Turbulência no CentOS

Turbulência no CentOS

CentOS turbulence and enterprise Linux tradeoffs
Autor original: Jonathan Corbet
Publicado originalmente no:
lwn.net
Tradução: Roberto Bechtlufft

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O CentOS deve parecer a distribuição dos sonhos para muita gente. Seus usuários contam com o benefício da enorme equipe de desenvolvedores que a Red Hat tem trabalhando no Red Hat Enterprise Linux, sem ter que pagar nada por isso. O CentOS oferece um nível de estabilidade que não se encontra nas distribuições comunitárias. Até o Debian Stable exige que seus usuários atualizem com mais frequência do que o CentOS. Os provedores de hospedagem têm uma plataforma sólida e com suporte para vender a milhares de clientes, sem onerar um único e desvalorizado dólar de seus bolsos. Muitos e muitos sites dependem do CentOS, portanto, qualquer coisa que ponha em risco a estabilidade de suas fundações certamente vai deixar muita gente preocupada. Infelizmente, foi exatamente isso o que aconteceu no fim de julho.

O CentOS nunca fui um projeto muito transparente; suas listas de discussão não abrigam o tipo de discussão aberta que pode ser encontrada no Debian, no Fedora ou (cada vez mais) no openSUSE. A maioria dos usuários do CentOS talvez não se preocupe muito com a origem do software que usa, mas existem aqueles que tentam ajudar o projeto e fazer com que seu funcionamento seja mais aberto. Uma dessas pessoas, o famoso empacotador de RPMs Dag Wieers, abandonou o navio em junho:

Não foi uma decisão fácil, e me sinto triste por ter que tomá-la, mas decidi abandonar o projeto CentOS. Espero que a equipe possa resolver os problemas de liderança, de comunicação e de transparência (que ocorrem mesmo internamente), porque essas questões são muito importantes para a integridade da comunidade do CentOS.

Os problemas do projeto se tornaram públicos no dia 30 de julho, quando uma perturbadora carta aberta foi postada no centos.org. O assunto urgente era o desaparecimento do fundador do projeto, Lance Davis, que postou pela última vez na lista de discussão centos-devel em abril de 2008. Evidentemente, já faz um bom tempo que Lance também não dá sinal de vida em outras partes do projeto. O desaparecimento do fundador de um projeto pode ser um problema, mas as coisas são ainda piores: quando Lance sumiu, levou consigo o controle do nome de domínio do projeto e dos canais de IRC.

Lance também controlava o lado financeiro do projeto. Geralmente não se comenta muito sobre essa última parte do problema, mas ela está aí: pelo visto, ninguém sabe onde foi parar o dinheiro que entrou no projeto por meio de doações e propagandas na web. Citando Dag Wieers mais uma vez:

Por pelo menos três anos as pessoas doaram dinheiro e os patrocinadores pagaram por anúncios no site, mas o dinheiro não ia para o projeto, e sabe-se lá onde foi parar. Perguntar sobre o assunto era um risco para o projeto, então todo mundo ficou calado pelo bem dele, esperando que a questão se resolvesse.

Naturalmente, o problema não se resolveu; os outros contribuidores chave do CentOS acabaram sendo forçados a ir a público expressar suas preocupações. Parece que a atitude surtiu efeito: Lance saiu da toca e teve um encontro com a equipe. A propriedade do nome do domínio foi transferida. O projeto CentOS parece estar de volta aos trilhos, e talvez rume para um modo de operação mais democrático.

Pouco foi dito sobre a questão financeira, além disto:

Vamos cuidar disso nas próximas semanas, o plano no momento é não ativar a opção de doações ou publicidade em lugar nenhum dos sites até que esses processos estejam em ordem.

Logo, o gerenciamento da futura arrecadação de renda do projeto deve ocorrer de maneira mais aberta.

Alguns podem dizer que os usuários do CentOS não tinham muito com o que se preocupar. Na pior das hipóteses, os desenvolvedores ativos do CentOS poderiam criar um fork da distribuição e escolher um novo domínio, talvez sem ter que mudar o nome do projeto. Essas mudanças certamente poderiam ser bem-sucedidas. Mas os usuários que escolheram uma distribuição conhecida por sua estabilidade podem se sentir um pouco preocupados ao receberem instruções para mudar a configuração dos repositórios, de modo que apontem para outro local, gerenciado por um grupo que afirma ser o “verdadeiro” CentOS. Com certeza haveria uma certa dose de problemas.

Podemos tirar uma lição disso: o uso de uma distribuição como o CentOS tem seus riscos. Um sistema rodando o CentOS depende dos esforços de um grupo relativamente pequeno de voluntários; esses voluntários não são obrigados a continuar oferecendo suporte a ninguém. A liderança do projeto e seus procedimentos são meio obscuros, mesmo agora, quando parece que as coisas vão melhorar. O CentOS depende totalmente da Red Hat para obter atualizações de segurança, e isso impõe um atraso entre o lançamento de uma correção da Red Hat (que anuncia vulnerabilidades que ainda não haviam sido descobertas) e a disponibilidade da correção no CentOS. Para os curiosos, aqui está o tempo de atraso de algumas atualizações recentes:

Pacote
Atraso (dias)
1
1
2
8
7
7
1
5

Algumas atualizações passam rapidamente pelo sistema do CentOS, mas outras não se saem tão bem; a atualização “crítica” do firefox se arrastou por uma semana inteira.

A ideia deste texto não é a de criticar o CentOS: o projeto vem fazendo um trabalho fantástico ao oferecer uma distribuição altamente estável e com um bom suporte à comunidade, de graça. Dá para falar mal disso? A escolha de uma distribuição sempre tem seus pontos negativos. Um usuário do Linux que precise de um serviço firmado por contrato, garantido por um suporte sólido e por atualizações de segurança mais velozes, deveria considerar a hipótese de pagar pelo suporte de uma das empresas que operam na área.

Para quem não precisa desse nível de suporte, o CentOS oferece grandes benefícios. Um CentOS mais aberto deve ser capaz de oferecer benefícios ainda maiores. Também são encorajadoras as sugestões para que o CentOS trabalhe mais de perto com o Scientific Linux, outra recompilação do RHEL com objetivos muito parecidos. No fim das contas, parece que há boas chances dessa turbulência levar a bases mais sólidas para o CentOS, que continuará sendo uma plataforma firme para muitos milhares de sistemas no futuro.

Créditos a Jonathan Corbetlwn.net
Tradução por Roberto Bechtlufft <info at bechtranslations.com.br>

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