HSPA+, WiMax e LTE: à espera do 4G

HSPA+, WiMax e LTE: à espera do 4G

Quando as primeiras redes 3G entraram em operação, especulava-se que elas poderiam vir a substituir o ADSL e outras conexões fixas para muitos assinantes, já que os 14.4 megabits máximos permitidos pelo HSDPA são em teoria bem mais rápidos que os 2 ou 4 megabits ainda usados na maioria das instalações de ADSL e cabo. Entretanto, o tempo mostrou o quanto esta ideia estava longe da realidade, já que a maioria dos dispositivos trabalha usando as taxas mais baixas do HSDPA (1.8, 3.6 ou no máximo 7.2 megabits, ou simplesmente ficando limitados aos 384 kbps do UMTS) e o fato da banda ser compartilhada fez com que as redes logo ficassem congestionadas, levando as operadoras a implantarem quotas de tráfego e a reduzirem as velocidades das conexões. No final, as conexões fixas continuaram no mesmo lugar onde sempre estiveram, e as redes 3G passaram a funcionar mais como um complemento, para acessar os e-mails ou navegar quando outra rede mais rápida não esteja disponível.

Ao contrário do que pode parecer, investir em infra-estrutura de telefonia não é uma coisa simples. Tudo começa com o processo de leilão das faixas de frequência, que obrigam as operadoras a desembolsarem valores exorbitantes antes mesmo de começarem a implantar as redes. No início do mercado de telefonia, as frequências eram distribuídas às operadoras de acordo com a área de atuação e os serviços oferecidos; a prioridade dos governos era simplesmente fiscalizar a implantação dos serviços, o que segundo muitos é a forma “justa” de executar o processo. Inevitavelmente, cada faixa de frequência precisa ser fornecida com exclusividade a uma única operadora, já que duas redes distintas operando na mesma frequência interferem entre si, tornando impossível garantir a qualidade do serviço. Um bom exemplo são as redes Wi-Fi (que operam em uma faixa não-licenciada), onde basta um vizinho com um amplificador para prejudicar a operação de todas as redes próximas.

O grande problema é que as faixas de frequências são limitadas em número e com a entrada de mais operadoras no mercado, elas passaram a ser disputadas no tapa, literalmente. Os governos (no mundo todo, não apenas no Brasil) logo perceberam que poderiam ganhar muito dinheiro se passassem a leiloar as faixas de frequência, tratando-as como um produto. Com isso, não apenas as operadoras passaram a disputar as faixas de frequência existentes, mas também as grandes passaram a tentar bloquear a entrada de outras operadoras menores, adquirindo mais faixas de que realmente precisaria apenas para impedir a entrada de outras concorrentes.

Para as operadoras, adquirir faixas de frequência para cada nova tecnologia acaba sendo uma questão de sobrevivência, já que sem elas ela fica restrita à tecnologia anterior, sem ter como atualizar sua rede. Um bom exemplo é a Nextel, que não conseguiu adquirir uma das faixas de frequência de rede 3G em 2007 e acabou presa ao 2.5G, tendo que se especializar em planos de voz e mensagens, com tráfego de dados limitado ao GPRS/EDGE.

Tento tudo isso em mente, não é difícil entender os valores estratosféricos atingidos nos leilões. Em 2007, por exemplo, quando foram leiloados as frequências de operação das redes 3G, a Anatel arrecadou nada menos do que 5.4 bilhões de reais. Naturalmente, o valor pago pelas operadoras acaba sendo repassado aos clientes com juros no final da cadeia, transformando o leilão em uma espécie de imposto invisível, pago pelos consumidores.

O problema seguinte é a implantação das torres, que esbarra em um conjunto de outros problemas, incluindo limitações e taxas impostas pelas prefeituras, necessidades de adquirir terrenos, processos na justiça por vizinhos insatisfeitos e assim por diante. No final, o custo dos equipamentos propriamente ditos acaba representando apenas uma pequena fração do que é efetivamente gasto.

Como cada antena de transmissão é capaz de atender a um número limitado de clientes simultâneos, oferecendo um volume finito de banda, os custos acabam sendo calculados com base em cada GB transferido. Ter 10.000 clientes que transmitem 10 GB de dados por mês, ou ter 1.000.000 de clientes que transmitem 100 MB por mês demanda exatamente o mesmo investimento em termos de infra-estrutura, o que passou a levar as operadoras a investirem nos clientes que usam pouca banda, em detrimento dos heavy-users. Limites passaram a ser impostos e a época do “navegue à vontade” deu lugar ao “navegue o quanto conseguir, até acabar a quota”.

Com o 3G chegando a seu limite, as esperanças se voltaram para padrões mais rápidos, inaugurando uma nova corrida, agora rumo ao “4G”. Segundo a definição do ITU-R, um padrão 4G deve oferecer um mínimo de 100 megabits de download para conexões móveis e 1 gigabit para conexões fixas e nomádicas, mas as tecnologias em implementação não atendem a este requisito, o termo “4G” tem sido usado como um termo de marketing para designar qualquer coisa mais rápida que o HSDPA padrão.

Naturalmente, as velocidades anunciadas são compartilhadas (assim como nos padrões anteriores, o que faz com que as velocidades que serão obtidas na prática serão muito mais baixas. Lembre-se que o padrão atual, o HSDPA oferece 14.4 megabits no papel, mas na prática é difícil obter mesmo uma conexão estável de 1 ou 2 megabits. Isso ocorre devido ao congestionamento do tráfego até a antena (já que a banda é dividida entre os múltiplos clientes conectados), congestionamento no backraul (a estrutura que conecta as antenas à rede central) e/ou congestionamento no link de Internet da operadora. De qualquer forma, padrões mais rápidos tendem a amenizar o problema, já que aumentam a oferta de banda disponível nas torres e obrigam as operadoras a ampliarem o restante da estrutura. Os três concorrentes são:

HSPA+

O HSPA+ (ou Evolved HSPA) é na verdade uma evolução do HSPA atualmente usado em redes 3G e, embora mais rápido continua sendo considerado uma tecnologia de terceira geração. Apesar disso, a falta de padronização em relação ao que se pode chamar de “4G” levou a T-Mobile (nos EUA) e outras operadoras a anunciarem-no como um concorrente para o LTE e o WiMax. No papel, o padrão suporta taxas de transferência de até 88 megabits para download e 22 megabits para upload, mas enquanto escrevo as redes em operação operam utilizando o padrão de 21 megabits, que é apenas ligeiramente mais rápido que o HSDPA, sobretudo quando os clientes estão distantes da torre.

Uma vantagem do HSPA+ em relação ao HSDPA é que todos os clientes já chegam ao mercado suportando taxas de pelo menos 21 megabits (diferentes do que temos no UMTS, onde diferentes aparelhos e modens suportam diferentes velocidades), mas a velocidade pratica depende da implementação da operadora (qualidade da cobertura, número de clientes dentro da mesma área, etc). Em uma rede descongestionada e com bom sinal, uma rede HSPA+ de 21 megabits pode oferecer taxas reais de conexão de 9 megabits ou mais (ou até 19 megabits caso o cliente esteja muito próximo da torre), consideravelmente mais do que é possível obter com o HSDPA.

Os padrões mais rápidos do HSPA+ (42 megabits em diante) demandam o uso do MIMO (Multiple Input, Multiple Output) onde os dados são transmitidos utilizando diversas antenas simultaneamente, de forma similar ao que temos no 802.11n, o que complica o design dos aparelhos e encarece a implementação.

WiMax

O WiMAX (Worldwide Interoperability for Microwave Access), ou 802.16, é um padrão para redes wireless de longa distância, que pode ser usado para criar links de longa distância, ou para oferecer acesso à web em grandes áreas, formato em que ele concorre com os padrões de telefonia. As redes WiMAX ofereceriam uma cobertura muito maior que as 802.11g e 802.11n, utilizando um volume menor de pontos de acesso.

Os transmissores WiMAX podem operar em diversas faixas de frequência, entre elas a faixa dos 2.5 GHz (não confundir com os 2.4 GHz das redes Wi-Fi), 3.5 GHz e dos 10.5 GHz, com alcance de até 40 km em campo aberto (ou até 12 km com a presença de obstáculos) e velocidade de transmissão de até 70 megabits, com o uso de canais de 20 MHz. Como de praxe, os 70 megabits são atingidos apenas a curtas distâncias e a velocidade decai progressivamente, de acordo com a distância e a sensibilidade da antena usada no cliente. Um valor mais realístico, para uma área de média cobertura é algo em torno de 6 a 12 megabits reais.

Existem padrões de WiMAX para acesso fixo (802.16-2004, ou 802.16d) e também móvel (802.16e), que serviu como base para as implementações em redes de telefonia. A grande diferença entre os dois é que o primeiro não suporta comutação, de forma que a conexão cai ao sair da área atendida pelo transmissor, enquanto no segundo o cliente pode se deslocar livremente em toda a área atendida, já que o chaveamento entre os diferentes transmissores é feito automaticamente, assim como nas redes de celular.

A principal vantagem do WiMAX é que ele é uma tecnologia similar ao Wi-Fi, de forma que as placas e os receptores são bastante acessíveis caso produzidos em volume. Isso permite que smartphones como o HTC EVO 4G sejam simultaneamente compatíveis com o WiMax e com o HSDPA, que é utilizado automaticamente como sistema de fallback nas áreas onde o WiMax não esteja disponível. A desvantagem em relação ao LTE é que o WiMax é a princípio bem mais lento, com implementações como a da Clearwire (nos EUA), que optou pelo uso de canais de 10 MHz oferecendo taxas de transferência reais na cada dos 3 a 6 megabits.

Um novo padrão, o IEEE 802.16m (WiMAX 2) está em fase de aprovação, oferecendo taxas de transmissão mais altas e compatibilidade retroativa com o padrão original. Dentro do proposto, usando uma faixa de frequência de 20 MHz e clientes usando um receptor MIMO 4×2, seria possível oferecer 120 megabits de download e 60 megabits de upload, o que permitia uma concorrência direta contra a versão inicial do LTE.

LTE

O LTE foi desenvolvido pela 3GPP como uma evolução do HSPA, oferecendo taxas de download de até 100 megabits por canal. No papel, ele oferece até 100 megabits de download e 50 megabits de upload usando uma faixa de frequência de 20 MHz (taxas que podem em teoria ser ampliadas com o uso de faixas de frequência mais largas, ou com o uso do MIMO), combinados com tempos de latência significativamente mais baixos que nas redes 3G (indo a até 5 ms para pacotes curtos em situações ideias) o que abre as portas para plataformas de jogos FPS multiplayer móveis, um filão em que as operadoras estão a tempos tentando entrar.

Como em outros padrões, a velocidade final da rede depende da largura da faixa de frequência usada pela operadora (que por sua vez depende de quanta banda cada uma for capaz de obter nos leilões de frequências) e pela configuração de antenas dos clientes. Usando MIMO 2×2 (adotado em todos os aparelhos da primeira geração), temos:

5 MHz: 37 megabits download, 18 megabits upload
10 MHz: 73 megabits download, 36 megabits upload
20 MHz: 150 megabits download, 75 megabits upload

Caso os clientes utilizem MIMO 4×4 (difícil de implantar em smartphones devido ao grande número de antenas utilizadas), as taxas de download dobram, mesmo que mantidas a mesma banda de frequência:

5 MHz: 72 megabits download, 18 megabits upload
10 MHz: 147 megabits download, 36 megabits upload
20 MHz: 300 megabits download, 75 megabits upload

Como sempre, estas são as taxas máximas teóricas, obtidas apenas em situações ideias e com os clientes muito próximos das antenas. Na prática, não conte com mais do que 1/4 ou 1/5 da velocidade teórica na maior parte do tempo.

Continuando, as taxas máximas, de 300 e 75 megabits são suportadas apenas por aparelhos de categoria 5, que enquanto escrevo ainda não chegaram ao mercado. Enquanto escrevo, estão disponíveis apenas aparelhos e modems de categoria 3 e 4, que possuem limites um pouco mais baixos:

Categoria 1: 10 megabits download, 5 megabits upload
Categoria 2: 50 megabits download, 25 megabits upload
Categoria 3: 100 megabits download, 50 megabits upload
Categoria 4: 150 megabits download, 50 megabits upload
Categoria 5: 300 megabits download, 75 megabits upload

As categorias 1 e 2 são reservadas a dispositivos de baixo custo, com chipsets mais simples e de baixo consumo. Elas podem vir a chegar ao mercado equipando smartphones de baixo custo, ou mesmo modems vendidos em conjunto com planos de acesso com baixas quotas de tráfego. Em termos de velocidade eles não são muito interessantes, já que os categoria 1 são mais lentos até mesmo que o HSDPA+HSUPA.

Do ponto de vista técnico, o LTE e o WiMAX são similares, já que ambos são baseados no padrão OFDMA e utilizam o protocolo IP. A principal diferença técnica é que o LTE divide a banda de transmissão em dois canais dedicados (downstream e upstream) enquanto no WiMAX usa um único canal para transmissão e recepção. Apesar disso, o LTE tem uma vantagem econômica, que é o fato de ser parcialmente compatível com a rede GSM, gerando um plano de upgrade mais suave para as operadoras.

Inicialmente se cogitou de usar a faixa dos 700 MHz (ocupada atualmente TV analógica) para o LTE no Brasil, mas a prorrogação do sinal analógico até 2016 fez com que as preferências fossem para a faixa dos 2.5 GHz, que é a mais utilizada no mundo. A grande questão é que a implantação no Brasil ainda demorará, uma vez que depois de escolhida a faixa de frequência, ainda teremos uma longa espera pelo processo licitatório, antes mesmo que as operadoras iniciem o trabalho na infra-estrutura. Outro fator importante é que diferente do que tivemos na Europa (onde a implantação do 3G começou em 2000), as redes 3G das operadoras nacionais são bem mais recentes e todas estão ainda tentando amortizar os investimentos antes de pensarem em novos upgrades.

Apesar disso, já podemos ter uma ideia das mudanças em termos de preços e planos com base no que está sendo feito em outras partes do mundo. Em resumo, o LTE oferece taxas de transmissão mais altas e multiplica a capacidade de transmissão de dados de cada transmissor, permitindo que um número maior de clientes sejam atendidos, e/ou que possam ser oferecidos planos com quotas de tráfego maiores. Entretanto, a boa velocidade oferecida pelas torres precisa ser acompanhada por atualizações na estrutura de interligação e nos links de internet das operadoras para que os ganhos práticos sejam compatíveis.

Uma observação sobre o padrão LTE que está sendo implementado (Release 8) é que ele não inclui suporte a chamadas de voz, que precisam ser feitas usando a rede 3G ou 2G. O problema central é o demorado chaveamento entre as torres, que acaba inviabilizando chamadas de voz (até mesmo VoIP) enquanto o aparelho está em movimento. A menos que o aparelho utilize um modem dual (como por exemplo o Thunderbolt da HTC), o telefone precisa encerrar todas as transferências de dados ao realizar uma ligação de voz (chaveando para a rede 3G ou 2G) e restabelecer o link de dados depois que ela é finalizada. Esta limitação deve ser solucionada no LTE Release 9, que deve estar disponível até 2012, oferecendo dados e voz simultâneas.

LTE Advanced

Diferente dos anteriores (que são frequentemente chamados de padrões pré-4G, ou 3.9G), o LTE Advanced (Release 10) está sendo desenvolvido como um padrão 4G legítimo, capaz de utilizar um espectro de frequência de até 100 MHz, oferecendo taxas de transferência de 1 gigabit para download e 500 megabits para upload, atendendo aos valores propostos pelo ITU-R. Para chegar a estes valores, é incorporado o uso do MIMO e combinando as tradicionais torres de transmissão com dispositivos de baixa potência como femtocells e picocells para melhorar a cobertura e as taxas de transmissão. Juntamente com as taxas de transferência mais altas, os tempos de latência também caem, indo dos 100 ms mínimos que temos atualmente no HSDPA para até 5 ms em situações ideias.

Enquanto escrevo, o LTE Advanced está ainda em fase de ratificação, por isso as primeiras redes não devem entrar em operação antes de 2013. Até lá, as operadoras terão a difícil escolha de investirem no LTE ou WiMax, para então migrar gradualmente para o LTE Advanced, ou continuarem no HSDPA e migrarem diretamente para o LTE Advanced quando ele estiver disponível.

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