Um test-drive do Fedora 14

Um test-drive do Fedora 14
logo-dw

Trying on a new Fedora

Autor original: Jesse Smith

Publicado originalmente no: distrowatch.com

Tradução: Roberto Bechtlufft

Na minha opinião, a distribuição mais difícil de se analisar é o Fedora. E não digo isso por motivos técnicos, já que instalar o Fedora é tão fácil quanto cair de uma bicicleta (só que não dói tanto). O que dificulta para mim é o lado pessoal, da familiaridade. Uso o Fedora regularmente (e antes dele usava o Red Hat Linux) há uns dez anos. Passar tanto tempo usando um sistema faz com que a gente se acostume e se sinta confortável com os defeitinhos dele, ou então que esses defeitinhos nos irritem além da conta. Na minha relação com o Fedora, tenho as duas sensações. A cada seis meses eu me vejo impressionado com os novos recursos incluídos pela equipe da distro, mas ao mesmo tempo os pequenos probleminhas me irritam mais do que deveriam. Seja como for, estou puxando este assunto porque queria muito fazer uma avaliação objetiva do Fedora, e apesar da minha natureza humana, espero ter conseguido fazer isso. Portanto, perdoem-me se pipocar alguma evidência de parcialidade em relação à distro no meu texto.

Para começar, é bom comentar sobre o novo site do Projeto Fedora. O novo visual é mais brilhante e colorido do que o anterior, que se apresentava de forma simples em branco e azul, e além de atraente é mais fácil de navegar. Parece que o foco agora está mais na parte comunitária do projeto do que nas características técnicas. Isso dá ao Fedora um aspecto mais aberto e amigável. Gostei particularmente da foto em grupo na página inicial, na qual um dos fotografados usa os chifres do capetinha do FreeBSD, mostrando que a equipe tem senso de humor.

Antes do lançamento do Fedora 14, tive a oportunidade de fazer algumas perguntas ao novo líder de projeto do Fedora, Jared Smith…

Entrevista

DW: Pelo que eu me lembre, Jared, esta é sua primeira versão do Fedora como líder do projeto. Alguma coisa o surpreendeu desde que você assumiu o cargo?

JS: Não tive muitas surpresas. O projeto Fedora é muito aberto e transparente com seu trabalho, então eu já tinha uma ideia muito boa do que esperar quando assumi. Ainda assim, tenho que admitir que fiquei um pouco surpreso por uma única versão RC ter sido criada antes do lançamento da versão final do Fedora 14. Fiquei muito feliz em ver como o processo de lançamento desta versão do Fedora funcionou bem.

DW: A julgar pela lista de recursos do Fedora 14, parece que tem havido bastante trabalho para manter o projeto à frente em termos de tecnologia, especialmente na parte de ferramentas para desenvolvedores. Você acha que algum recurso se destaca diante dos demais?

JS: Não acho que algum recurso específico se destaque muito dois outros. Esta versão tem muitas novidades ótimas em diversas áreas do Fedora, na administração do sistema, no desenvolvimento e nos aplicativos voltados para o usuário final.

DW: Um dos itens na lista de recursos é o OpenSCAP. Você poderia explicar como funciona essa tecnologia para as pessoas que nunca a utilizaram?

JS: Aqui vai um ótimo post com detalhes sobre o OpenSCAP, que publicamos há algumas semanas.

DW: O Projeto Fedora está distribuindo sua nova versão pela nuvem EC2 da Amazon. Esse meio de distribuição oferece algo de útil para vocês, como estatísticas de uso ou outros números?

JS: Na verdade, não. Em relação ao Fedora convencional, não há nada de diferente nos mecanismos de feedback da imagem do EC2. Como você já deve saber, a privacidade dos nossos usuários é um assunto muito sério para nós, e não coletamos dados deles sem pedir permissão primeiro. Por exemplo, o Smolt só relata informações limitadas sobre o seu sistema caso você permita. Através de nossos mirrors, também sabemos quantos sistemas buscam por atualizações, mas tirando isso não temos outros meios de rastrear as instalações.

DW: Há alguns meses, você disse que queria ajudar os usuários a contribuírem com o código aberto. Algum progresso nesse sentido?

JS: Com certeza. Acho que estamos começando a fazer um trabalho melhor no sentido de apontar os meios dos quais o usuário pode se valer para contribuir com o Fedora e colaborar com a comunidade de código aberto. Ainda temos muito trabalho pela frente, mas certamente estamos aprimorando nossa maneira de orientar os novos colaboradores. Nossa equipe de design, por exemplo, oferece algumas “recompensas de design” para encorajar o ingresso de gente interessada em ajudar. As recompensas também servem para promover as ferramentas e métodos utilizados pela equipe para fazer seu trabalho, para que outros possam aprender com a experiência dela.

DW: O Fedora é uma distro com tecnologia de ponta, com muito a oferecer aos desenvolvedores. O projeto também está trabalhando para atrair novatos na comunidade Linux?

JS: Com certeza! Um dos nossos principais objetivos com o novo design do fedoraproject.org foi o de apresentar o Fedora aos novatos no Linux. Com base no retorno que tivemos em um primeiro momento, parece que o novo design está tendo um efeito positivo nesse sentido.

DW: Você tem viajado bastante por causa de sua nova função. Em termos geográficos, para onde você acha que o Linux e o software livre e de código aberto estão seguindo?

JS: É um pouco difícil apontar um único local, então vou generalizar um pouco. Vejo que o Linux e o software livre estão avançando muito em várias áreas do mundo, especialmente em países nos quais o governo têm uma atitude mais favorável à abertura desse tipo de software. O governo de vários países da América Latina, por exemplo, têm um forte compromisso com o software livre, e isso contribui bastante para a sua adoção no setor privado. Estou muito empolgado com o crescimento do Linux e do software livre em economias emergentes como o Brasil, a Índia e a China.

DW: Você gostaria de acrescentar algo sobre o Fedora, o Red Hat ou o código aberto em geral?

JS: Seria imperdoável se eu não agradecesse a todas as muitas equipes dentro do Projeto Fedora que ajudaram a lançar o Fedora 14. Deixo meus agradecimentos aos empacotadores, à equipe de engenharia de lançamento, a quem ajudou a testar, aos tradutores, aos escritores, aos embaixadores, à equipe de marketing e a todos que contribuíram para fazer do Fedora 14 um sucesso.

O test-drive

Para meus testes com o Fedora 14, usei a edição de 32 bits do GNOME. O Fedora também oferece uma edição com o KDE, e as duas edições têm opções para 32 e 64 bits. Também há um DVD de instalação com uma coleção mais completa de pacotes. Para quem tem redes rápidas, a distribuição oferece o BFO, um ambiente de inicialização mínimo que roda via rede. Há pouco tempo, o projeto também encorajou a criação de outras versões por parte da comunidade, os spins, e surgiram várias versões diferentes, incluindo edições com o LXDE e o Xfce.

O CD do Fedora abre o menu do GRUB, que permite ao usuário ir para o desktop com as configurações padrão do projeto ou com a configuração de inicialização segura de vídeo. O sistema carrega bem rápido, e apresenta ao usuário uma tela de login gráfico. Nesse ponto, o sistema aguarda alguns segundos e, caso não seja interrompido, faz login usando a conta de convidado da distro. O ambiente de desktop é o GNOME 2.32, que traz um novo e intenso papel de parede. O design evoca a imagem de uma janela de vidro sendo quebrada no hiperespaço. Eu gosto do novo visual, mas às vezes incomoda um pouco à vista. Como de costume, o menu de aplicativos e a bandeja do sistema estão localizados em uma barra de menu no topo da tela, e o alternador de aplicativos fica na barra inferior. No desktop, dois ícones: um explora o sistema de arquivos do computador, o outro inicia o instalador do Fedora.

Algumas ferramentas do Fedora 14 para administradores

O menu de aplicativos inclui um conjunto bastante convencional de programas. Nele, nós encontramos o Firefox (3.6.10), o Evolution, um cliente para mensagens instantâneas e um cliente para desktop remoto. Temos gravadores e ripadores de CD, players de música e de vídeo, o gerenciador de fotos Shotwell, uma pequena coleção de jogos, o habitual grupo de pequenos programas para edição de textos e compactação de arquivos e uma calculadora. O GNOME, por sua vez, vem equipado com uma boa seleção de programas para alterar as preferências do usuário, como o visual do desktop, o comportamento do mouse e o idioma favorito. Por padrão, o Fedora não vem com os codecs de reprodução dos formatos de mídia mais populares, e nem com o Flash ou o player de código aberto Gnash. Esses extras estão no repositório complementar RPMFusion.

Um dos pontos forte do Fedora para mim é sua oferta de ferramentas administrativas. Essa tradição se mantém no Fedora 14, e temos programas para a criação de diretivas do SELinux e para a solução de conflitos do mesmo. Também temos um gerenciador de firewall flexível, um utilitário de atualização de pacotes simples mas eficaz, um gerenciador de serviços fácil de usar e ferramentas de configuração de redes. Todos esses programas funcionaram direitinho durante os meus testes.

O instalador do sistema não mudou muito ao longo dos anos, e nem precisa. O instalador do Fedora tem uma interface gráfica agradável, que conduz o usuário pela escolha do layout do teclado, tipo de mídia de armazenamento, fuso horário e definição de senha de root. O gerenciamento de partições é fácil, e o Fedora oferece um conjunto poderoso de opções para redimensionamento, criação e exclusão de partições. Depois de configurar as partições e os pontos de montagem, o instalador confirma as configurações do gerenciador de inicialização e copia os arquivos necessários. Minha única queixa é a configuração da partição root (/). Quando a instalação é feita via live CD, o usuário precisa formatar a partição root com o sistema de arquivos ext4, uma restrição que não vemos em outras distros. Depois que o sistema reinicia, o Fedora roda um assistente de configuração que informa ao usuário sobre a licença do projeto. Em seguida, o usuário cria a conta de usuário comum, define a data e a hora atuais e, se quiser, pode enviar um perfil de hardware ao Projeto Fedora. Segundos depois, a tela de login gráfico é exibida.

O instalador do sistema

O Fedora não se saiu mal com o meu hardware. No meu laptop HP (CPU dual-core de 2 GHz, 3 GB de RAM e placa de vídeo Intel) a tela foi configurada com uma resolução adequada, o som funcionou de primeira e a webcam foi detectada (mas para que ela funcionasse eu tive que mexer em algumas coisas). Infelizmente a minha placa de rede sem fio Intel não foi detectada. Como aconteceu em versões anteriores, o touchpad funcionou, mas não aceitava toques rápidos como cliques do mouse. O comportamento do mouse pode ser alterado facilmente pelas configurações do sistema. Uma boa notícia: os problemas que tive com a placa de vídeo no Fedora 13, e que faziam meu laptop ficar ridiculamente lento, foram resolvidos e o desempenho mostrou-se bom. Em uma máquina virtual, o Fedora rodou perfeitamente com apenas 512 MB de memória. Com menos do que isso o desempenho ficava ruim. Esta versão está bem integrada ao VirtualBox, e o Fedora rodou como sistema operacional convidado com perfeição.

Ao longo dos anos, o projeto Fedora já usou diversos gerenciadores gráficos de pacotes. No momento, a interface utilizada chama-se Adicionar/Remover Software. É um programa interessante, um pouco diferente de outros gerenciadores de pacotes famosos, mas com certos detalhes que vão soar familiares. O layout, por exemplo, é o de um Synaptic simplificado, com um bom conjunto de ícones. As categorias de software são listadas no lado esquerdo da janela; os pacotes específicos aparecem na parte superior direita, e a descrição do pacote selecionado fica na parte de baixo. As categorias e a seleção de pacotes funcionam praticamente da mesma forma que na Central de Software do Ubuntu, bastando um clique para marcar um pacote para instalação ou remoção. O aplicativo também vem equipado com vários filtros, que lembram o gerenciador de pacotes YaST.

Depois que um programa é instalado, o sistema se oferece para abri-lo. Eu achei isso muito bacana, porque o usuário não tem que ir até o menu caçar o programa. É pena que o Adicionar/Remover Software seja lento para responder aos nossos comandos. Quando o usuário clica em uma categoria, o aplicativo demora alguns segundos para processar a solicitação. Além disso, ele pede a senha de root sempre que um novo pacote (ou grupos de pacotes) vai ser instalado. Se eu instalasse o GIMP, por exemplo, tinha que digitar a senha. Se logo em sequência eu fosse instalar um jogo, lá vinha o pedido de senha outra vez. Talvez a ideia seja dar mais segurança ao sistema, mas essa é uma restrição que a gente não costuma ver em gerenciadores de pacotes. Por trás da interface está o YUM, o gerenciador de pacotes de linha de comando. Rodando via terminal, o YUM é rápido e preciso. O plugin Presto, que baixa atualizações delta em vez de pacotes inteiros, vem ativado por padrão. Na média, notei uma redução de dois terços de uso de banda ao fazer atualizações.

Quem quiser instalar atualizações usando uma interface gráfica pode recorrer ao pequeno utilitário de atualização que foi incluído. Eu só usei o programa duas vezes, mas ele se saiu bem ao equilibrar boas informações e uma interface organizada, e não apresentou nenhum problema. Seria bom que fossem exibidas mais informações sobre o progresso da instalação dos pacotes, já que pouca coisa é informada ao usuário depois que a atualização começa. Só para fechar a parte de gerenciamento de pacotes: quando o usuário tenta rodar via linha de comando um programa que não está instalado, o sistema verifica as informações dos repositórios, e se houver algum item correspondente, ele se oferece para instalar o tal programa. Isso é muito conveniente, e o sistema não demorava a voltar a responder nas vezes em que eu cometia algum erro de digitação… quero dizer, quase sempre. Se eu digitasse um comando errado enquanto alguma atualização de software estivesse em andamento, a linha de comando ficava presa.

Nos meus testes, verifiquei que a maior parte dos recursos do Fedora era bem segura. A maioria dos serviços de rede vem desativada por padrão, o SELinux funciona automaticamente e a equipe do Fedora mantém seu bom histórico com as atualizações de segurança. A única coisa ruim que se destaca é que quando o servidor SSH é ativado, qualquer usuário comum (não root) pode fazer login remotamente e desligar o computador. Isso não é muito problemático para usuários domésticos, já que a conta de usuário comum não pode desligar o computador se houver algum outro usuário conectado, mas essa configuração pode resultar em surpresas desagradáveis para quem roda servidores de teste. Eu fico me perguntando por que isso acontece, já que, até onde eu sei, as outras distribuições não permitem que usuários comuns desliguem o computador remotamente. A maior mudança desta versão é o OpenSCAP, e eu fui dar uma conferida no que está disponível para ele no momento. A coisa ainda está engatinhando, e minhas primeiras impressões são de que esta é uma caixa que logo abrigará ferramentas para administradores de sistemas. Espero ver mais sobre essa tecnologia e sua documentação no Fedora 15.

De modo geral, minha experiência com a nova versão do Fedora foi agradável. A distro é muito bem acabada, e foi muito mais prazeroso usá-la do que a versão 13. Só encontrei um bug digno de nota, e foi logo depois de concluída a instalação. Na hora de reinicializar, esqueci de remover o live CD e fui parar no menu de inicialização do CD. Escolhi “Inicializar pelo disco local” e recebi a mensagem de que o sistema não podia ser inicializado. Removi o CD e deixei o computador iniciar o sistema via disco rígido normalmente; deu certo. É um bug que eu não teria encontrado em condições normais, mas achei estranho o CD não conseguir passar o controle para o disco local. Tirando isso, com o sistema em atividade, a impressão que tive foi a de que o Fedora é sólido e tem bom desempenho.

Fazendo backups e trabalhando com o SELinux

Acho que o Fedora merece elogios por alguns itens específicos. Nas versões mais recentes, por exemplo, eu tive que lutar com o SELinux e, na maioria das vezes, desativava o serviço para me livrar dos avisos. Até agora, não tive problemas com o SELinux no Fedora 14. Também fico feliz em ver o Deja Dup, a ferramenta de backup fácil de usar, ganhando destaque no menu de aplicativos, já que trata-se de um ótimo programa, que combina flexibilidade a uma interface intuitiva. Também tive a oportunidade de testar o Fedora 14 em um pendrive nesta semana, graças a Kara Shiltz, da Red Hat. De modo geral, a edição USB funciona exatamente como a edição em CD, só que traz o OpenOffice.org instalado.

No fim das contas, tenho a impressão de que o Fedora é mais uma plataforma de testes e desenvolvimento do que um desktop para o usuário comum. Há pouquíssimo suporte a multimídia, nada de Flash, nenhuma suíte de escritório vem instalada no CD e o ciclo de suporte é pequeno (por volta de treze meses). Hoje o projeto tem um jeitão mais amistoso do que há seis meses, mas ele continua mirando nos integrantes mais técnicos da comunidade, que não se importam em resolver um problema ou dois. Se você gosta de usar sempre tecnologia de ponta mas não quer correr muitos riscos, ou se quiser ficar por dentro das tecnologias que vão chegar ao Red Hat, o Fedora 14 é uma excelente escolha.

Créditos a Jesse Smithdistrowatch.com

Tradução por Roberto Bechtlufft <info at bechtranslations.com.br>

Sobre o Autor

Redes Sociais:

Deixe seu comentário

X