pobre esposa pode garantir a vocês que nossa casa está sempre cheia de gadgets. Muitos não chegam a interessá-la, mas apareceu um novo por aqui que atraiu a atenção da casa toda: o Android Dev Phone, também conhecido como a versão totalmente desbloqueada do telefone G1 da T-Mobile. O telefone é mesmo um brinquedo divertido, mas tem potencial para ser bem mais do que isso.

Os detalhes do dispositivo já foram bem divulgados. Ele inclui uma boa tela sensível ao toque, teclado QWERTY, receptor GPS, acelerômetro, câmera de 3,2 megapixels e mais. O aparelho é movido pelo Android, a plataforma baseada em Linux do Google. O Dev Phone é essencialmente o mesmo dispositivo vendido pela T-Mobile, mas com uma diferença de importância crucial: ele é desbloqueado, em todos os sentidos. Isso quer dizer não apenas que ele pode ser usado com o SIM de qualquer operadora, mas também que o software operacional básico não foi bloqueado. É um telefone no qual o sistema inteiro pode ser reconstruído e substituído à vontade.

O Dev Phone vem unir-se ao OpenMoko Neo Freerunner na brevíssima lista de dispositivos móveis verdadeiramente abertos. Mas esse dispositivo tem a vantagem de ser um produto um pouco mais bem acabado, e que parece ter uma equipe bem forte de desenvolvimento de software. Só para constar, ele tem alguns recursos de hardware interessantes que o Neo não tem: GSM quad-band, 3G (mas não nas freqüências usadas por mim), teclado etc. Eu acredito que ele será um produto bem-sucedido.

Nos próximos meses, pretendo me dedicar a esse dispositivo e relatar o que eu descobrir. O quão aberto ele realmente é? O que é necessário para colocar um kernel novo nele? E para colocar um sistema operacional diferente? De modo geral, como funciona o Android? Presumindo que eu não trave o dispositivo logo nos primeiros dias, eu pretendo ter uma boa noção do que pode ser feito com ele, do quão próximo seu software está daquilo que nós geralmente consideramos como Linux e para onde ele irá no futuro. Vai ser um projeto divertido.

Mas, antes de mais nada, é preciso ir além do estágio da mera brincadeira com o novo dispositivo. Logo, o resto deste artigo será uma espécie de análise em nível de usuário.

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O hardware parece confiável. O dispositivo é maior e mais pesado que os portáteis que usei no passado, mas eu esperava por isso. O teclado funciona melhor do que se espera dado o tamanho; mesmo eu, que tenho dedos meio gordinhos, consigo digitar com velocidade e precisão razoáveis. O telefone tem vibração um pouco fraca. A câmera parece tirar boas fotos (para uma câmera de celular), mas é lenta demais. Como acontece com a maioria dos dispositivos de tela colorida, não dá para ler nada quando a luz de fundo se apaga. Uma coisa legal nesse telefone é um LED indicador que pisca quando o telefone tem algum aviso a dar (como mensagens de texto não lidas), mas o uso do LED parece ser um pouco inconsistente.

Ainda não tenho dimensão do tempo de duração da bateria sem que as crianças passem o dia todo brincando com o dispositivo. Tem gente reclamando da duração da bateria na internet, mas parece que o telefone agüenta dois ou três dias de uso moderado se o receptor GPS ficar desligado na maior parte do tempo. Por outro lado, se você deixar seus filhos ficarem brincando em sites de vídeos, a bateria vai embora relativamente rápido.

Quanto ao software, as coisas já começam meio turbulentas. Primeiro ele exige que o usuário configure o telefone para acessar o serviço de dados da operadora. O processo deve ser feito manualmente se a operadora não for a T-Mobile. O último telefone que eu comprei reconheceu a operadora do SIM e lidou com tudo automaticamente. Porém, ainda mais irritante é que o telefone exige a criação de uma conta no Gmail como parte do processo de configuração. O fato de alguém não ter (e nem querer ter) uma conta no Gmail é irrelevante. Agora eu tenho uma entrada no banco de dados de contas do Gmail que nunca será usada.

Isso, obviamente, condiz com os motivos do Google para ter se envolvido nessa empreitada. Há vários recursos da plataforma Android desenvolvidos para amarrar o cliente aos serviços oferecidos pelo Google. Alguns recursos, como o calendário, são apenas uma extensão do que é oferecido online. O telefone tenta sincronizar a lista de contatos que está… em algum lugar… e desativar esse recurso traz resultados desagradáveis. É possível usar vários recursos do dispositivo sem contatar a nave-mãe do Google, mas esse não é o modo de operação natural do telefone.

Outro exemplo é o gerenciamento do email. Há um ícone separado para o Gmail que simplesmente funciona; o aplicativo oferece recursos (como o agrupamento de mensagens por assunto) que o serviço online também oferece. É possível rodar um aplicativo de email diferente para se conectar a uma outra conta POP ou IMAP, mas isso envolve um processo de configuração em separado. Com um pouco de sorte, o usuário acaba descobrindo o cliente K9, que deve ser instalado separadamente e conduz o usuário novamente pelo processo de configuração. Mesmo com o K9, o cliente de email para contas que não sejam do Gmail não é o que deveria ser. Não há agrupamento de mensagens por assunto, faltam comandos básicos como mover mensagens para outras pastas etc. Ele também tem pequenos problemas, como a recusa em se conectar a um servidor caso ache que não pode confiar no certificado SSL e a impossibilidade de fazer login se a senha contiver caracteres especiais. Presume-se que esse cliente vai melhorar, ou que outros clientes serão adaptados para a plataforma, mas no momento essa não parece ser uma prioridade dos desenvolvedores do Android.

Porém, de modo geral, o software do Android é bem refinado. A interação com esse tipo de dispositivo foi muito bem pensada. Depois que você se acostuma com algumas poucas diferenças (manter o dedo sobre um item na tela por alguns segundos geralmente abre um menu de opções, por exemplo), a navegação pelos aplicativos se dá naturalmente. Só em alguns casos surgem inconsistências, como as diferenças na operação do zoom entre diferentes aplicativos. Como um todo, a interface é bem-acabada e atraente.

Ainda assim, o uso da tela pode melhorar. Em telas pequenas sempre haverá uma certa tensão quanto à quantidade de informações exibida, que deve ser suficiente sem dar dor nos olhos de ninguém. Alguns usuários lidam melhor com fontes pequenas do que outros. Não sei se o Android oferece a opção de configurar o tamanho das fontes, mas eu não achei. Com isso, tenho que dar zoom manualmente em quase todas as páginas que visito, e em quase todos os emails que leio para que as informações sejam exibidas na tela de maneira razoável. Isso logo se torna cansativo.

O “Android Market” (mercado do Android) oferece vários aplicativos, a maioria dos quais é software livre ou, pelo menos, gratuito. Ao navegar entre os aplicativos, você vai conhecer o modelo de segurança do Android, baseado em um longo conjunto de recursos que podem ser concedidos aos aplicativos. Um programa que precise acessar a internet, obter dados de localização, alterar configurações de hardware e afins precisa declarar os recursos de que vai precisar; esses recursos são apresentados ao usuário na hora da instalação. A maioria dos usuários vai sair logo dizendo “sim”, mas vale a pena dar uma olhada mais atenta. Eu desisti de instalar um jogo de Mahjongg porque não consegui entender porque ele precisava de acesso total à rede.

Além dos joguinhos inevitáveis (dentre eles, uma das piores implementações de Tetris dos últimos tempos), há uma boa variedade de aplicativos disponíveis. A ferramenta “Locale” preenche o espaço deixado pela surpreendente ausência do recurso de “perfil” encontrado em quase todos os celulares que eu já vi; ele faz coisas como usar o receptor GPS para alterar os perfis automaticamente quando você entra em um cinema ou teatro. O aplicativo “bubble” (à esquerda) transforma o celular em um nível (aquele instrumento que verifica a inclinação de superfícies). Há até ferramentas para economizar nas compras, capazes de ler códigos de barra com a câmera e pesquisar preços. Há um “gerenciador de energia” que tenta configurar o dispositivo para uso otimizado da energia em diversas situações; ele também oferece uma funcionalidade básica de perfis, mas é bom o usuário ir se preparando para perder algum tempo configurando as opções. Há muitos aplicativos para viagens, que informam a previsão do tempo, as taxas de conversão de moedas e até que chamam táxis.

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Uma ausência notável é a funcionalidade de voz sobre IP. O celular deveria ser capaz de lidar muito bem com VoIP, mas esse recurso quase não existe. Parece haver uma ferramenta para usuários do Skype, mas é só.

Há uns poucos aplicativos que me interessaram. O ConnectBot é um cliente SSH que funciona surpreendentemente bem; está claro que os desenvolvedores estão trabalhando em uma ferramenta para acesso a sistemas Linux e derivados. E o emulador de terminal oferece ao dispositivo aquele recurso importantíssimo: um prompt de comandos. O mais divertido é que um simples “su“, sem senha, dá acesso root pelo shell.

Brincando com o dispositivo, vi que o processador ARM oferece poderosos 383 bogomips. O celular parece ter pouco mais de 100 MB de memória para o uso, e roda um kernel 2.6.25 (com muitas modificações, pelo que se diz) que carrega um único módulo, o “wlan”. E por aí vai. Por mais útil que o teclado seja, usá-lo para digitar comandos em um terminal que não possui mecanismo de histórico cansa. Hora de procurar por um servidor SSH.

Há outros aplicativos úteis, é claro, como o que faz as ligações. Como os outros, ele não é perfeito, mas presume-se que em uma plataforma movida a software livre esses aplicativos imperfeitos sejam melhorados ou substituídos. Se isso vai ser fácil ou difícil é o que eu pretendo descobrir nos próximos meses. Não perca.

Créditos a Jonathan Corbetlwn.net
Tradução por Roberto Bechtlufft <roberto at bechtranslations.com>

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