Introdução: Os Smartphones

Antigamente, quando você estava em trânsito e precisava falar com alguém, sua melhor opção era procurar algum orelhão e cruzar os dedos para que a pessoa também não estivesse fora de casa ou do escritório. Em função disso, era muito comum que as pessoas mantivessem listas dos telefones onde podiam encontrar os contatos mais importantes (em casa, no escritório, na casa da avó, etc.) e os famosos recadinhos no estilo “se ver fulano, peça para ele me ligar”, eram comuns.

Hoje em dia isso pode parecer um passado muito distante, mas, na verdade, faz menos de dez anos. Duas coisas que mudaram nesse período, e acabaram catalizando todas as outras mudanças que tivemos em matéria de comunicação e relacionamento, são os telefones celulares e a Internet.

A Internet dispensa comentários, já que massificou o acesso à informação e criou todo um novo universo de ferramentas de comunicação e publicação. Antigamente, quando queria saber mais sobre um determinado assunto, você ia a uma biblioteca, ou saía perguntando aos amigos. Hoje em dia, você simplesmente abre o navegador e faz uma busca no Google.

Os celulares tiveram um início mais humilde, servindo apenas como um sistema de telefonia móvel, baseado na transmissão por rádio. O nome “celular” vem da forma como as redes das operadoras são organizadas. Ao invés de uma única e grande estação de transmissão por cidade, são usadas várias estações menores, que dividem a cidade em pequenas áreas, chamadas de células, cada uma com (tipicamente) de 10 a 30 km². O uso de múltiplas estações permite aumentar o número de linhas disponíveis (já que, devido ao limite de freqüências disponíveis, cada estação dispõe de apenas algumas centenas de canais) e, ao mesmo tempo, permite que os aparelhos trabalhem com uma potência de transmissão muito mais baixa, o que aumenta a autonomia das baterias e reduz a emissão de radiação nociva.

A primeira geração de aparelhos utilizava um sistema muito simples, com sinal analógico e um sistema de identificação que podia ser facilmente copiado e reproduzido. Isso acabou levando a um problema crônico de clonagem de aparelhos, que acelerou a adoção do CDMA e do GSM, os sistemas digitais usados atualmente. Além de resolverem o problema da clonagem, eles possibilitaram a transmissão de dados baseada em pacotes, o que abriu as portas para o acesso móvel à web. Os celulares deixaram de ser apenas telefones portáteis para começarem o longo processo evolutivo, até se tornarem smartphones.

Conforme foram evoluindo, os celulares passaram a incorporar as funções de cada vez mais dispositivos, tornando-se progressivamente mais importantes. Mesmo os aparelhos mais básicos vendidos atualmente utilizam muitas vezes processadores ARM de 300 a 400 MHz e 64 MB ou mais de memória RAM (sem contar a memória Flash, usada para armazenamento). Ou seja, possuem um poder de processamento superior ao de muitos PCs do final da década de 1990. Com tanto poder de fogo disponível, não é de se estranhar que eles tenham passado a assimilar as funções de outros dispositivos, assim como no caso dos PCs.

As primeiras vítimas foram as agendas eletrônicas (lembra delas?), que foram incorporadas aos celulares na forma das funções para armazenar telefones e contatos. As vítimas seguintes foram os PDAs e os Palms, que, ao serem incorporados, deram origem aos smartphones que usamos atualmente, que incluem agenda de compromissos, visualizadores de documentos e outras funções que invadiram até mesmo os modelos mais simples.

Além da questão da integração, os celulares dispõem de uma arma importante, que é o fato de, ao contrário dos palmtops, possuírem conexão com a web. Isso permite que eles ofereçam também navegadores, clientes de e-mail e IM e assim por diante. Os palmtops, que eram tão populares há apenas 3 ou 4 anos, literalmente desapareceram devido à falta de demanda.

As próximas a serem incorporadas foram as câmeras digitais. De uma forma geral, as câmeras integradas aos celulares deixam muito a desejar com relação à qualidade de imagem, devido, sobretudo, à baixa qualidade dos sensores e das lentes usadas, que são justamente os componentes mais caros e importantes em qualquer câmera digital. Lentes baratas, combinadas com sensores de baixa qualidade resultam em imagens lavadas, mesmo que a resolução seja boa. Isso explica por que mesmo aparelhos com câmeras de 3 ou 5 megapixels deixam a desejar em muitas áreas.

Apesar disso, as câmeras integradas atendem bem ao público que quer apenas tirar fotos casualmente e filmar vídeos curtos em baixa resolução, sem precisar carregar uma câmera separada o tempo todo. Com as redes 3G, os celulares passaram a incorporar também uma pequena câmera frontal, de baixa resolução, destinada a fazer chamadas de vídeo conferência.

Outra vítima, um pouco mais recente, é o mp3player, que também foi impiedosamente incorporado aos celulares. Nada mais lógico, já que todos os aparelhos atuais possuem os circuitos necessários para processar e reproduzir áudio e suportam cartões de memória de até 32 GB, sendo o suporte a MP3 apenas uma questão de software e de interface.

Como brinde, você ganha também a possibilidade de assistir vídeos, incluindo clipes do YouTube e outros sites de compartilhamento, que podem ser tanto salvos usando o PC, quanto acessados diretamente, usando a conexão de dados. Em um aparelho com uma tela razoavelmente grande, você pode até mesmo assistir filmes e séries inteiras.

Um bom sintoma da perda de espaço dos mp3players é o fato da Apple, que fez tanto sucesso com o iPod, encarar o complicado mercado de celulares e investir no iPhone, de forma a se manter relevante. Daqui a dois ou três anos, será raro ver alguém com um iPod ou outro mp3player stand-alone, assim como hoje em dia é raro ver alguém com um palm ou uma agenda eletrônica.

Continuando, os próximos da lista são os navegadores GPS. Hoje em dia, você pode instalar um software de localização como o Google Maps mesmo em aparelhos relativamente simples e conectá-lo via bluetooth a um receptor GPS externo, obtendo assim uma boa solução para localização e navegação. Entretanto, com a queda nos custos dos componentes, cada vez mais modelos estão vindo com receptor GPS integrado e softwares de navegação com suporte a navegação assistida (como no caso dos aparelhos da Nokia com o Nokia Maps). Isso permite que você utilize o próprio smartphone para traçar rotas e se localizar no trânsito, sem precisar de um navegador GPS dedicado:

Um aparelho de GPS pode parecer algo supérfluo à primeira vista. Entretanto, depois que você o usa por alguns dias, começa a se perguntar como pôde viver tanto tempo sem ele, sobretudo se você é um dos infelizes motoristas que abarrota as ruas de uma grande cidade, como São Paulo. Pode demorar mais um ou dois anos, mas eventualmente os celulares com GPS se tornarão tão comuns quanto os com câmera ou MP3, puxados pela redução no custo dos componentes.

Outra classe ameaçada de extinção é a dos modems USB. Eles se tornaram populares no início da implantação dos serviços de acesso via 3G devido ao plano de negócios adotado por algumas operadoras, de diferenciar os planos de acesso para PCs e notebooks dos planos de acesso a partir de smartphones (daí o uso de modems separados). Entretanto, praticamente todos os smartphones atuais podem ser usados como modem, muitas vezes com uma configuração ainda mais simples do que em um modem USB. Conforme as operadoras passem a disponibilizar planos que combinem voz e tráfego de dados ilimitados, mais e mais usuários passarão a usar o próprio smartphone como modem, em vez de carregar um telefone e um modem USB separado.

Uma outra vantagem dos smartphones é que eles podem ser usados também como modem bluetooth, eliminando a necessidade de usar fios. Isso é bastante útil para quem usa um notebook para se conectar em aeroportos, salas de espera e em outros lugares onde não exista uma mesa disponível, já que você pode se conectar à web sem tirar o smartphone do bolso.

Isso está gerando uma pequena revolução em termos de comportamento, dando seqüência às revoluções iniciadas pelos celulares e pela Internet. Com os smartphones, você passa a ter acesso contínuo a seus e-mails, pode ficar online no MSN, Jabber e em redes sociais de forma ininterrupta e tem acesso contínuo à web, o que permite que você faça pesquisas e encontre informações conforme precisar delas.

Você pode fazer uma pesquisa rápida no Google para checar como se escreve corretamente uma palavra ou para descobrir o significado de algum termo, por exemplo. Coisas como verificar a previsão do tempo, ou matar alguma curiosidade imediata sobre algum assunto específico deixam de ser problema. Ter acesso contínuo à web também tem suas desvantagens, já que você acaba sempre querendo checar alguma coisa, sem nunca parar para colocar as idéias no lugar. Uma atitude saudável para evitar isso, é centralizar o uso do smartphone em aplicativos de produtividade e em funções realmente úteis, reduzindo o uso de besteiras e distrações.

Outro aspecto interessante é que, com a evolução e o barateamento dos cartões de memória, você pode também carregar um grande volume de arquivos e informações. Cartões de 8 GB já podem ser encontrados a preços acessíveis e eles serão logo seguidos pelos cartões de 16 e 32 GB. Em muitos casos, a capacidade é suficiente para que você carregue todos os seus documentos de trabalho, todas as suas músicas, ou mesmo uma generosa coleção de vídeos no bolso, para qualquer lugar, algo que era impensável a pouco tempo atrás.

Hoje em dia, se algum amigo lhe pede algum arquivo (ou uma música, ou o endereço de uma página, ou outra informação qualquer), você pode simplesmente acessar o arquivo no cartão (ou baixá-lo da rede da empresa, usando uma VPN) e enviá-lo via bluetooth, na hora.

Quase todos os aparelhos atuais possuem suporte a hot-swap, ou seja, permitem que você troque o cartão sem precisar desligar ou mesmo remover a tampa da bateria, o que torna possível até mesmo que você tenha vários cartões e os troque conforme necessário. Tome apenas cuidado para não perder, é impressionante como os cartões microSD são pequenos. 🙂

É um pouco complicado traçar uma linha divisória entre os telefones burros e os smartphones, já que muitos fabricantes gostam de chamar mesmo seus aparelhos mais simples de “smartphones”. Para alguns, qualquer aparelho que ofereça recursos mais avançados do que uma simples agenda de contatos pode ser considerado um smartphone, enquanto outros defendem que a denominação se aplica apenas a aparelhos com telas grandes e teclados QWERT. Entre os dois extremos, a designação mais popularmente aceita é que um smartphone é capaz de:

a) Rodar um sistema operacional completo e permitir a instalação de aplicativos nativos (e não apenas widgets ou aplicativos em java);
b) Comunicar-se com o PC via USB e bluetooth;
c) Conectar-se à web via GPRS, EDGE ou de preferência 3G;
d) Rodar um navegador com bons recursos, oferecer um cliente de e-mails, IM e outros aplicativos de comunicação;
e) Tocar MP3, exibir vídeos e rodar jogos.

Dentro dessa designação, todos os aparelhos da Nokia baseados no S60, juntamente com os aparelhos baseados no Windows Mobile e no Android, os BlackBerry, muitos aparelhos da Motorola, Samsung e da Sony Ericson (baseados no UIQ, Windows Mobile ou no S60) e o iPhone 3G, entre outros, são smartphones.

Outra denominação que é freqüentemente usada é a “feature phone”. Ela enquadra aparelhos intermediários, como os modelos da Nokia baseados no S40 e os aparelhos da Sony Ericsson baseados no A2, que suportam a instalação de aplicativos em Java e incluem navegadores web, mas que não chegam a ser considerados smartphones.

Aparelhos “só pra falar” ainda existem, mas eles são cada vez mais raros, feitos para serem baratos e atenderem os usuários de pouco poder aquisitivo, ou que querem uma interface o mais simples possível. Um exemplo seria o Motorola F3, o “Moto Vovô”, que é vendido como um aparelho de baixo custo, destinado ao público que não tem muita afinidade com tecnologia:

De volta aos smartphones, um efeito colateral de toda a evolução é que, com tantas funções, a escolha do smartphone ideal tem se tornado cada vez mais difícil, já que você não está escolhendo apenas um gadget, mas sim vários deles simultaneamente. É muito fácil errar na dose e pecar pelo excesso, gastando muito mais do que seria necessário, ou pela falta, comprando um aparelho limitado ou imprático de usar. Outro problema é que a enorme variedade de modelos e plataformas diferentes torna difícil ter uma visão geral das opções, daí a idéia de escrever este livro.

Sobre o Autor

Redes Sociais:

Deixe seu comentário

X