Alan Turing: relembre a trajetória desse visionário que dá nome à nova arquitetura da NVIDIA

Alan Turing: relembre a trajetória desse visionário que dá nome à nova arquitetura da NVIDIA

Ontem (20) a NVIDIA apresentou as suas novas placas de vídeo para o público gamer (RTX 2080 Ti, RTX 2080 e RTX 2070), que, assim como as Quadro RTX, que foram anunciadas no dia 14, são baseadas em uma nova arquitetura, que vem sendo desenvolvida há 10 anos. Batizada de Turing em homenagem a uma personalidade importantíssima para a humanidade: Alan Turing.

Alan Mathison Turing foi um grande matemático, filósofo e criptógrafo que nasceu em 23 de Junho de 1912, em Maida Vale um bairro residencial a oeste de Londres. Assim como outros tantos na história acabou sucumbindo a imbecilidade humana, já que como o escritor e professor israelense Yuval Noah Harari costuma dizer em suas palestras : “A estupidez humana é uma das forças mais poderosas que moldam a história”.

Turing foi condenado a castração química 1952 por ser homossexual (configurado como crime no Reino Unido até 1967.). Na época ele se relacionava com Arnold Murray, um jovem de 19 anos. O matemático foi encontrado morto em sua casa, na cidade de Wilmslow, dois anos depois (7 de junho de 1954). A causa da morte foi envenenamento por cianeto. Ele ter mordeu uma maça (era um grande fã da animação Branca de Neve e os Sete Anões) mergulhada nessa substância que foi encontrada na mesa ao lado da cama.

Alan Turing

Em apenas 41 ano de vida Turing cravou seu nome para sempre na história da computação moderna, contribuindo para moldar o que conhecemos hoje como algoritmos e inteligência artificial.

O sempre introspectivo Alan Turing desde os 16 anos já estava acostumado a pensar “fora da caixa”, e foi no internato Sherborne, que o jovem percebeu que era homossexual, vivendo uma intensa paixão com Christopher Morcom, com quem estudava matemática e discutia filosofia. A morte repentina de Morcom em 1930, aos 18 anos, por tuberculose, foi um grande baque para Turing, que chegou a declarar: “Eu simplesmente adorava o chão que ele pisava – algo que nunca tentei disfarçar, lamento dizer”.

Alan Turing e Christopher Morcom

Essa grande perda acabou servindo de incentivo para que Alan Turing continuasse formulando suas ideias, independente se seria ou não compreendido.

A morte de Chris tornou Turing ateu, e um obcecado por entender os processos mentais do ser humano, o que também foi determinante na formulação em 1950, do que hoje ficou conhecido como “Teste de Turing“, cuja intenção era definir um padrão pelo qual se poderia saber se uma máquina poderia ser chamada de inteligente. A ideia era que você pode dizer que um computador “pensa” se um humano não conseguir distinguir através de uma conversa, se você está falando com outro humano ou uma máquina. Isso sem contar o fato que na década de 40 Turing já utilizava o termo inteligência computacional.

Sua primeira contribuição a ficar eternizada na história aconteceu bem antes, em 1936. Turing tinha apenas 24 anos quando desenvolveu um sistema teórico, a “Máquina Lógica de Computação” que passou a ser conhecida como “Máquina de Turing“, Esse modo abstrato de formular a computação consistia em uma quantidade ilimitada de fitas de papel contendo símbolos dentro de quadrado, esses símbolos podiam ser apenas  um 1 e um espaço. A máquina seria capaz de ler os símbolos da fita e de desempenhar certas ações com base em uma tabela de instruções que lhe seria fornecida – uma forma de entender o que hoje conhecemos como algoritmos.

Esse modelo matemático explica o processo moderno da computação que se faz até hoje, em que a máquina desempenha múltiplas funções de leitura e escrita. Em 2012 a Lego materializou essa máquina em um vídeo em homenagem ao legado de Turing, chamando esse conceito desenvolvido na década de 30 como o“pai de todos os computadores”.

Um dos grandes desafios de Turing foi aprender a trabalhar em equipe, já que ele tinha realmente uma tendência à solidão, e o fato de ser homossexual fazia com que ele se sentisse um estranho no mundo. Turing nunca quis se envolver com política, porém seu excelente trabalho acabou criando uma relação mais próxima entre ele e seu país durante a Segunda Guerra Mundial.

Em segredo, Turing começou a trabalhar no departamento britânico de criptoanálise. O governo deu o braço a torcer, e resolveu recorrer as ideias de Turing que era computar as possibilidades de configuração do Enigma, de forma automatizada.

Em 1939, no primeiro ano da Segunda Guerra Mundial, que perdurou até 1945, ele começou a se dedicar exclusivamente ao desbloqueio do Enigma, sendo parte fundamental do grupo em Bletchley Park, equipe dedicada a descobrir o funcionamento da engenhoca do lunático Hitler.

Bletchley Park

Enigma era era uma máquina de rotor eletromecânico desenvolvida por um engenheiro alemão em 1918, usada para enviar mensagens criptografadas pela Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial.

Turing conseguiu quebrar a criptografia da máquina, com base no trabalho do do matemático polonês Marian Rejewski, que havia liderado o desenvolvimento da “bomba”, um decodificador mecânico, e da própria iniciativa dos agentes poloneses que conseguiram se infiltrar em uma fábrica e ter acesso a uma versão aprimorada do Enigma que estava sendo desenvolvida. Com base no design polonês, Turing batizou sua máquina de ‘bombe” (Victoria’ pelos britânicos), que entrou em ação em 1940.

A história sobre o processo de desvendar o Enigma é remontado na cinebiografia de Alan Turing, o “Jogo da Imitação (2015, Warner Bros), que tem Benedict Cumberbatch no papel principal.

Análises mostram que com a “Bombe’ foi possível refinar as estratégias de guerra, determinantes para salvar 14 milhões de vidas. O primeiro ministro britânico na época,  Winston Churchill, chegou a afirmar que Turing realizou a principal contribuição individual para a vitória dos aliados.

A pesquisa de Turing também serviu para que Tommy Flores e Dollis Hill, outros dois membros de Bletchley Park, construíssem outra máquina, Colossus Mark, que teve sua primeira versão lançada em dezembro de 1943. Seu principal objetivo descriptografar os códigos utilizados pelos nazistas, criados com a máquina Lorenz SZ. Uma segunda versão (Mark II), foi lançada em 1944. Ele também é creditado por estar envolvido na criação do primeiro computador com algo que nos remete a memória RAM nos dias de hoje, o Manchester Mark I.

No entanto, Alan Turing era um visionário preso em um tempo com um conceito que, em grau diferente, perdura até hoje que é o preconceito contra a opção sexual. A própria personalidade de Turing o afastou do verdadeiro reconhecimento por seus méritos, que acabaram ganhando a devida relevância muitos anos depois.

Pilot ACE, primeiro computador projetado no Reino Unido. Mais uma obra com envolvimento de Alan Turing, em 1946 / Crédito da imagem: Guide to Computing

 

Desde 1966 Prêmio Alan Turing é concedido anualmente pela Association for Computing Machinery. Este prêmio é a maior honra no mundo da computação. Entre os vencedores está Tim Bernerss Lee, que criou o conceito da web.

O pedido de desculpas do governo britânico veio ainda mais tarde. Em 2013, após 59 anos da morte de Turing, a rainha Elizabeth II, ofereceu o perdão real. “Turing merece ser lembrado e reconhecido pela sua fantástica contribuição aos esforços de guerra e por seu legado à ciência. Um perdão da Rainha é um tributo apropriado a esse homem excepcional”, declarou Chris Grayling, que na época era ministro de justiça. Como acontece em muitos casos o reconhecimento só vem pós-morte!

Essa retratação com Turing também se estendeu para tantos outros injustiçados. No ano passado entrou em vigor a “Lei Turing”, assinada pelo Sam Gyimah, ministro da justiça. Este perdão é uma forma de conceder “indultos formais” aos cerca de 49 mil homens que foram condenados no passado no Reino Unido porque mantinham relações homossexuais consensuais.

A NVIDIA utilizar Turing como nome de sua nova arquitetura é mais uma menção honrosa a uma personalidade com um legado gigantesco.

Aqueles que podem imaginar qualquer coisa, podem criar o impossível – Alan Turing

 

 

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Editor-chefe no Hardware.com.br, aficionado por tecnologias que realmente funcionam. Segue lá no Insta: @plazawilliam Elogios, críticas e sugestões de pauta: william@hardware.com.br
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