A conspiração por trás do Metro e do Unity

A conspiração por trás do Metro e do Unity

As reações dos usuários à interface Metro do Windows 8 lembram bastante as reações ao Unity adotado nas versões recentes do Ubuntu, já que ambos os ambientes parecem inadequados para uso no desktop, estranhos em um mundo onde o mouse reina. Em ambos os casos a interface desperta um sentimento em comum, de que se está usando uma interface desenvolvida com telas touch (e não com teclados e mouses) em mente:

A forma tradicional de interagir com nossos computadores usando teclado e mouse é tradicionalmente conhecimento como modelo MAK (mouse and keyboard) e tem governado a computação por várias décadas, desde o Lisa e o Windows 1.0. Ele funciona muito bem tanto em desktops quanto em notebooks, mas acabou sendo abandonado nos smartphones e tablets, que adotaram um novo paradigma de uso, baseado em telas touch. Inicialmente, estes dispositivos não pareciam uma grande ameaça, já que rodavam sistemas operacionais e aplicativos limitados e não eram particularmente poderosos em termos de hardware, mas conforme eles foram ganhando mais poder de fogo, tornaram-se capazes de rodar sistemas operacionais desktop completos (veja o caso do Ubuntu for Android) e se tornaram o centro das atenções.

Naturalmente, os desktops e notebooks continuam entrincheirados em suas posições de ferramentas de trabalho e produtividade, mas os smartphones e tablets passaram a crescer rapidamente em praticamente todos os outros mercados e passaram a movimentar muito, mas muito dinheiro. Como todos bem sabem, vivemos em um mundo capitalista, onde o desenvolvimento de produtos e funções acaba sendo canalizado para os mercados onde existe mais dinheiro e no momento os tablets e smartphones são este mercado.

É exatamente esta correlação o principal fator por trás do aparecimento do Unity e do Metro. Por mais especulativo e inadequado que os movimentos da Canonical e da Microsoft possam parecer (afinal, não é nos desktops que ambas as empresas têm sua maior parcela de usuários no presente momento?) ela é apenas mais um exemplo de uma tendência que se tornará cada vez mais notável daqui em diante: ênfase cada vez maior em dispositivos touchscreen em detrimento do tradicional modelo MAK, que tende a se estagnar.

Não é preciso ir muito longe para notar que as interfaces desktop pararam de evoluir há bastante tempo. A interface do Windows 7 nada mais é do que um refinamento da interface do Vista, que é por sua vez um refinamento da interface do Windows XP e, ainda assim, muitos usuários sequer gostam das mudanças, preferindo o desktop clássico, que remete aos tempos do Windows 95! No mundo Linux as últimas grandes mudanças vieram com o Gnome 2 e o KDE 4, um ambiente que nem sequer foi inicialmente muito bem recebido, com muitos usuários preferindo a simplicidade do Gnome ou o KDE 3.x. Mesmo no mundo Apple, o desktop parou de evoluir no OS 10.5 (Leopard), com o 10.6 focado em pequenos refinamentos. A partir daí as mudanças passaram a serem centradas em trazer paridade com o iOS, focado em mudanças que, embora de forma mais gradual, estão levando o sistema ao mesmo lugar que o Unity e o Metro estão tentando.

Do ponto de vista dos fabricantes, o modelo MAK é coisa do passado e o touch é o futuro. Isso não tem na ver com qual dos dois modelos é mais eficiente ou mesmo com o número atual de usuários, mas simplesmente com o fato de que o touch é que está crescendo em novos mercados e movimentando cifras cada vez maiores, uma corrida na qual nenhum fabricante quer ficar para trás.

No caso do Windows 8 por exemplo podemos ver que o desktop clássico continua disponível, e é possível que na versão final a Microsoft inclua alguma configuração para que ele possa ser usado permanentemente por padrão. Entretanto, o desktop clássico torna-se um ambiente de legado, que não deve receber muitos aprimoramentos daqui em diante, com todo o foco dos desenvolvedores sendo movido pra o Metro, que além de ferramentas de desenvolvimento rápido oferece uma loja de aplicativos, na qual os desenvolvedores podem ganham algum dinheiro rápido, assim como no caso do Android e do iOS. O desktop clássico tende a ficar restrito a aplicativos antigos, bem como a ferramentas de uso profissional como o AutoCAD e o Photoshop.

No caso do Ubuntu temos uma situação similar, já que o foco dos desenvolvedores da Canonical também está completamente focado no Unity. O Gnome, KDE e outros ambientes continuam disponíveis no repositório para instalação por parte dos mais intrépidos, mas a falta de foco neles tem feito com que a instalação e o uso apresentem cada vez mais problemas e inadequações. Naturalmente, distribuições como o Mint continuam disponíveis para salvar o dia, mas isso não torna menos perturbadora a mudança de rumos da Canonical.

Apesar de tudo isso, os desktops são um formato prático e barato demais para serem abandonados. Basta ter em mente que um desktop completo, com um monitor de 18″ ou mais, um processador poderoso e 4 GB de RAM custa beem menos do que um smartphone high-end, muito embora ofereça muito mais recursos de processamento e armazenamento. Sempre existirá uma classe de usuários que prezarão o desempenho e demandarão computadores expansíveis, com espaço para múltiplas GPUs e HDs, fontes de grande capacidade e soluções elaboradas de ventilação para manter tudo isso funcionando.

Da mesma forma, empresas e usuários menos favorecidos continuarão prezando o baixo custo, facilidade de manutenção e atualização, bem como a longevidade dos desktops. Em outras palavras, os desktops continuarão entre nós. O grande prolema é que com a estagnação das interfaces e do desenvolvimento de aplicativos, eles podem enfrentar uma lenta estagnação, que pode levá-los a acabarem ocupando uma posição de subserviência aos tablets e outros dispositivos.

Os notebooks também são um formato prático demais para serem abandonados, mas é provável que eles passem por muitas mudanças, ganhando teclados destacáveis e dual-boot com o Android ou outros sistemas móveis. Em outras palavras, sob o pretexto de desenvolver dispositivos capazes de penetrar em mais mercados, os fabricantes tornarão os notebooks cada vez mais parecidos com os tablets. Além das mudanças no hardware, eles enfrentarão o mesmo problema de estagnação das interfaces e aplicativos que os desktops, que a longo prazo acabarão fazendo muitos usuários a passarem mais tempo no Metro ou mesmo migrarem para versões x86 do Android ou outro sistema móvel para terem acesso aos aplicativos da moda.

Concluindo tanto os desktops quanto os notebooks são plataformas flexíveis demais e acessíveis demais para serem abandonadas em qualquer futuro próximo. Eles continuarão sendo norma entre usuários mais técnicos, produtores de conteúdo e mercados onde o custo-benefício é ainda um fator essencial. Entretanto, precisaremos nos contentar em sermos uma fatia cada vez menor do bolo total e, principalmente, com o fato de que somos agora vistos como um segundo mercado, como visitantes que não merecem tanta atenção quanto no passado. É uma situação similar à dos jogos nos PCs, que cada vez mais passaram a ser ports feitos às pressas de títulos feitos com os consoles em mente.

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